Documentos sigilosos que detalham segredos de segurança nacional dos Estados Unidos na Ucrânia, no Oriente Médio e na China vazaram nesta sexta-feira (7) nas redes sociais, deixando o governo americano alarmado. O episódio se segue a vazamento anterior apontado pelo Pentágono de arquivos que detalham planos de Washington e da Otan para o conflito no Leste Europeu.
Analistas dizem que mais de cem documentos sigilosos podem ter sido obtidos, algo potencialmente prejudicial. Um alto funcionário da inteligência americana descreveu a situação como um pesadelo para EUA, Austrália, Nova Zelândia e Canadá, nações que compartilham amplamente informações de inteligência.
Os documentos mais recentes foram encontrados no Twitter e em outros sites um dia após funcionários do governo de Joe Biden afirmarem que já estavam investigando um possível vazamento no Twitter e no Telegram de planos de guerra sigilosos, incluindo uma avaliação das capacidades de defesa aérea da Ucrânia.
Analistas militares disseram que os documentos parecem ter sido modificados em certas partes de seu formato original, exagerando estimativas dos EUA de ucranianos mortos na guerra e subestimando as estimativas de mortes entre os soldados russos.
Analistas ouvidos pelo jornal “The New York Times” afirmam que as modificações podem indicar um esforço de desinformação de Moscou. Mas as revelações nos documentos originais, que aparecem como fotos de tabelas de entregas antecipadas de armas, forças de tropas e batalhões e outros planos, representam uma importante falha da inteligência dos EUA no esforço para ajudar a Ucrânia.
“Estamos cientes dos relatos de postagens nas redes sociais, e o departamento está analisando o assunto”, disse Sabrina Singh, porta-voz do Pentágono.
Para Mick Mulroy, ex-funcionário do Pentágono, o vazamento representa uma violação significativa de segurança. “Como muitos dos arquivos eram fotos de documentos, parece que foi um vazamento deliberado feito por alguém que desejava prejudicar esforços da Ucrânia, dos EUA e da Otan”, disse.
O conteúdo das informações confidenciais vazadas nesta sexta é mais amplo e inclui, até onde especialistas conseguiram verificar, slides com informações sobre China, Oriente Médio e terrorismo. Já os documentos sobre as Forças Armadas da Ucrânia não fornecem planos de batalha específicos, sobre como, quando e onde a Ucrânia pretende lançar sua ofensiva, que, segundo autoridades americanas, provavelmente acontecerá no próximo mês.
Um atenuante é que os documentos vazados têm cinco semanas, o que, na prática, oferece um retrato da visão americana em 1º de março e, portanto, limitado. Para o olho treinado de um analista de inteligência ou militar de alto escalão de um país adversário, porém, os arquivos podem oferecer pistas tentadoras.
Os documentos mencionam, por exemplo, a taxa de gastos de Himars (sistema de foguetes de artilharia de alta mobilidade, na sigla em inglês) fornecidos pelos EUA, que podem lançar ataques contra alvos como depósitos de munição, infraestrutura e concentrações de tropas, à distância. O Pentágono não disse publicamente com que velocidade as tropas ucranianas estão usando as munições Himars; os documentos, sim.
Analistas disseram nesta sexta que seria difícil avaliar o impacto da divulgação dos documentos na linha de frente de combate, agora e nos próximos meses. A própria ofensiva recente da Rússia tem lutado para obter ganhos no leste da Ucrânia, e analistas ocidentais debatem se os militares russos, depois de sofrer baixas significativas, são capazes de montar outra ou de resistir a um ataque ucraniano.
Não ficou claro como os documentos foram parar nas redes sociais, mas os EUA detectaram o compartilhamento de parte dos materiais sendo divulgado em canais pró-Rússia.
O vazamento é o primeiro avanço da inteligência russa publicado desde o início da guerra. Durante o conflito, os EUA forneceram à Ucrânia informações sobre postos de comando, depósitos de munição e outros pontos importantes nas linhas militares russas. Essa inteligência em tempo real permitiu que os ucranianos atingissem as forças russas, matando generais e forçando o afastamento dos suprimentos de munição das frentes russas.
Mas no início da guerra as autoridades ucranianas hesitaram em compartilhar seus planos de batalha com os EUA, justamente por medo de vazamentos. Preocupados com o fato de que essa hesitação também poderia destacar fraquezas e desencorajar o apoio americano, Kiev passou a dividir mais informações sensíveis. Ainda não se sabe qual efeito os novos vazamentos terão nessa relação.
Reação de Zelensky
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse nesta sexta-feira que Kiev tomaria novas medidas para evitar vazamentos sobre sua planejada ofensiva de primavera após documentos sigilosos que detalham segredos de segurança nacional dos Estados Unidos na Ucrânia, no Oriente Médio e na China terem vazado nas redes sociais.
Zelensky disse que convocou os principais comandantes militares e oficiais de segurança do país na sexta-feira para discutir o esforço planejado para recuperar os 18% da Ucrânia que permanecem ocupados pela Rússia. A reunião, acrescentou em comunicado, também discutiu novas “medidas para evitar vazamentos de informações sobre os planos das forças de defesa ucranianas”.
Aric Toler, chefe de pesquisa e treinamento do consórcio investigativo Bellingcat, disse que encontrou o esconderijo de novos documentos na sexta-feira, um dia depois de pelo menos seis supostas imagens de documentos classificados dos EUA terem sido publicadas na plataforma Telegram por comentaristas de guerra pró-Kremlin. Pelo menos uma dessas imagens foi alterada – para diminuir a estimativa de baixas russas e aumentar as perdas ucranianas.
Essas e algumas imagens adicionais foram postadas na plataforma de mensagens 4chan na quinta-feira.
Dezenas de imagens recém-descobertas vistas pelo “The Wall Street Journal” continham informações altamente valiosas para os adversários dos EUA, particularmente a Rússia.
FONTE: VALOR ECONÔMICO