Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Conceição do Mosqueiro.
Pelos dias do Natal do Senhor, notória é a conjugação existente entre os termos ‘voz’ e ‘Verbo’, traduzindo a dinâmica vivida entre o Advento e o Natal, da preparação e da realidade.
Na profecia de Isaías, adjetivando o mensageiro de Deus, que é o próprio Cristo, a Plenitude da Revelação Divina, temos: “Como são belos, andando sobre os montes, os pés de quem anuncia e prega a paz, de quem anuncia o bem e prega a salvação, e diz a Sião: ‘Reina teu Deus!” (Is 52,7). Esta visão concretiza-se com a presença discreta, suave, frágil, porém, verdadeira do Menino que nos nasceu do seio puríssimo da puríssima Virgem Maria. A Beleza dos Céus, o Perfeitíssimo, toca o chão desta nossa terra, tão obscurecida, emporcalhada pelo pecado, que nos desassossega, que nos causa mal, que nos deseja arrastar à condenação. É Deus que toca a nossa história, de maneira sensível, visível, portanto. É o Verbo que está no meio de nós, porque Se fez carne para a nossa salvação, tal como dizemos no Credo Niceno-Constantinopolitano: “E, por nós, homens, e para nossa salvação, desceu do Céu: e se encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria, e se fez homem”. Daí, é que, quando abrimos a Carta aos Hebreus, lermos: “Muitas vezes e de muitos modos falou Deus outrora aos nossos pais, pelos profetas; nestes dias, que são os últimos, ele nos falou por meio do Filho, a quem ele constituiu herdeiro de todas as coisas e pelo qual ele criou o universo” (Hb 1,1-2).
Com o “Disse Deus”, marcante no primeiro capítulo do Gênesis, temos o Pai que, pelo Filho, no Espírito Santo, tudo cria. Cristo é a Palavra criadora do Pai. Nada, absolutamente, foi feito sem Ele (cf. Jo 1,3). E, para a obra da Redenção, o Filho, que é o Verbo, a Palavra Encarnada do Pai, é Salvador. Na esteira da história do mundo, entre a obra da Criação e a da Redenção, mesmo estando o Verbo oculto em Deus, o Senhor falou, preparando corações. E o que os profetas, as vozes, até a grande voz, João Batista, a testemunha que aponta o Cristo-Cordeiro, predisseram, preparando-nos o coração, aconteceu: vemos Aquele que é, essencialmente, invisível, porque ele nos assumiu sobremaneiramente, assumindo para Si um corpo (cf. Hb 10,5), com exceção do pecado.
O Verbo se estabeleceu em nosso meio, para nós. É a Palavra eterna, Onipotente, que Se dirige à nós, para levar-nos Consigo, porque, já agora, contemplamos a Sua glória (cf. Jo 1,15). Mas, anteriormente, junto com os porta-vozes do Verbo, vozerios alheios a Deus se erguiam para perder-nos na preparação do acolhimento do Verbo; hoje, muitas palavras estranhas concorrem com o Verbo em nosso coração, ao que deveremos estar sóbrios e em discernimento para não cairmos na confusão e na perdição, porque a Palavra “veio para o que era seu, e os seus não a acolheram” (Jo 1,11).
Escolhidos por Deus, escutando, inequivocamente, a Sua Palavra, Jesus Cristo, como condutora de nossa vida, com os “olhos fixos n’Ele” (Hb 12,1), não nos perderemos. Faremos justiça ao Seu nascimento, com o qual nos alegramos; faremos jus a ao nascimento divino que nos fez nascer para o Alto. E, tudo isto, porque O recebemos: “Mas, a todos que a receberam [receberam a Palavra], deu-lhes a capacidade de se tornarem filhos de Deus, isto é, aos que acreditam em seu nome, pois estes não nasceram do sangue nem da vontade da carne nem da vontade do varão, mas de Deus mesmo” (Jo 1,12-13).
Esta realidade nos deixa extasiados: o Cristo nos nasceu para nascermos de Deus. Extasiou também Santo Agostinho. E, assim, no seu “Comentário ao Evangelho e ao Apocalipse de São João”, tratando do prólogo do Evangelho de São João, o Bispo de Hipona dizer: “Não te admires, ó homem, pelo fato de te tornares filho de Deus pela graça, e por teres nascido de Deus segundo o seu Verbo. O Verbo dignou-se nascer primeiramente do homem, para que tu, realmente nascesses de Deus e dissesses a ti mesmo: não foi em vão que Deus resolveu nascer do homem. Apreciou-me, como se eu fosse coisa importante, de modo a tornar-me imortal, nascendo ele mortalmente por meu amor”.
Que sejamos atentos ao Verbo Encarnado, ao Menino Divino que nos nasceu, e deixemo-nos conduzir por Sua proposta de amor, fazendo de Sua misericórdia o regulamento da nossa vida. Somente nesta comunhão com o Verbo, na graça e na verdade, encontraremos a nossa felicidade, tal como felizes retornaram ao seu cotidiano os pastores e os magos, cujas atitudes também refletimos nestes dias.