A recente aprovação do Projeto de Lei Complementar 108/2024 (PLP 108) no Senado reacende o debate sobre o impacto da Reforma Tributária nas transmissões de bens e heranças no Brasil.
A proposta, que altera as regras do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis entre vivos (ITBI), tem como objetivo uniformizar critérios entre estados e municípios, mas, segundo especialistas, pode acabar aumentando a carga tributária e gerando insegurança jurídica, especialmente para a classe média brasileira.
O que muda com o PLP 108/2024?
Atualmente, as alíquotas do ITCMD variam de 2% a 8% conforme o estado, e algumas unidades da federação aplicam valores fixos, como São Paulo, que cobra 4%.
O novo projeto, porém, torna obrigatória a adoção de alíquotas progressivas, que aumentam conforme o valor do patrimônio transferido.
Na teoria, o modelo beneficia os contribuintes de faixas menores, mas na prática heranças e doações de valor médio podem ser duramente afetadas.
“Uma herança de R$ 1 milhão que hoje paga R$ 40 mil de imposto pode passar a pagar até o dobro”, explica Renato Munduruca, sócio da RVM Law.
Além disso, o PLP amplia a base de cálculo do ITCMD, que passará a considerar o valor de mercado dos bens — e não mais o valor contábil ou venal.
Essa mudança afeta especialmente empresas familiares e holdings, que terão de avaliar ativos e fundos de comércio a preço de mercado.
“Isso pode elevar substancialmente a tributação e gerar divergências sobre como calcular o fundo de comércio”, alerta Juliana Assolari, do Lassori Advogados.
Heranças, doações e bens no exterior entram na mira
Outro ponto sensível é a inclusão de bens no exterior e estruturas de trust no escopo do ITCMD. Embora o projeto traga exceções, como nos casos em que o beneficiário é o próprio instituidor, especialistas afirmam que a medida aumenta o alcance tributário e pode resultar em disputas sobre a competência de cobrança.
O texto também determina que transferências gratuitas, incluindo perdão de dívidas entre partes relacionadas, sejam equiparadas a doações.
Para Adolpho Bergamini, do Bergamini Advogados, essa previsão é inconstitucional, pois amplia indevidamente o conceito de doação previsto no Código Civil.
ITBI: cobrança pode ocorrer antes do registro em cartório
No caso do ITBI, o projeto reforça a competência dos municípios e propõe que a cobrança ocorra no momento da escritura pública, e não apenas após o registro do imóvel.
A medida, segundo Morvan Meirelles Costa Junior, do Meirelles Costa Advogados, antecipa o recolhimento e pode comprometer o fluxo de caixa de quem compra um imóvel.
O PLP também define que o valor venal adotado será o valor de mercado, o que, apesar de alinhar a tributação à realidade, pode gerar distorções e litígios.
“Em cidades como São Paulo, a planta genérica já supera os preços reais, o que tende a aumentar as disputas judiciais”, observa Morvan.
Integração entre fiscos e impacto prático no bolso do contribuinte
O projeto busca ainda integrar cartórios e administrações tributárias, obrigando o compartilhamento de informações e aplicando multas por omissão.
Essa integração é vista como um avanço no combate à sonegação fiscal, mas também representa um aumento da vigilância sobre o contribuinte.
Na prática, o PLP 108/2024 deve encarecer transmissões de bens, heranças e imóveis, além de exigir revisão imediata de planejamentos patrimoniais e sucessórios. Especialistas recomendam atenção redobrada a quem pretende doar, herdar ou reorganizar o patrimônio antes de 2026, como conclui Renato Munduruca. “As mudanças buscam modernizar o sistema, mas podem transformar a sucessão patrimonial em um processo ainda mais caro e complexo para a classe média”.
Fontes: Capitalist e InfoMoney





