O Parlamento do Irã aprovou, nesse domingo (22), segundo a mídia local, o fechamento do estreito de Ormuz – principal rota de exportação de produtos dos países do Golfo Pérsico, que inclui, além do Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Omã, Iraque e Kuwait.
A rota hoje é responsável pela entrega de 20% a 30% da demanda global de petróleo. Cabe agora ao Conselho de Segurança do Irã e ao líder supremo, o aiatolá Ali Khamenei, decidirem se a medida será efetuada.
O avanço nas trativas para bloquear o acesso ao estreito de Ormuz vem depois de os EUA atacarem, no sábado (21), as instalações nucleares do Irã.
A medida, porém, afetaria o mercado global de petróleo, que já tem registrado alta na cotação do barril desde o início do conflito, em 12 de junho (horário de Brasília).
Na última semana, o barril tipo brent (cotação internacional) fechou em sucessivas altas. Na sexta-feira (20), registrou queda no dia. Os ataques deste fim de semana e as tratativas de interromper o acesso ao estreito devem refletir na cotação da commodity nesta segunda-feira (23), com possível nova alta.
Escalada
No sábado, ao menos seis bombardeiros B-2 dos EUA atacaram as estruturas nucleares do Irã. Depois da ação militar, o presidente Donald Trump (republicano) compartilhou uma mensagem que dizia o seguinte: “Fordow já era”.
Fordow é uma base nuclear construída no início dos anos 2000 no interior de uma montanha no centro do Irã. A topografia protege o local, principalmente de ataques aéreos. Israel não tem os armamentos necessários para destruir essa instalação.
Nesse domingo (22), o general Dan Caine, chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA, evitou dizer que as estruturas foram “destruídas”, como tinha dado a entender Trump. Preferiu dizer que foram“danos severos”.
Como pode afetar rota do petróleo
O Parlamento do Irã aprovou, nesse domingo (22), o fechamento do estreito de Ormuz, região marítima entre o Golfo de Omã e o Golfo Pérsico que é via de transporte de 20% a 30% de todo o petróleo global. A área também é importante para o tráfego do GNL (gás natural liquefeito) do Qatar e dos Emirados Árabes.
A recomendação do Legislativo iraniano foi tomada depois do bombardeio ordenado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Republicano), às instalações nucleares do país persa. Antes de ser posta em prática, a obstrução tem que passar pelo aval do líder supremo do país, aiatolá Ali Khamenei. Se avançar, a medida tem potencial de afetar de forma imediata toda a logística energética do planeta.
O direito de passagem por águas internacionais é protegido por acordos da Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Unclos (Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar). Mesmo assim, o Irã pretende fechar a região unilateralmente em resposta aos ataques dos EUA.
Além do petróleo bruto, produtos como derivados da commodity e outras mercadorias passam pelo canal. São eles: plásticos, fertilizantes e produtos químicos; automóveis, maquinários e eletrônicos asiáticos – que dependem de transporte marítimo na região e trafegam pelo oceano Índico e canal de Suez.
Uma eventual obstrução do tráfego terá um efeito em cadeia com potencial de impactar a inflação global. A decisão do Irã pode elevar, indiretamente, os custos logísticos e do frete marítimo por causa do encarecimento dos seguros. Segundo analistas, haverá pressão nos preços de alimentos e transporte.
A oferta da commodity cairá e, por consequência, o preço internacional do barril subirá. Outras nações devem sentir efeitos negativos na inflação, inclusive o Brasil.
Os países mais impactados devem ser a China, a Índia, o Japão e a Coreia do Sul, segundo Fábio Ongaro, economista, CEO da Energy Group e vice-presidente de Finanças da Italcam (Câmara Italiana de Comércio de São Paulo). As nações dependem “fortemente” do petróleo do Golfo Pérsico. A Europa pode ser prejudicada, em parte, porque recebe volumes de petróleo pelo canal do Suez, via localizada no Egito.
“Os Estados Unidos são menos dependentes de petróleo do Golfo, mas precisa manter segurança da navegação global. Teriam que reagir militarmente para proteger aliados e interesses estratégicos”, disse Ongaro. “Arábia Saudita e Emirados são fortemente dependentes do estreito para exportar petróleo. Os rivais regionais do Irã estariam entre os mais prejudicados em um bloqueio”, completou.
Israel – que está em conflito com Irã – não depende do petróleo transportado do estreito de Ormuz, mas também pode ser prejudicado com o bloqueio. Segundo João Alfredo Nyegray, professor de Negócios Internacionais e Geopolítica da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), o impacto será indireto.
“Israel, por sua posição, diplomacia e relação com Irã, não importa petróleo a partir do Estreito de Ormuz. Só que, ainda assim, como qualquer país que depende da importação de petróleo e derivados, Israel vai enfrentar o aumento de custos energéticos. Isso vai afetar transportes, indústria e custos militares”, disse.
Acordo de tráfego no mar
O Irã não tem o domínio completo do estreito de Ormuz, mas controla parte significativa da costa e das águas territoriais no lado norte.
O direito de passagem por águas internacionais é um tratado daConvenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Mas, segundo Nyegray, o Irã pode justificar a obstrução do canal por causa dos ataques militares dos EUA.
“Há normas reconhecidas pelas Nações Unidas que tratam da liberdade de navegação. […] Os Estados costeiros têm o direito de impor regras de segurança, mas não podem bloquear os canais. O Irã até assinou essa convenção, mas nunca ratificou. Ou seja, na prática, não está sendo obrigado a cumprir os mandamentos da convenção de direito do mar”, disse o professor.
Para ele, a retaliação do Irã é estratégica. “Esse fechamento [do estreito de Ormuz] é uma resposta à escalada militar ocidental. Essa ação vai tanto punir o Ocidente quanto mostrar o poder de seus instrumentos geopolíticos capazes de desestabilizá-los”, disse o professor.
O Irã já ameaçou anteriormente fechar o estreito de Ormuz, mas jamais seguiu com a iniciativa.
Alexandre Coelho, professor de Relações Internacionais da FespSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), avalia que o estreito de Ormuz é “uma das poucas moedas de troca” diplomática do Irã. Ele disse o tom mais “radical” dos EUA contra o país persa limita as negociações.
“O Irã pode fazer isso como moeda de troca para tentativa de negociação diplomática e trazer para a mesa, inclusive de forma mais ativa, a China e alguns países europeus”, afirmou.
Para ele, um eventual bloqueio da via marítima não deve durar muito tempo. Coelho disse que países podem se unir contra o Irã para retomar o comércio internacional na região.
“Com certeza os EUA devem entrar no estreito com ataques e mísseis tentando desbloquear e bombardear as forças iranianas que estiverem por ali. […] No caso de bloqueio, Omã e a Arábia Saudita podem se aliar aos EUA no esforço internacional de tentativa de demover o Irã”, defendeu Coelho.
O Irã tem instaladas no local minas subaquáticas desde a Guerra do Iraque –de 2003 a 2011. Esse movimento permite que haja um controle do tráfego mesmo sem bloqueios físicos.
“O Irã tem capacidade militar para bloquear o estreito temporariamente, usando: mísseis de costa, minas marítimas, lanchas rápidas armadas, submarinos e drones navais. No entanto, isso seria considerado um ato de guerra e provavelmente levaria a uma resposta militar dos EUA e aliados do Golfo”, disse Ongaro, CEO da Energy Group.
Fonte: Poder360