O agravamento da seca e dos incêndios pelo país deve impactar o agronegócio e a economia, reduzindo as safras e aumentando os preços de alimentos no Brasil. Produtos como açúcar, café, hortaliças e frutas devem ficar mais caros, o que pressionará a inflação de setembro e de outubro.
Em 2024, o Brasil tem enfrentado a pior seca desde o início dos registros da série histórica, em 1950. Segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), a atual seca é mais severa do que as registradas em 1998 e 2015/2016 e está impactando 58% do território nacional.
Além da falta de chuvas, os incêndios que vêm se alastrando em várias regiões do país também ligaram um alerta. Queimadas de grande intensidade já foram registradas no interior de São Paulo, no Pantanal e na Amazônia.
Uma das culturas que mais deve ser impactada é a do café. Setembro é mês de florada, mas a falta de chuvas indicada nas previsões deve comprometer o ciclo.
Há outro fator que pressionará os preços: a cotação do café arábica valorizou 87% no mercado internacional no último ano, mas as empresas vinham evitando repassar essa alta ao consumidor brasileiro. Agora, segurar esse repasse ficou inviável.
Também é preocupante a situação da safra de cana-de-açúcar. Segundo cálculos da Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), as queimadas já provocaram prejuízo de R$ 800 milhões aos produtores de cana-de-açúcar.
O valor contabiliza os efeitos dos incêndios na destruição dos pés de cana, nas soqueiras (raízes) e na qualidade ruim da matéria-prima. De acordo com a Orplana, mais de 100 mil hectares foram queimados em áreas de plantio ou de rebrota de cana.
CEO da Orplana, José Guilherme Nogueira afirmou que, devido às perdas, a cana só conseguirá rebrotar quando tiver água no solo, ou seja, quando as chuvas chegarem. “Esse cenário de clima seco e falta de chuvas pode impactar a safra futura, mas ainda é cedo para previsões. Esperamos que as chuvas deste final de ano venham de forma uniforme e volumosa e a rebrota da cana-de-açúcar aconteça de uma maneira mais tranquila”.
Além das queimadas, a seca severa também é um problema para os canaviais. Com o baque na produção, a estimativa é que esses efeitos comecem a ser sentidos pelos consumidores a partir de outubro, com elevação dos preços do açúcar. O etanol também deve subir.
Frutas e hortaliças encarecerão mais rápido
Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), os preços de frutas e hortaliças são os que tendem a subir mais rapidamente por causa dos impactos da seca.
A laranja é a fruta que pode ter os maiores problemas devido à massa de ar quente em grande parte do Brasil, que está provocando estresse hídrico nos pomares e comprometendo a qualidade. No caso da fruta, também é preciso considerar o panorama internacional para o suco, uma vez que o Brasil é o maior produtor do mundo de laranja e de suco e os estoques do último estão baixos.
“A tendência é que a indústria continue demandando fortemente a fruta, num contexto em que a safra prevista será baixa, o que tende a influenciar em uma menor oferta do produto para o atacado e mercado de mesa, fazendo com que os preços se mantenham por longo período elevados”, disse a companhia.
A produção de melancia também pode ser bastante afetada em São Paulo e em Goiás. A fruta se desenvolve e suporta bem o calor, mas sob influências de extremos climáticos pode perder qualidade (grau de doçura, manchas na casca) e tamanho.
A banana já sofreu aumento de preços por causa da baixa quantidade produzida da fruta, comportamento normal para o período do ano, em entressafra em diversos locais, mas que foi acentuada e continua sendo afetada pela irregularidade da chuva, que prejudicou os bananais, afetando assim o desenvolvimento dos cachos.
Para as hortaliças, a prolongação da ausência de chuvas pode prejudicar as lavouras que não possuem sistema de irrigação. A Conab disse que o cenário mais delicado é com a cenoura e com o tomate, produtos mais suscetíveis ao clima, que devem ter picos nos preços.
Carne de boi também pode subir
No caso da carne bovina, a redução da umidade e a incidência de queimadas afetam negativamente as pastagens, o que pode aumentar os custos de produção, especialmente em regiões sem infraestrutura adequada para mitigação dos efeitos da seca, e elevar os custos.
Diante desse cenário, o preço da carne tende a ter aumento nos próximos meses. A Conab pondera, no entanto, que é preciso considerar o ciclo pecuário, que neste ano deve atingir o pico de oferta de animais para abate, elevando a produção da carne no país. Isso pode compensar parcialmente os efeitos da seca.
Já as proteínas suína e de frango tendem a ter impacto mais brando, uma vez que na região Sul, responsável por mais de 70% da produção nacional de ambos os produtos, a seca está sendo mais amena em virtude não só das chuvas recentes, como também da previsão de ocorrência de La Niña branda, que provoca chuvas acima da média.
Situação confortável com safras de grãos
A Conab não vê riscos de aumento nos preços de grãos como milho, arroz, trigo e soja, mesmo considerando a seca atual. A maior parte da colheita desses produtos já foi realizada, o que garantiu a manutenção da oferta dentro do esperado, sem impacto significativo nos preços.
Dentre as culturas cultivadas de maio a agosto, o feijão vem apresentando bom rendimento, uma vez que as chuvas no Nordeste favoreceram os cultivos e no centro-sul a cultura se desenvolve em áreas sob irrigação.
A produção de milho, mesmo com uma queda projetada em 12,3% chegando a 115,6 milhões de toneladas, será suficiente para abastecimento interno, segundo a entidade. A expectativa é que seja reduzido o volume de exportações brasileiras do grão em 2024.
A perspectiva de produção de arroz é de aumento da oferta. A produção no atual ciclo está estimada em torno de 10,59 milhões de toneladas, volume 5,6% superior ao obtido na safra anterior.
Fonte: Poder360