ARACAJU/SE, 6 de agosto de 2025 , 21:07:29

80 anos de Hiroshima: Japão lembra vítimas da bomba atômica em meio à tensão nuclear

 

O Japão realizou nesta quarta-feira (6) um minuto de silêncio para marcar o 80º aniversário do lançamento da bomba atômica de Hiroshima e lembrar ao mundo o horror causado pela guerra, em um contexto de tensão entre os Estados Unidos e a Rússia, duas potências nucleares.

O primeiro-ministro japonês Shigeru Ishiba caminha entre coroas de flores durante o evento que marca o 80º aniversário do bombardeio atômico em Hiroshima, no oeste do Japão, em 6 de agosto de 2025.

Em Hiroshima, os moradores fizeram um minuto de silêncio às 8h15 locais, hora em que o avião americano Enola Gay lançou a bomba “Little Boy” sobre a cidade, em 6 de agosto de 1945. O ataque matou cerca de 140 mil pessoas, não apenas na explosão, mas também em decorrência da radiação, deixando cerca de 150 mil feridos. Três dias depois, outra bomba matou 74 mil pessoas na cidade japonesa de Nagasaki.

“No ponto de impacto da bomba, a temperatura atingiu 4 mil graus Celsius. Um vento escaldante, de mais de 245 km/h, se espalhou pela cidade”, disse Katsufumi Shiraishi, voluntário da Fundação Japonesa para a Promoção da Paz, em Nagasaki. Ele conta que os sobreviventes estavam com tanta sede que beberam água dos arrozais – o que foi fatal porque a água foi contaminada pela chuva radioativa. “Em um raio de um quilômetro, todas as casas de madeira foram destruídas. Mesmo os prédios de concreto não resistiram. Foi uma carnificina. Em uma fração de segundo, milhares de pessoas morreram”, continua.

Shigemitsu Tanaka tinha 4 anos à época. Morador de Nagasaki, ele nunca esqueceu das cenas horríveis que testemunhou. “Os feridos não conseguiam mais abrir os olhos porque o clarão da bomba os havia cegado. Corpos cobriam as ruas, às vezes tão carbonizados que não era possível distinguir se eram homens ou mulheres”, relata. “Havia tantos cadáveres que eles eram empilhados em carroças puxadas por bois. Um cheiro estranho era sentido por toda a cidade. Foi aterrorizante”, conclui.

Nos anos subsequentes, milhares de sobreviventes desenvolveram leucemia, câncer e outros efeitos colaterais da gigantesca radiação a que foram expostos.

Japoneses temem que armas nucleares voltem a ser usadas

O Império Japonês se rendeu em 15 de agosto de 1945, marcando o fim da Segunda Guerra Mundial. Quatro décadas depois, pesquisas mostram que 70% dos moradores das duas cidades que sobreviveram aos bombardeios atômicos temem que armas nucleares voltem a ser usadas no futuro.

Vestidos de preto, centenas de estudantes, sobreviventes e trabalhadores depositaram flores no Memorial pela Paz, em Hiroshima. O prefeito da cidade, Kazumi Matsui, alertou para “uma tendência acelerada de fortalecimento militar no mundo”, que tem como pano de fundo a invasão da Ucrânia e o conflito no Oriente Médio.

Para o primeiro-ministro Shigeru Ishiba, o Japão, único país a ter sofrido um ataque nuclear durante a guerra, tem a missão de “assumir a liderança para um mundo sem armas nucleares”.

Atualmente, Hiroshima é uma metrópole próspera de 1,2 milhão de habitantes, mas as ruínas de um edifício, no centro da cidade, permanecem como uma memória impactante.

Representantes de cerca de 120 países e regiões participaram da cerimônia desta quarta-feira, incluindo, pela primeira vez, representantes taiwaneses e palestinos.

Em uma cadeira de rodas, Yoshie Yokoyama, 96 anos, fez questão de participar da cerimônia, acompanhada do neto. Ela contou que seus pais e avós foram vítimas da bomba. “Meu avô morreu logo após o bombardeio, meu pai e minha mãe morreram de câncer. Meus sogros também morreram e meu marido não pôde vê-los, quando retornou da guerra”, contou.

“É importante que muitas pessoas se reúnam nesta cidade afetada pela bomba atômica, porque as guerras continuam ao redor do mundo”, ressaltou Toshiyuki Mimaki, presidente do Nihon Hidankyo, um grupo de sobreviventes da bomba. Após receber, em 2024, o Prêmio Nobel da Paz, o grupo Hidankyo pede aos países que atuem para eliminar as armas nucleares, citando os testemunhos dos sobreviventes de Hiroshima e Nagasaki, conhecidos como “hibakusha”. “Desejo que os representantes estrangeiros visitem o Museu Memorial da Paz e entendam o que ocorreu”, disse Mimaki.

Tensão crescente

O papa Leão XIV expressou pesar pelos acontecimentos passados e pela tensão presente. Em um comunicado, disse que “em nossa era de tensões crescentes e conflitos globais”, Hiroshima e Nagasaki continuam sendo “lembranças vivas dos horrores profundos causados pelas armas nucleares”.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou que “as mesmas armas que causaram tanta devastação em Hiroshima e Nagasaki são novamente tratadas como ferramentas de coerção”.

Os bombardeios a Hiroshima e Nagasaki foram o único uso de armas atômicas em tempos de guerra.

Kunihiko Sakuma tinha 9 meses quando ocorreu o bombardeio e estava a 3 km do ponto de impacto. “Acredito que a tendência para um mundo sem armas nucleares continuará. A geração jovem trabalha arduamente para conseguir isso”, afirmou o sobrevivente à AFP.

Rússia e Estados Unidos respondem por cerca de 90% das 12 mil ogivas nucleares do mundo, segundo o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Sipri), que alertou em junho para uma nova “corrida armamentista nuclear”.

Arsenais nucleares voltaram a ser citados em um recente embate verbal entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o ex-presidente russo e atual vice-presidente do Conselho de Segurança, Dmitry Medvedev. O republicano ordenou o deslocamento de dois submarinos nucleares, após ser acusado de adotar um “jogo de ultimatos”. Trump havia dado um prazo de dez dias para que a Rússia aceitasse um cessar-fogo, sob pena de enfrentar sanções econômicas mais duras. Em resposta, Medvedev publicou em seu canal no Telegram que “cada novo ultimato de Trump é um passo em direção à guerra”. Ele ainda fez referência ao sistema soviético de dissuasão nuclear.

Fonte: Terra

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