ARACAJU/SE, 2 de outubro de 2025 , 19:02:20

Rede russa de espionagem utilizava o Brasil como base para infiltração de agentes no Ocidente

 

A Polícia Federal (PF) e sua diretoria de inteligência mapearam uma rede de espiões russos que utilizava o país como território neutro para criar identidades falsas e repassar informações estratégicas à Rússia.

Ao todo, dez pessoas foram identificadas desde 2022, em diferentes disfarces, que iam de estudante de forró em São Paulo a dono de joalheria em Brasília.

Nove dos suspeitos deixaram o Brasil após serem descobertos. Apenas um segue atrás das grades: Sergey Vladimirovich Cherkasov, considerado peça-chave da espionagem em território brasileiro.

Coleta de informações

Cherkasov vivia em São Paulo desde 2010 com documentos falsos em nome de Victor Muller Ferreira. Em 2022, acabou preso ao tentar desembarcar em Amsterdã com passaporte brasileiro adulterado para assumir um estágio no Tribunal Penal Internacional (TPI).

Isso aconteceu justamente quando o TPI começava a investigar crimes de guerra cometidos pela Rússia na Ucrânia.

Expulso da Holanda, retornou ao Brasil, onde foi autuado por falsidade ideológica e, mais tarde, alvo de novos inquéritos por espionagem e lavagem de dinheiro.

De acordo com a PF, o objetivo de Cherkasov era obter acesso a informações sobre as investigações contra a Rússia.

O presidente Vladimir Putin tem um mandado de prisão emitido pelo TPI por crimes de guerra relacionados à deportação ilegal de crianças ucranianas para território russo.

Em mensagens obtidas pela PF em celulares e computadores, Cherkasov relatava aos superiores em Moscou que estava prestes a trabalhar no tribunal e recebia pagamentos que chegavam a R$ 35 mil, transferidos por funcionários ligados ao governo russo no Brasil.

O caso dele levou à abertura de uma investigação mais ampla que revelou a atuação de pelo menos outros nove espiões em solo nacional.

Para despistar, os agentes criaram personagens detalhados e plausíveis: um modelo que circulava em eventos de moda; um comerciante respeitado no setor de joias; e um estudante integrado à cena cultural paulistana.

De acordo com as investigações, o intuito eram ser aceitos como brasileiros também em outros países.

Espionagem na América Latina

Documentos levantados pela PF indicam que parte da rede tinha apoio direto de representações oficiais da Rússia no Brasil. Um funcionário comercial do consulado no Rio de Janeiro foi apontado como elo de contato, mas deixou o país antes de prestar depoimento.

A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a inteligência da PF também rastrearam movimentações que ligavam a Embaixada russa, em Brasília, ao fornecimento de suporte logístico.

O esquema, contudo, não se restringia ao território brasileiro. Informações repassadas por serviços de inteligência parceiros — entre eles CIA, em Washington, e agências da Austrália e Portugal — apontam que a rede também operava na Argentina e na Venezuela.

Em Buenos Aires, um casal de agentes russos chegou a registrar filhos como argentinos, o que permitiu ao grupo se infiltrar na Eslovênia, país da União Europeia e integrante da Otan.

Quando retornaram a Moscou em 2023, foram recebidos com flores pelo próprio Putin. Já na Venezuela, a suspeita é de que agentes tenham desembarcado em aviões diplomáticos, com trânsito facilitado por Caracas.

Próximos passos

Enquanto a trama internacional se desenrola, Cherkasov cumpre pena na Penitenciária Federal de Brasília, após passar nove meses em cela da PF em São Paulo. Sua prisão virou alvo de disputa diplomática.

A Rússia solicitou a extradição alegando que ele é foragido por tráfico de drogas, argumento que a PF considera forjado.

Os Estados Unidos também pediram a transferência dele, alegando que Cherkasov operou em solo americano como espião. O caso está sob análise do STF (Supremo Tribunal Federal), com acompanhamento do Itamaraty.

Para investigadores brasileiros, Cherkasov é o elo que conecta toda a rede. Outro tema que preocupa é identificar se existem outros agentes podem ainda viver sob disfarce no Brasil e na América Latina.

Fonte: R7

 

 

 

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