ARACAJU/SE, 19 de abril de 2024 , 15:37:26

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A identidade dos que santificam o mundo

Padre Everson Fontes Fonseca,

Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Mosqueiro.

 

Prestes a encerrar o Ano Nacional do Laicato, na próxima Solenidade de Jesus Cristo, Rei do Universo, penso no interesse da reflexão sobre o Povo de Deus na Igreja. Esta tratativa é muito mais abrangente do que pensamos, porque, pelo Santo Batismo, todos, desde o Santo Padre, o Papa, sem exceção, Clero e fiéis leigos, fazemos parte deste povo profético, sacerdotal e real, porque participamos do Corpo Místico de Cristo, da Sua Igreja.

Entretanto, uma pergunta é essencial: quem é o Povo de Deus? Tal como já dissemos, são todos os batizados, indistintamente. O Batismo é condição para a pertença ao Povo Santo de Deus, de maneira objetiva. Todavia, faz-se, também, necessário que reafirmemos o nosso testemunho cristão, marcado pela autenticidade de nossa vida embasada, totalmente, no Evangelho. Caso contrário, escondemos, desfiguramos, maculamos o fato de que pertencemos a Cristo se, em nosso cotidiano, não vivemos a altura de Cristo, na correspondência à santidade querida por Deus para nós.

O Povo de Deus é uma comunidade de santos. E São Paulo, fazendo uma espécie de balanço de sua vida e missão para a comunidade de Filipos, dirá: “Na verdade, considero tudo como perda diante da vantagem suprema que consiste em conhecer a Cristo Jesus, meu Senhor” (Fl 3,8a). Com esta palavra do Apóstolo, poderemos, quem sabe, sentir certo tom de ‘romantismo’. Porém, se refletirmos bem, perceberemos a radicalidade que contém. E, à nossa pergunta essencial, advém outro conceito enriquecedor: o Povo Santo de Deus, cuja pertença estão os fiéis leigos, é um povo decidido; um povo do ‘sim, sim, não, não’ (cf. Mt 5,37), porque sabe que o meio-termo é um desserviço a Cristo e à Sua Igreja; é uma adesão ao inimigo. Se somos cristãos medíocres, como recompensa seremos do número dos ‘vomitados’ por Deus; porque escutaremos Dele, o Justo Juiz, o que foi dirigido aos cristãos de Laodiceia: “Mas, como és morno, nem frio nem quente, vou vomitar-te” (Ap 3,16). Desta maneira, não existe meio-cristão. Existe, sim, cristão que prestará contas do que não fez e do testemunho que não deu.

Ainda na tentativa de esquadrinhar um pouco da identidade do Povo Santo de Deus, chamo-lhes a atenção para o apresentado pela Constituição Dogmática do Concílio Vaticano II, Lumen Gentium, que especificará acerca dos fiéis leigos, a cuja missão nos dirigimos mais proximamente: “Unidos no Povo de Deus, e constituídos no corpo único de Cristo sob uma só cabeça, os leigos, sejam quais forem, todos são chamados a concorrer como membros vivos, com todas as forças que receberam da bondade do Criador e por graça do Redentor, para o crescimento da Igreja e sua contínua santificação. […] Mas os leigos são especialmente chamados a tornarem a Igreja presente e ativa naqueles locais e circunstâncias em que só por meio deles ela pode ser o sal da terra” (n. 33). Desta maneira, temos a identificação: os leigos, com a sua operação no mundo, santificam-no.

Logo, ser leigo, é sentir sobre si uma responsabilidade, que lhe recai sobre os ombros. Na sua responsabilidade diante deste encargo “para que o desígnio de salvação atinja cada vez mais os homens de todos os tempos e lugares” (Ibidem), os leigos deverão encontrar a alegria do serviço. No mundo, deverão cuidar de ser embaixadores do Evangelho de Cristo (cf. Ef 6,20), não esperando apenas dos Pastores da Igreja, porque estão os leigos imiscuídos na intimidade dos seus lares, no profissionalismo de seus trabalhos, na liberdade de seus lazeres, no calor dos relacionamentos interpessoais, sociais e políticos, sendo conscientes de que, “ainda quando se entregam as tarefas temporais, podem e devem realizar uma ação preciosa para a evangelização do mundo” (LG 35). E isto é um dever já dado pelo próprio Jesus (cf. Mt 28,20).

Vigilantes, os fiéis leigos deverão estar atentos, nas estruturas humanas, ao que está ou não em sintonia com a vontade de Deus, que se constitui caminho certo de felicidade para todos, para o mundo. Não apenas como denunciadores daquilo que é estranho aos planos divinos; antes, como aqueles que, por primeiro, fazem a diferença pela prática das virtudes, impregnando o mundo dos valores cristãos, vividos, subjetivamente, por cada um que experimenta a amizade com Jesus, fazendo jus à condição de Povo de Deus. E isso, antes de acontecer revolucionariamente, se sucederá de forma natural, discreta, firme e resoluta, preparando corações outros para acolherem o que Deus quer para a salvação do mundo. Nunca deverão se esquecer de que toda e qualquer atividade de suas vidas deverá ser orientada pela consciência cristã, pois, nada do que fazem deverá se subtrair – ou mesmo trair – ao reinado de Cristo no mundo e nos corações.

Caros leigos, vocês não estão no mundo para ser mais um, no anonimato de suas vidas e ações. Dispostos pela Divina Providência, no hoje da história humana, colaborem com a missão da Igreja nas condições particulares do mundo moderno em que atuam, sendo sal, com gosto, sendo luz, clarividente, sendo fermento, que leveda, o mundo, desenvolvendo-o com o Evangelho de Jesus, que a todos santifica e felicita.