Quase metade dos brasileiros evita ler ou assistir ao noticiário às vezes ou sempre, indica o Relatório de Mídia Digital do Instituto Reuters, divulgado nesta segunda-feira (17).
A proporção de brasileiros que evitam notícias subiu para 47% em 2024, uma alta de seis pontos porcentuais em relação ao ano passado (41%).
A pesquisa, que ouviu 94.943 pessoas em 47 países, indica que cerca de quatro em cada dez pessoas no mundo (39%) evitam o noticiário às vezes ou sempre, uma alta de três pontos porcentuais em comparação com o ano passado — a porcentagem era de 29% em 2017.
O levantamento não especifica uma margem de erro porque não faz uma amostra probabilística da população, isto é, não seleciona os entrevistados de forma aleatória, o que a impede de ser representativa de toda a sociedade.
Mesmo assim, ela traz achados interessantes. Os entrevistados afirmaram, por exemplo, que o noticiário é “repetitivo e entediante”, e que o fato de a maior parte das notícias ser negativa os deixa “ansiosos e impotentes”. Brasil, Espanha, Alemanha e França foram os países em que a rejeição às notícias teve um aumento maior que a média.
Não apenas as pessoas têm evitado mais o noticiário, mas têm se sentido cada vez mais sobrecarregadas pela quantidade de notícias que circulam.
No Brasil, houve alta de 16 pontos nesse aspecto — em 2019, 30% das pessoas se sentiam esgotadas pelo volume de notícias, e, em 2024, 46%. A pesquisa ouviu 2.022 pessoas no Brasil por meio de formulários online em janeiro e fevereiro deste ano.
Segundo Rodrigo Carro, autor do capítulo do relatório que trata do Brasil, uma explicação para essa fuga do noticiário teria sido a “agenda pesada de jornalismo” nos últimos tempos, pautada pelas investigações do envolvimento do ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados nos ataques de 8 de janeiro e pelas coberturas das guerras na Ucrânia e em Gaza.
No mundo, mudanças nos algoritmos e nas prioridades das plataformas de internet geram incertezas para os veículos de notícia. Os aplicativos da Meta (Facebook, Instagram e Threads) e o X vêm reduzindo o destaque dado a notícias e a conteúdos políticos. Com isso, continuou a cair o uso do Facebook como fonte de notícias (37%, uma queda de 4 pontos percentuais). O X também perdeu relevância como fonte de notícias (10%), e foi ultrapassado pelo TikTok (13%).
É uma má notícia para os veículos de mídia, que continuam dependendo pesadamente de buscadores e agregadores e das redes sociais para distribuir o conteúdo que produzem.
Apenas 22% dos entrevistados disseram usar sites ou aplicativos de veículos de mídia para acessar notícias on-line — eram 32% em 2018. Enquanto isso, a quantidade de pessoas que obtêm notícias por meio das redes sociais subiu de 23% em 2018 para 29% em 2024; por buscadores como o Google, de 24% para 25%; e por agregadores como o Google Notícias e o Flipboard, de 6% para 8%.
Com a disseminação de buscadores que usam inteligência artificial para fornecer respostas e reduzem o número e destaque de links, existe a possibilidade de que o tráfego em sites noticiosos caia ainda mais.
“Cada vez mais o público está recorrendo a plataformas para acessar conteúdo e informação. Muitas dessas plataformas, no entanto, estão se afastando de notícias e veículos de mídia, e focando outros tipos de conteúdo”, diz Rasmus Nielsen, diretor do Instituto Reuters.
“Esse ecossistema mais complicado de plataformas e o fim do tráfego maciço vindo das redes sociais tradicionais para os veículos significam que eles e jornalistas terão que se esforçar muito mais para conquistar a atenção do público, e ainda mais para convencer as pessoas a pagar por notícias”.
A disposição das pessoas de pagar por notícias on-line continua baixa. Levantamento em 20 países — o Brasil não aparece na lista — indica que apenas 17% dos entrevistados afirmam ter pagado por notícias no ano anterior.
O índice é maior em países como Noruega (40%) e Suécia (31%) e menor no Japão (9%) e Reino Unido (8%). Ainda assim, boa parte dos entrevistados (41%) afirma que está pagando menos do que o preço integral das assinaturas, aproveitando-se de promoções.
Mais de metade (55%) daqueles que declaram não ter assinatura de veículos de notícias diz que não estariam dispostos a desembolsar nenhum centavo para consumir notícias on-line.
Acompanhando as mudanças nas plataformas, os vídeos se tornam uma fonte de notícias cada vez mais importante, especialmente entre os mais jovens. Semanalmente, vídeos noticiosos curtos são acessados por 66% dos entrevistados do relatório, e os mais longos, por 51%.
Esses vídeos são acessados principalmente por meio de plataformas de internet (72%), em vez dos sites dos veículos de mídia (22%), o que representa mais um desafio para o jornalismo em termos de geração de receita.
Além disso, usuários do TikTok, Instagram e Snapchat recorrem muito mais a influenciadores e celebridades do que a jornalistas ou veículos de mídia para se informar.
Os entrevistados afirmam preferir esses meios porque a “natureza sem filtro dos vídeos faz com que eles pareçam mais confiáveis e autênticos que a mídia tradicional” e porque as plataformas de vídeos “trazem diferentes perspectivas” — para muitos, isso significa pontos de vista mais alinhados às suas próprias posições políticas e ideológicas.
Também no Brasil, os veículos de notícia não são páreo para os influenciadores no TikTok, que arregimentam multidões de seguidores na rede de compartilhamento de vídeos.
A TV Globo, maior televisão do país, tem 6 milhões de seguidores no TikTok, enquanto o comediante Whindersson Nunes tem 22,4 milhões.
Há receios, no entanto, em relação à qualidade das informações. TikTok e X são consideradas as fontes menos confiáveis de notícias pelos brasileiros — 24% dos usuários afirmam ser difícil saber quais os conteúdos nessas redes têm credibilidade.
Fonte: Folha de S.Paulo