ARACAJU/SE, 19 de abril de 2024 , 15:34:16

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A contemplação do Natal

No santo Natal do Senhor, contemplamos o admirável amor de Deus, que vem ao nosso encontro numa adorável criança. Digo adorável não para tentar traduzir a beleza do Seu aspecto físico; antes, adorável diz respeito ao que este Menino é: Homem-Deus.

Com o Profeta Isaías, admiramo-Lo. Porém, a nossa admiração deve superar a do Profeta. Ele não contemplou o Salvador pois viveu, aproximadamente, oitocentos anos antes. Nós, pelo mistério da Sagrada Liturgia, O temos. E, assim, com maior propriedade do que Isaías, podemos dizer: “Como são belos, andando sobre os montes, os pés de quem anuncia e prega a paz, de quem anuncia o bem e prega a salvação, e diz a Sião: ‘Reina teu Deus!’” (Is 52,7). O Menino nascido da Virgem-Mãe Maria veio para estar conosco (é Ele o ‘Emanuel’); veio como Príncipe da Paz (cf. Is 9,5); veio para, percorrendo terras, fazer o bem; veio, ainda, para, no alto da Cruz, salvar a todos, fazendo justiça ao nome imposto sobre Si por Maria e José através da mensagem do Anjo, Jesus, cuja significação é ‘Deus Salvador’. É por este motivo que o Papa São Leão Magno, no século V, afirmar: “Nasceu o nosso Salvador. Não pode haver lugar para a tristeza, quando acaba de nascer a própria vida, a mesma que põe fim ao terror da mortalidade e nos infunde a alegria da eternidade prometida. Ninguém deve sentir-se incapaz de participar de tal felicidade, a todos é comum o motivo para o júbilo; pois Nosso Senhor, destrutor do pecado e da morte, como não encontrou ninguém livre de culpa, veio salvar a todos” (Sermão no Natal do Senhor, 1).

Contemplamos, como nos diz a Carta aos Hebreus, “o esplendor da glória do Pai, a expressão do seu ser” (Hb 1,3). Sim, a nossa humanidade, extasiada, contempla a divindade. Entretanto, não esta isolada: vemos a divindade que assume a humanidade: a natureza divina que se encarna na natureza humana. E, Naquele no qual não há confusão dessas duas substâncias distintas, vemos reluzir o protótipo do “Homem Novo”. Logo, celebrar do Natal do Senhor é festejar a dignidade das naturezas: a divina, que se indigna em assumir a humana; e a do homem, que é alçada à altíssima dignidade divina, ao tempo em que a almejamos.

Contemplar o Deus e Homem Jesus é  escutar Santo Hipólito, que diz: “Deus possuía o Verbo em si mesmo, e o Verbo era imperceptível para o mundo criado; mas fazendo ouvir sua voz, Deus tornou-o perceptível. Gerando-o como luz da luz, enviou como Senhor da criação aquele que é sua própria inteligência. E este Verbo, que no princípio era visível apenas para Deus e invisível para o mundo, tornou-se visível para que o mundo, vendo-o manifestar-se, pudesse ser salvo. O Verbo é verdadeiramente a inteligência de Deus que, ao entrar no mundo, se manifestou como o servo de Deus”. Então, vemos, igualmente, Aquele que era escondido – e, por isto Separado, Santo (em hebraico: kadosh) – tornar-se visível, porque “a Palavra se fez carne e habitou entre nós. E Nós contemplamos a sua glória” (Jo 1,14). Aquele que tudo fez e governa com a Sua Palavra tornar-se próximo a nós, numa proximidade inaudita, inimaginada. Ele é o “Shekinah”, O que montou a Sua tenda entre nós ao assumir um corpo semelhante ao nosso. Se O acolhemos, dá-nos a capacidade de nos tornarmos filhos de Deus, pois nascemos de Deus mesmo, dos efeitos da encarnação desta Criança e da salvação que Ela nos traz (cf. Jo 1,12-13).

Quanta riqueza de manifestação, meu dileto leitor! Quanta profundidade para a nossa singela reflexão! Mas, diante de tanto êxtase, palavras, insuficientes, se calam para dar lugar ao mistério que, com a fé – e somente com ela – é apreendido, é contemplado. Com o olhar do coração de Maria, que tudo guardava em seu interior (cf. Lc 2,19.51), não nos distraiamos com o acidental, com o que é acessório, mas mergulhemos, em cheio, na essencialidade do Natal do Salvador.