ARACAJU/SE, 20 de abril de 2024 , 7:41:05

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O amor é cumprimento da Lei

Na reflexão da Parábola do Bom Samaritano (cf. Lc 10,25-37), temos uma rica mensagem que coaduna a importância da Lei, cumprindo-a no espírito do amor – um amor a Deus, é bem verdade -, inclusive aquele manifestado ao Senhor pelo próximo, pelo irmão.

Na tentação de pensarmos que cumprir os mandamentos de Deus é algo impossível ou de difícil prática, pensamento explanado pela pergunta traiçoeira feita pelo mestre da Lei: “Mestre, que devo fazer para receber em herança a vida eterna?” (Lc 10,25), temos a noção, meramente formal, que aquele homem constata em si diante da pergunta-réplica de Jesus, que lhe disse, respondendo à sua indagação com outras duas – “Jesus lhe disse: ‘O que está escrito na Lei? Como lês?'” (Lc 10,26) -, ao que teve por resposta o trecho da Lei de Moisés: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração e com toda a tua alma, com toda a tua força e com toda a tua inteligência; e ao teu próximo como a ti mesmo” (Dt 6,4). Mas, aquele homem não sabia ler as entrelinhas do que julgava saber de cor, apenas de memória; não sabia aplicar o espírito da Lei, por isso pergunta, não mais com segundas intenções, mas com a franqueza de sua ignorância: “E quem é o meu próximo?” (Lc 10,29).

O interlocutor de Jesus não tinha a palavra de Deus na conta de alcançável, como testifica o Deuteronômio: “Na verdade, este mandamento que hoje te dou não é difícil demais, nem está fora do teu alcance. […] Ao contrário, esta palavra está bem ao teu alcance, está em tua boca e em teu coração, para que possas cumprir” (Dt 30,11.14). Ou seja, se a Palavra de Deus está, verdadeiramente, próxima, vizinha a nós; somos capazes de reconhecer o próximo, de levar-lhe a nossa afeição, a nossa misericórdia – que se arrisca, inclusive -, pacificando o seu interior, como diz Isaías: “Paz aos que estão perto, paz aos que estão longe” (Is 57,19).

Jesus é o grande samaritano da humanidade. É Aquele totalmente ‘Outro’, que vem do Céu ao nosso encontro, para socorrer a nossa natureza decadente e prostrada pelo pecado, arrasada por Satanás. Daí, é que São Paulo, escrevendo aos Colossenses, dirá: “Cristo é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação […] porque Deus quis habitar nele com toda a sua plenitude e por ele reconciliar consigo todos os seres, os que estão na terra e no céu, realizando a paz pelo sangue da sua cruz” (Cl 1,15.19-20).

No exemplo do Bom Samaritano, também nós deveremos exercitar os sentimentos de Deus, a Sua misericórdia para tantos e tantos vitimados pelas desventuras da vida e das injustiças. Eles são outros ‘Cristos’ crucificados. São João Crisóstomo, contemplando nos pobres, nos carentes, nos necessitados, o próprio Deus, que, neles, Se esconde, põe nos labios divinos estas palavras comoventes: “Não te digo: arruma-me a vida e tira-me da miséria, entrega-me teus bens […]. Só te imploro pão e roupa, e um pouco de alívio para a minha fome. Estou preso. Não te peço que me livres. Somente quero que, pelo teu próprio bem, me visites. Com isso ficarei satisfeito e por isso te presentearei com o Céu. Eu te livrei de uma prisão mil vezes mais dura. Mas contento-me com que venhas ver-me de vez em quando. Poderia, é verdade, dar-te a tua coroa sem nada disso, mas quero estar-te agradecido e que venhas depois receber o teu prêmio confiadamente. Por isso, Eu, que posso alimentar-me por mim mesmo, prefiro dar voltas ao teu redor, pedindo, e estender a minha mão à tua porta. O meu amor chegou a tanto, que quero que tu me alimentes. Por isso, prefiro, como amigo a tua mesa; disso me glorio e te mostro ao mundo como meu benfeitor” (Homilia 15 sobre a Epístola aos Romanos).

Não nos esqueçamos: os braços do cuidado, as mãos da generosidade, o afago do carinho, o óleo curativo do Bom Samaritano somos nós mesmos com as nossas boas ações em prol do próximo!