O plenário do Senado Federal pode votar nesta quarta-feira (7) a chamada PEC da Transição – que tem como objetivo principal assegurar o pagamento de R$ 600 do Bolsa Família (atual Auxílio Brasil).
O texto foi aprovado nesta terça (6) pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, mas o acordo firmado pelo relator, Alexandre Silveira (PSD-MG), exigiu mudanças na proposta defendida pelo governo eleito.
A proposta que será levada ao plenário do Senado tem três mudanças principais em relação à versão inicial proposta pela transição de governo:
- o espaço adicional dentro do teto de gastos para acomodar o Bolsa Família caiu dos R$ 175 bilhões iniciais para R$ 145 bilhões;
- o prazo de vigência dessas regras para o Bolsa Família passou de quatro para dois anos;
- o prazo para o governo eleito encaminhar ao Congresso uma proposta de “novo regime fiscal” (entenda abaixo) passou de um ano para oito meses.
A PEC garante ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), uma margem no Orçamento da União dos próximos anos para manter os R$ 600 mensais do atual Auxílio Brasil na retomada do Bolsa Família, já a partir de janeiro.
O governo eleito também prometeu uma parcela adicional de R$ 150 para cada criança de até 6 anos na família. A equipe de Lula espera, ainda, usar parte da folga orçamentária aberta pela PEC para honrar outras promessas de campanha – Farmácia Popular, reajuste da merenda escolar e do salário mínimo e retomada dos programas de moradia popular, por exemplo.
No plenário do Senado, a PEC precisa de pelo menos 49 votos favoráveis, em dois turnos – se houver acordo, as duas votações podem acontecer no mesmo dia. Se for aprovada, a proposta segue para a Câmara dos Deputados.
A equipe petista corre contra o tempo porque quer aprovar a proposta antes da votação do Orçamento de 2023, prevista para o fim deste mês. No Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), estarão detalhados os valores que cada programa do novo governo no ano que vem, inclusive o Bolsa Família.
Teto mais alto
A versão da PEC costurada nesta terça por Alexandre Silveira prevê a ampliação do teto de gastos – barreira fiscal que limita a dívida pública e proíbe o governo aumentar despesas acima do que foi gasto no ano anterior acrescido da inflação.
Essa ampliação, de acordo com o relatório, será de no máximo R$ 145 bilhões – R$ 30 bilhões a menos do montante estimado para custear o Bolsa Família.
Essa redução, a princípio não coloca o custeio do Bolsa Família em risco. Isso, porque a proposta de Orçamento de 2023 já reservava R$ 105 bilhões para o Auxílio Brasil.
Ou seja, na prática, o valor disponível para o governo será de R$ 105 bilhões (já reservados) + R$ 145 bilhões (abertos se a PEC for aprovada em definitivo).
Após a aprovação da PEC:
- R$ 70 bilhões dos R$ 145 bilhões deverão complementar o Bolsa Família – para completar a mensalidade de R$ 600 mais R$ 150 por criança;
- e os outros R$ 75 bilhões ficarão “livres” para as demais ações do futuro governo.
A proposta inicial de furar o teto de gastos em R$ 175 bilhões gerou reação negativa no mercado financeiro e em partidos com bancadas expressivas no Congresso. Essa reação levou Alexandre Silveira a propor uma elevação menor do limite de despesas.
Nova âncora fiscal
Segundo o projeto, o teto de gastos deverá ser substituído por outra âncora fiscal. A PEC fixa prazo de oito meses, até agosto de 2023, para o avanço desse debate.
Até o fim desse prazo, o Presidente da República deverá encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei complementar “com objetivo de instituir regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do país e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico”.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) diz que o governo não pode criar despesa ou expandir políticas públicas sem antes apontar uma fonte de financiamento para bancar tal ação. O parecer de Silveira dispensa o governo de cumprir a regra em caso de aumento de despesas com o Bolsa Família e o Auxílio Gás.
A necessidade de mais recursos para o Bolsa Família existe pois o presidente Jair Bolsonaro reservou apenas R$ 105 bilhões para o programa em 2023, o que garante uma parcela de R$ 405 mensais. Para completar os R$ 600 e conceder R$ 150 por criança, são necessários mais R$ 70 bilhões.
O impacto anual da PEC é de R$ 168,9 bilhões por ano, pois o texto permite ainda o uso de R$ 23 bilhões em investimentos já neste ano. Esse acréscimo é a única parte que ficará fora do teto, diferentemente dos R$ 145 bilhões.
O valor extra também poderá ser destinado à liberação de R$ 7,7 bilhões em emendas de relator ainda este ano, chamadas de orçamento secreto pela falta de transparência e critérios na distribuição dos recursos entre os parlamentares. O montante está hoje bloqueado justamente para cumprimento do teto.
O desbloqueio é uma demanda do Centrão para aprovar a PEC. Desta forma, deputados e senadores conseguirão cumprir promessas de campanha destravando obras, por exemplo, em seus redutos eleitorais.
Outros pontos
Além de tudo isso, a PEC também retira das limitações do teto de gastos:
- os investimentos financiados através de parcerias internacionais;
- as doações para projetos socioambientais e relacionados às mudanças climáticas;
- as doações recebidas por universidades federais, e
- a transferência de recursos dos estados para União executar obras e serviços de engenharia.
A proposta também prorroga até 2024 uma legislação que já existe para auxiliar o governo a cumprir as contas públicas porque desvincula (libera) 30% do que é arrecadado com contribuições sociais para cobrir outras despesas, sem prejuízo da Previdência.
O texto ainda garante, até 2026, o limite de pagamento anual dos precatórios – dívidas da União reconhecidas pela justiça em decisões das quais não cabem mais recursos.
Fonte: G1