Construir uma reserva de emergência é um dos primeiros passos para quem quer ter uma vida financeira mais organizada. O nome é intuitivo: significa guardar uma quantia de dinheiro para não passar aperto em imprevistos, desde um reparo doméstico até uma demissão.
O volume desse colchão financeiro depende do perfil de cada pessoa. O ideal é poupar o equivalente a seis meses de despesas fixas e, em caso de retiradas, repor o dinheiro aos poucos até atingir o montante desejado novamente.
Mas deixar a reserva parada na conta corrente ou na poupança pode limitar ganhos –e, em alguns casos, até corroer o patrimônio acumulado pela inflação. A recomendação, segundo especialistas ouvidos pela Folha, é aplicar em investimentos de baixo risco e liquidez diária para mantê-la rendendo e rapidamente à mão.
“Como o nome sugere, o ponto de ter uma reserva para emergências é não saber quando ela será necessária, então não pode estar em um investimento que seja de baixa liquidez, que demore para estar em conta”, diz José Tolipan, sócio e gerente de portfólio do BTG Pactual Portfolio Solutions.
Títulos de renda fixa do Tesouro Direto são os mais indicados, embora nem todos os produtos sejam adequados para a reserva de emergência. O especialista frisa que o foco não deve ser buscar por altos retornos, mas por baixa volatilidade, já que a função principal desse tipo de investimento é preservar o capital.
“Não dá para saber quando aquele recurso será necessário, e pode ser que você precise dele em um momento em que a volatilidade está jogando contra você. Investimentos com baixa ou quase nenhuma volatilidade são mais adequados para esse tipo de recurso”.
Nesse sentido, a dica é optar por títulos atrelados à Selic, cuja rentabilidade é a variação da taxa básica de juros do país mais uma taxa prefixada. Na sexta-feira, essas taxas estavam em 0,058% e 0,11% para os contratos de 2028 e 2031, respectivamente.
Apesar de os vencimentos serem de longo prazo, os Tesouro Selic permitem que o investidor resgate o dinheiro antes do final da aplicação sem riscos de uma grande marcação a mercado. O termo remete à diferença entre o valor pago pelo título na contratação e o preço em que ele está sendo negociado no momento do resgate, o que pode trazer prejuízos para quem decide encerrar a contratação antes do prazo estabelecido.
Essa marcação é mais comum em títulos com taxas maiores, como o Tesouro Prefixado ou o Tesouro IPCA+. “São as parcelas prefixadas que costumam trazer a marcação negativa. Como o Tesouro Selic tem uma taxa pequena, é pouco provável que a variação dela cause um impacto relevante nas aplicações”, diz Luigi Wis, especialista em investimentos da Genial.
Alocações de até R$ 10 mil no Tesouro Selic são isentas de taxas de custódia. Acima disso, incide um percentual de 0,2% ao ano, mais eventuais tarifas de administração cobradas por bancos e corretoras.
Fora dos títulos públicos, os especialistas recomendam aplicar a reserva de emergência em CDBs (Certificados de Depósito Bancário) de grandes bancos, com liquidez diária e que estejam indexados ao CDI (Certificado de Depósito Interbancário), o equivalente à Selic.
O ideal é escolher CDBs que rendam ao menos 100% do CDI, mas Wis faz uma ressalva: é importante se certificar da confiabilidade do emissor do título. “Bancos menores costumam oferecer uma remuneração mais elevada, como 110% do CDI. Para reserva de emergência, talvez esse CDB seja um pouco mais arriscado do que o de um bancão, já que o banco pequeno tem mais chances de quebrar”, afirma.
O investimento é garantido pelo FGC (Fundo Garantidor de Crédito) para montantes de até R$ 250 mil por CPF e por instituição. “Mas o ressarcimento não é imediato e costuma levar alguns meses, o que pode ser um problema caso a reserva de emergência precise ser usada imediatamente”, diz Wis.
Assim como o Tesouro Selic, alguns CDBs permitem resgate em dias úteis sem carência – isto é, sem que o investimento precise ficar parado por uma quantidade pré-determinada de tempo.
Como a liquidez é um dos fatores-chave para alocar a reserva de emergência, outro produto recomendado são os fundos de DI (depósito interbancário), cujos gestores aplicam o patrimônio acumulado em títulos privados atrelados ao CDI e nos do Tesouro Direto.
O investidor faz aportes no fundo e, em troca, recebe cotas proporcionais ao valor investido. Vale destacar que essa modalidade não é protegida pelo FGC, e a rentabilidade costuma acompanhar a variação do CDI, com descontos de taxas de administração e do IR (Imposto de Renda).
A tributação, aliás, é um ponto de atenção. CDBs e alocações acima de R$ 10 mil no Tesouro Selic seguem a tabela regressiva do IR. Isto é, há recolhimento de 22,5% para aplicações de até 180 dias; 20% de 181 a 360 dias; 17,5% de 361 a 720 dias; e 15% acima de 720 dias. O IR é descontado automaticamente no momento do resgate ou do pagamento da taxa de custódia.
Já fundos de DI contam com o chamado “come-cotas”, um adiantamento do IR que é cobrado duas vezes ao ano. A cada seis meses, no último dia útil de maio e de novembro, o número de cotas é reduzido de forma equivalente ao percentual do imposto sobre os rendimentos. O tamanho da mordida é o da menor alíquota do IR em cada tipo de fundo: a cobrança nos de curto prazo é de 20% sobre os ganhos; nos de longo prazo, 15%.
Na hora do resgate, há um cálculo da diferença entre o que já foi pago e o que é devido de alíquota do IR na qual o investimento se enquadra.
Essas taxas, no entanto, podem mudar neste ano. O governo federal editou uma medida provisória que define uma alíquota de 17,5% de IR para as aplicações, independentemente do prazo do investimento. A mudança ainda precisa passar pelo Congresso Nacional.
E a poupança?
Embora popular no Brasil, os especialistas afirmam que a poupança é um investimento pouco eficiente. Isso porque a rentabilidade dela é de 0,5% ao mês quando a Selic está acima de 8,5% ao ano, mais a variação da TR (Taxa Referencial), hoje próxima a zero.
Além disso, o dinheiro só cresce a cada 30 dias, ao passo que os outros produtos recomendados rendem diariamente. Se o investidor precisar sacar a reserva antes destes 30 dias, o montante não terá tido rendimento algum, como se estivesse parado na conta corrente.
Fonte: Folha de S.Paulo