ARACAJU/SE, 22 de setembro de 2025 , 19:03:03

Bancos brasileiros reforçam atuação nos Estados Unidos para evitar ser alvos da Lei Magnitsky

 

Preocupadas com a extensão das punições da Lei Magnitsky, as instituições financeiras reforçaram a atuação nos Estados Unidos. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban), entidade que representa os maiores do setor bancário do país, contratou neste mês, em meio ao julgamento que condenou o ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, o escritório americano de advocacia Arnold & Porter.

O objetivo é monitorar os movimentos do governo de Donald Trump e atuar para mitigar riscos de eventuais sanções americanas contra os principais bancos brasileiros em meio à expansão de sancionados no rol da Magnitsky.

Nesta segunda-feira (22), foram incluídos na lista de sancionados a esposa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre Moraes, Viviane Barci de Moraes, e a empresa Lex Instituto de Estudos Jurídicos, da qual são sócios ela e dois filhos do ministro.

O escritório Arnold & Porter, onde atua o ex-embaixador dos Estados Unidos no Brasil Thomas Shannon, também representa a Advocacia-Geral da União (AGU) nos EUA, com o objetivo de reverter as sanções de Trump a autoridades do país. Um advogado familiarizado com o assunto afirma que o escritório, sediado em Washington, tem a função também de fazer um “corpo a corpo” com integrantes do governo e congressistas americanos, mais do que apenas prestar assessoramento jurídico.

O movimento se contrapõe à atuação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e do blogueiro bolsonarista Paulo Figueiredo, que vivem nos EUA e têm atuado junto ao entorno de Trump com o objetivo de livrar Bolsonaro dos desdobramentos das investigações na Justiça brasileira. Eles pedem à Casa Branca a aplicação da Magnitsky para mais casos e também sanções por um suposto descumprimento dos bloqueios determinados pela lei sobre o ministro Alexandre de Moraes.

A Febraban confirmou em nota a contratação do escritório americano “para acompanhar a evolução das questões relativas ao setor bancário nos Estados Unidos”. Procurado, o ex-embaixador Shannon disse não poder comentar sobre clientes do Arnold & Porter.

Moraes foi incluído no rol de sancionados pela Magnitsky em julho. A lei americana, editada no governo Obama, foi desenhada para decretar a “morte financeira” de indivíduos e instituições classificadas como graves violadores de direitos humanos ou envolvidos em gravíssimos casos de corrupção, o que não é o caso do magistrado.

O ministro do STF, relator da ação penal da trama golpista na Corte, teve cartões de crédito de bandeiras americanas cancelados, mas manteve sua conta bancária intacta. Como revelou a colunista Bela Megale, do GLOBO, Eduardo Bolsonaro passou a solicitar sanções ao Banco do Brasil, instituição responsável pela folha de pagamentos do STF, por suposto descumprimento do bloqueio contra Moraes. Na ocasião, o BB afirmou que segue as leis brasileiras e internacionais.

Com a condenação de Bolsonaro e dos demais réus do núcleo central da trama golpista, a perspectiva do setor bancário é que as autoridades americanas incluam mais brasileiros entre os sancionados. Podem entrar na lista mais ministros do STF e membros dos primeiro e segundo escalões do governo Lula, bem como seus familiares. Com isso, mais instituições financeiras, inclusive privadas, poderiam ser afetadas.

A consultoria de risco político Eurasia Group afirmou em recente relatório considerar como as três mais prováveis sanções do governo americano a revogação de mais vistos de autoridades brasileiras, a inclusão de outros ministros do STF e seus familiares no rol de sancionados da Lei Magnitsky e a classificação do Primeiro Comando da Capital (PCC) e do Comando Vermelho (CV) como organizações terroristas.

“Há também a possibilidade da imposição de tarifas adicionais ao Brasil como sanções pela compra, feita pelo país, de diesel da Rússia. A inclusão do PCC e do CV como organizações terroristas foi discutida pelo governo americano, mas não deve ser implementada no curto prazo e faria parte de uma política mais ampla de combate ao narcotráfico”, explica o diretor da consultoria para as Américas, Christopher Garman.

A Febraban nega que o escopo do contrato esteja relacionado a “qualquer trabalho sobre eventuais sanções americanas decorrentes de notícias da utilização do sistema financeiro pelo crime organizado.” Segundo a instituição, “as notícias das operações deflagradas não apontam o envolvimento de bancos, mas eventualmente de algumas fintechs”. O escritório Arnold & Porter também confirmou ao GLOBO a contratação para “aconselhar (a Febraban) em assuntos relacionados ao setor bancário”. Em nota, a banca de advogados diz que o contrato “não envolve, de nenhum modo, nada relacionado” à inclusão de facções criminosas brasileiras como organizações terroristas.

Preocupação adicional

Reservadamente, um alto executivo do setor bancário familiarizado com o assunto afirmou que a entidade também quer estar “perto” do governo americano para mapear a percepção da Casa Branca sobre a infiltração do crime organizado no sistema financeiro do Brasil em meio a operações como a Carbono Oculto, da Polícia Federal.

A operação mirou instituições, como fintechs e gestoras, que teriam ligação com o PCC por administrar fundos e recursos da facção criminosa. Historicamente, a Febraban pressiona órgãos reguladores no Brasil para que as fintechs tenham obrigações regulatórias similares às dos bancos. Esse pleito ganhou força com os ataques recentes de criminosos ao sistema financeiro, seja via golpes cibernéticos ou por participação ativa de instituições em esquemas de lavagem de dinheiro.

O governo de Trump já solicitou ao Brasil que classificasse facções criminosas, a exemplo do PCC e do CV, como terroristas, mas recebeu em maio uma negativa formal do Ministério da Justiça. O plano da gestão de Trump era poder enviar os presos que pertencem a essas facções nos EUA à prisão do Cecot, localizada em El Salvador, na América Central, e inaugurada em 2022 para abrigar terroristas.

Formalmente, o governo brasileiro diz que essas organizações criminosas não se enquadram na definição de terroristas da lei brasileira, que exige que o emprego da violência seja motivado por razões político-ideológicas. A principal razão da negativa, porém, é que o enquadramento das facções como terroristas colocaria o Brasil como alvo de sanções econômicas internacionais. O país teria dificuldades, por exemplo, em obter financiamentos junto a órgãos de fomento multilaterais.

Fonte: O Globo

 

 

 

 

 

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