ARACAJU/SE, 25 de agosto de 2025 , 18:27:33

Poluição plástica: impasse global não consensua soluções, podendo aumentar pressão sobre COP30

 

O fracasso das negociações do tratado global contra a poluição plástica, encerradas em Genebra, na Suíça, expôs mais uma vez a dificuldade de alinhar esforços multilaterais para enfrentar um problema crescente no mundo.

Após dez dias de debates entre representantes de 185 nações, em 15 de agosto o Comitê Intergovernamental de Negociação da Organização das Nações Unidas (ONU) suspendeu as sessões por não ter consenso entre os países para aprovar um texto-base do acordo.

Segundo a diretora-executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Inger Andersen, o cenário foi marcado por “complexidades geopolíticas, desafios econômicos e tensões multilaterais”. Apesar disso, ela destacou que todos os países reafirmaram interesse em permanecer à mesa de negociação.

Enquanto as discussões são adiadas, os impactos ambientais se intensificam. Levantamentos da ONU apontam que entre 19 milhões e 23 milhões de toneladas de plástico são despejadas anualmente em ecossistemas aquáticos. Se nada mudar, até 2040 esse volume poderá chegar a 37 milhões de toneladas.

O porta-voz e gerente sênior de Instituições e Políticas, Pedro Prata, que participou das reuniões em Genebra, entende que o processo é complexo, e quanto mais as sessões são adiadas, mais tempo o mundo fica sem solução para a redução da poluição plástica.

“O tratado é o melhor mecanismo e o mais eficiente, caso seja um tratado bem elaborado, para redução de poluição plástica nos próximos anos e décadas. A cada adiamento da negociação, a gente adia também essa solução. E o mercado vem jogando cada vez mais poluição plástica nos ecossistemas, nos oceanos e nas florestas”, comenta Prata.

Produção x gestão: o ponto de ruptura

O principal impasse das reuniões em Genebra foi a divisão entre dois blocos de países. De um lado, nações que defendem medidas concretas para reduzir a produção de plásticos e proibir aditivos químicos nocivos à saúde e ao meio ambiente. Do outro, grandes produtores de petróleo, que preferem centrar esforços na gestão de resíduos já existentes, apostando em reciclagem e outras formas de mitigação.

Ainda nesse impasse, o porta-voz chama a atenção para um desafio maior, o financiamento da transição dessa produção plástica.

“Quem paga essa conta? Como países desenvolvidos, países ricos, de renda mais alta, financiam países do sul-global, que naturalmente não terão recursos suficientes para mudar o seu mercado para transitar o jeito como eles produzem e consumem o plástico? Então, tem um debate do produto e tem um debate que envolve tudo isso, que é do dinheiro, do financiamento disso”, destaca o especialista.

O Itamaraty divulgou nota expressando preocupação com a suspensão da sessão. Segundo o governo, a diplomacia brasileira defendeu uma posição equilibrada para aproximar visões divergentes, evitando uma ruptura entre os blocos.

“A posição intermediária brasileira contribuiu para aproximar perspectivas aparentemente irreconciliáveis e para facilitar negociações em temas sensíveis, como produtos plásticos de maior impacto poluidor e riscos à saúde humana. Apesar dos avanços, o tempo disponível não permitiu a construção de consenso global”, afirmou o órgão.

Para Prata, o papel adotado pelo governo brasileiro foi arriscado por não assumir nenhum lado, o que pode impulsionar uma pressão do setor. No entanto, ele reconhece o esforço dos representantes de tentar reduzir a polarização. “É claro que gostaríamos de ver o Brasil mais firme na redução da produção. Mas alguém precisa ocupar o lugar de mediador, mesmo recebendo críticas de todos os lados”, afirma o analista.

Apesar da posição intermediária, Prata elogia o Brasil ao considerar que se preocupou com o financiamento de países ricos para a redução da poluição plástica

“Um ponto que o Brasil foi muito vocal, muito firme e correto, na minha opinião, foi que o país focalizou a necessidade de financiamento para o sul-global. Eu acho que o Brasil cumpriu um papel extraordinário mesmo, porque ele falou: ‘Olha, não existe transição para uma nova economia dos plásticos sem uma participação, uma responsabilização, um envolvimento de países de renda alta mais firme em termos financeiros. Não adianta a gente aqui ficar criando um tratado complexo e com medidas muito ambiciosas sem medidas de viabilização disso’. Então, um tratado ambicioso requer medidas financeiras ambiciosas”, destaca.

Fracasso nas negociações pode pressionar COP30

O adiamento do acordo global pode aumentar a pressão para a COP30, que será realizada em novembro, em Belém, no Pará. O encontro colocará o Brasil no centro das atenções internacionais, e a falta de avanços em Genebra tende a elevar as expectativas sobre o papel que o país poderá desempenhar.

“Tem um problema sistêmico entre os países para resolver quem paga a conta da poluição e da mudança climática. Temos países em desenvolvimento com cada vez mais problemas de poluição e mais impacto da mudança climática, e países do norte-global com cada vez menos capacidade de aprovar grandes orçamentos para a transição ecológica nos seus parlamentos. Isso deixa o cenário mais difícil para a COP30, para todo o mundo e para o Brasil”, alerta Prata.

ONU ainda não definiu data para uma nova reunião

Prata destaca que, desde que a ONU começou o processo de negociações intergovernamentais, em 2022, essa foi a primeira vez que os países chegaram mais perto de concluírem o tratado. No entanto, ele ressalta que, ainda assim, não é o suficiente.

“Eu acho que a gente chegou muito perto em Genebra. Mas muito perto não é o tratado, muito perto não é a solução”, comenta.

Ainda não há uma data para uma nova reunião entre os países, mas, enquanto isso, o porta-voz afirma que as empresas precisam fazer o seu papel na sociedade. Para ele, esse processo passa pela aceleração da mudança de produtos e negócios do mercado.

“A gente não pode ficar esperando um tratado para que a gente, como consumidor, e as empresas, como poluidores, avancem nos seus produtos e modelos de negócios. O setor privado precisa se responsabilizar mais do que vem se responsabilizando nos últimos anos”, afirma.

Em relação aos governos, Prata destaca que é preciso criar leis, normas e políticas para combater a poluição plástica. Por fim, ele afirma que não é recomendável que o processo de negociação se dissolva.

“É manter a pressão para que o ciclo de negociação se mantenha para que a gente faça o tratado. A gente precisa ter medidas, nas empresas, que são quem produzem plástico e poluição plástica, nos governos, criando suas normas, e no âmbito nacional, pressionando para que a negociação não se dilua”, afirma.

Novo mercado do plástico

Em meio aos debates e à urgência de tratar a poluição do plástico, os países estão aderindo à economia circular dos plásticos. O modelo considera todas as etapas da jornada de um produto – antes e depois de chegar ao cliente.

“É um modelo novo. O mercado transita de uma lógica linear que a gente tem hoje, que é de extração de matéria-prima viva da natureza, transformação da indústria e consumo muito rápido do plástico”, explica Prata.

De acordo com o especialista, para se ter a economia circular, é preciso eliminar todos os itens de plástico problemáticos e desnecessários, inovar para garantir que os plásticos de que precisamos sejam reutilizáveis, recicláveis ou compostáveis e por fim, reaproveitar todos os itens de plástico que usamos para mantê-los na economia e fora do meio ambiente.

Fonte: R7

 

 

 

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