O ceratocone, doença ocular que afeta principalmente jovens, está por trás do aumento de 276% nos transplantes de córnea realizados no Brasil nos últimos 10 anos. O dado é de um levantamento da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) em parceria com o Instituto Penido Burnier e reflete a necessidade de falar sobre a doença, que provoca o afinamento e a deformação da córnea, comprometendo a visão e podendo levar à cegueira em casos mais graves. O aumento de casos preocupa especialistas, que alertam para a importância do diagnóstico precoce. Doença atinge principalmente jovens e já responde por sete em cada dez transplantes realizados no país. Para esclarecer sobre o assunto entrevistamos o Dr. Allan Luz, presidente da Sociedade Sergipana de Oftalmologia e especialista em ceratocone. O entrevistado é formado pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), com doutorado em Oftalmologia e Ciências Visuais pela Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp. Iniciou sua carreira ao lado do Dr. Mário Ursulino, fundador do Hospital de Olhos de Sergipe (HOS), referência na área no Estado. Atualmente, é professor e coordenador do curso de especialização do HOS — pioneiro e único na área em Sergipe —, além de presidir a Sociedade Sergipana de Oftalmologia.
-A que o senhor atribui o crescimento de casos de ceratocone?
Allan Luz – O crescimento está diretamente relacionado à falta de informação e de acompanhamento oftalmológico. O ceratocone é uma doença silenciosa, que geralmente começa ainda na adolescência.
– Quais são os primeiros sintomas desta doença?
Allan Luz – O primeiro sintoma costuma ser a visão turva, facilmente confundida com miopia ou astigmatismo. Quando o diagnóstico demora, a córnea continua se deformando e a visão se deteriora até o ponto em que o transplante passa a ser a única opção”, explica o médico.
-O ceratocone tem origem genética?
Allan Luz – Os casos podem ter relação direta com hábitos cotidianos, como o ato de coçar os olhos, um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento e a progressão da doença. Muita gente não imagina, mas o simples ato de esfregar os olhos pode causar danos irreversíveis à córnea. Esse hábito, comum em pessoas com alergias oculares, enfraquece a estrutura do tecido e acelera o avanço do ceratocone. É um comportamento que precisa ser evitado, principalmente em crianças e jovens
-Tem uma idade mais perigosa, ou a doença se manifesta em qualquer fase da vida?
Allan Luz – Os sintomas surgem, em geral, entre os 10 e 25 anos, fase em que a córnea é mais vulnerável à deformação.
– Como podemos saber se estamos com ceratocone?
Allan Luz – O exame mais indicado para identificar o ceratocone é a topografia da córnea, que mapeia sua curvatura e detecta alterações antes que a visão apresente prejuízos significativos.
-Como é o tratamento?
Allan Luz – Nos casos leves, o uso de óculos ou lentes de contato rígidas costuma garantir boa qualidade visual. Quando a deformação é mais acentuada, o oftalmologista pode indicar o crosslinking de colágeno (técnica que utiliza luz ultravioleta e riboflavina para fortalecer a córnea), o implante do anel intracorneano (Anel de Ferrara) ou, em último caso, o transplante de córnea.
– O ceratocone tem cura?
Âllan Luz – Hoje temos recursos capazes de estabilizar o ceratocone e devolver qualidade visual ao paciente, desde que ele seja acompanhado de forma regular. O diagnóstico precoce é o que muda completamente a perspectiva da doença. Evitar coçar os olhos e procurar um oftalmologista diante de qualquer alteração na visão são atitudes simples, mas que podem evitar grandes problemas no futuro.