ARACAJU/SE, 24 de abril de 2024 , 17:49:37

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Quem está cheio de amor não pode destilar veneno

Dia desses eu estava caminhando para manter a forma em dia e o fôlego atualizado. Afinal de contas, a atividade física se mostra, a cada dia, mais eficaz, no combate ao sedentarismo e à inveterada mania de querer ficar em casa espreguiçando a mais preguiçosa das preguiças do home office. Nessas andanças, pude perceber alguns casais que também praticavam a doce arte de andar em busca de saúde. Foi quando avistei um par de pessoas amáveis, na aparência e na essência, andando como se aquela atividade fosse uma caminhada em um tapete de pétalas vermelhas rumo a um altar de amor e entrega.

Ele aparentava ter algo em torno de 70 anos. Ela, parecendo ser um pouco mais jovem que isso, desfilava alegria em cada canto de boca, com aquele sorriso de satisfação que só tem quem encontrou a felicidade em doses diárias, tomadas a colheradas toda manhã.

A caminhada, sobre calçadas irregulares e altos perigos com doguinhos vociferando pelas grades de portões, parecia uma aventura indescritível. Ele, um mestre-sala habilidoso, abria caminho para que sua porta-bandeira desfilasse numa avenida, cujo público milionariamente invisível saudava o casal na apoteose de um amor que, acredito além de mim, ninguém percebia.

Sim, o casal passava (quase) despercebido. Cada pessoa que cruzava com os dois namorados na rua apontava nos olhos a angústia da correria e a incapacidade de enxergar a lição do dia na simplicidade quase imperceptível das coisas mais importantes. Quantas vezes não deixamos de enxergar o melhor do outro por causa dessa coisa acelerada que vai sendo imposta no dia a dia? Mas eu tive a sorte de perceber a porção de amor naquele trato mútuo. Ali eu vi poesia.

Até um tropeção dele, no relevo da calçada que se levantar em razão da raiz perversa de um pé de fícus invejoso, foi motivo de cuidado, risos e amor.  Por conta do incidente, cheguei perto, cumprimentei com um cordial bom-dia, perguntei se precisavam de ajuda.

– Obrigado, amigo! Os braços dela já me servem de colo!, respondeu o “acidentado”, feliz da vida por estar acalentado nos braços de quem ele mais queria estar naquele momento.

Até desconfiei dse que aquela topada (sergipanamente falando) poderia ter sido de propósito só pra cair nos braços da amada. Mas quer saber? E se fosse, qual o problema. Dentro daquele patamar de amor, também queria um tropeço daquele.

Os dois, então, saíram, rindo, transformando em algo bom um episódio que muitas pessoas transformariam, tranquilamente, em xingamento e maldizeres. É, de fato, quem está cheio de amor não pode destilar veneno.

Fiquei um tempo parado, olhando o casal sumir entrando à direita na segunda esquina de uma rua qualquer que, certamente, seria mais um pedaço do paraíso particular que eles dois criam por onde passam.

Feliz Dia dos Namorados!