A rede social X, do empresário Elon Musk, acusou o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de ameaçar de prisão seus funcionários, e por isso anunciou o fechamento do escritório no Brasil.
O anúncio foi feito no sábado (17) pela própria rede X, antigo Twitter. A empresa afirma na postagem que vai encerrar suas operações no país, em decorrência da ação do ministro, mas que a rede social continuará disponível para os brasileiros.
Em 2023, uma disputa semelhante quase levou à retirada do ar do aplicativo de mensagens Telegram. O aplicativo era investigado no inquérito das fake news e não tinha representação legal no Brasil. Moraes então determinou que a empresa indicasse representação legal no país em até 24 horas, sob pena de ser retirado do ar.
No caso do X, Musk encabeçou uma ofensiva pública contra Moraes em abril. O caso teve início com a divulgação do “Twitter Files Brazil”, conteúdo que reuniu e-mails trocados por funcionários da rede entre 2020 e 2022 reclamando de decisões da Justiça brasileira no âmbito de investigações sobre a propagação de notícias falsas e ataques ao sistema eleitoral.
Musk passou a fazer críticas a Moraes no X, o acusou de ordenar censura e ameaçou descumprir decisões judiciais.
Entenda a disputa em 5 pontos:
1) Musk
A primeira manifestação de Musk a reverberar foi uma publicação, no dia 6 de abril, em post do ministro Alexandre de Moraes em que o empresário questionou o porquê de “tanta censura no Brasil”.
A interação já repercutia nas bases bolsonaristas, quando Musk escreveu mensagem que indicava que iria descumprir ordens judiciais brasileiras, menos de uma hora depois de um perfil institucional do X postar que bloqueou “determinadas contas populares no Brasil” devido a decisões judiciais.
Musk disse que estava “levantando todas as restrições” e que “princípios importam mais que o lucro”. Adicionou ainda que como resultado disso provavelmente teria que fechar o escritório no Brasil.
Apesar de o post da empresa não citar de onde seriam as decisões, Musk repostou a publicação com a mensagem: “Por que você está fazendo isso @alexandre”. No dia seguinte, Musk afirmou que Moraes deveria renunciar ou sofrer impeachment e disse ainda que em breve publicaria tudo o que é exigido pelo ministro e “como essas solicitações violam a legislação brasileira”.
2) Inquérito
Após as falas de Musk, Moraes determinou a inclusão do empresário como investigado no inquérito que apura a existência de milícias digitais antidemocráticas e seu financiamento. Investigações neste inquérito abarcam desde a trama golpista após vitória de Lula (PT) nas eleições de 2022, a venda de joias presenteadas por autoridades a Jair Bolsonaro (PL) e o caso da falsificação de cartão de vacina.
Moraes decidiu na ocasião ainda que o X deveria obedecer qualquer ordem judicial já proferida pelo STF ou pelo TSE e também proibiu a rede de realizar qualquer reativação de perfil cujo bloqueio foi determinado pelo STF, sob pena de multa diária de R$ 100 mil por perfil.
Além da inclusão na investigação já em curso, o ministro também determinou a instauração de um inquérito para apurar as condutas de Musk em relação aos crimes de obstrução à Justiça.
Em manifestação no processo, a rede afirmou que contas bloqueadas só foram restabelecidas quando houve ordem expressa neste sentido. A Polícia Federal, por sua vez, disse que o X autorizou transmissões ao vivo desses perfis.
3) Twitter Files
O jornalista e ativista Michael Shellenberger fez um post no X com uma série de críticas a Moraes e à atuação do Judiciário brasileiro, sob o título “Twitter Files – Brazil” (Arquivos do Twitter, em português). Ele insere nos posts o que seriam e-mails de funcionários do Twitter relatando demandas de autoridades brasileiras, entre elas o TSE.
Em 2023, Shellenberger organizou um manifesto em defesa da liberdade de expressão e contra o que foi classificado como censura que vem sendo praticada pelo mundo e citou como exemplo no texto a “criminalização do discurso político” pelo STF, como mostrou a Folha.
O nome “Twitter Files” começou a ser usado no final de 2022 para se referir a revelações sobre a atuação da empresa nos Estados Unidos a partir de um conjunto de documentos internos da rede e que tratavam de anos anteriores à gestão Musk.
4) Reações de direita e esquerda
Em abril, os primeiros episódios relacionados a Musk serviram para inflamar a base bolsonarista nas redes sociais. Em live, o ex-presidente Bolsonaro disse que Musk assumiu a briga pela liberdade no Brasil e se tornou um símbolo dessa luta. “A nossa liberdade, em grande parte, está nas mãos dele”, disse.
Ainda, após a primeira mensagem de Musk questionando Moraes, Eduardo Bolsonaro respondeu ao empresário no próprio perfil do magistrado dizendo que estava preparando um requerimento para promover uma audiência na Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados sobre o “Twitter Files Brasil e censura”, com a participação de um representante do X. Outros parlamentares se manifestaram, como a deputada federal Bia Kicis (PL-DF).
Já parlamentares de esquerda e membros do governo Lula (PT) criticaram a postura de Musk e utilizam o episódio para defender que haja regulação das redes sociais. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação, Paulo Pimenta (PT), por exemplo, disse que o Brasil “não é a selva da impunidade e nossa soberania não será tutelada pelo poder das plataformas de internet e do modelo de negócio das big techs”.
Ainda, houve movimento de integrantes da esquerda brasileira para aderir à rede social BlueSky, rival do X. Lula foi um dos que se cadastraram na plataforma.
5) Fechamento do X no Brasil
Já no sábado (17), a rede social acusou Moraes de ameaçar de prisão seus funcionários e por isso anunciou o fechamento do escritório no Brasil.
O anúncio foi feito pela própria rede X. A empresa afirma na postagem que vai encerrar suas operações no país, em decorrência da ação do ministro, mas que a rede social continuará disponível para os brasileiros.
Nesta semana, Moraes decidiu aumentar a multa e indicou possível responsabilização do X pelo crime de desobediência.
No dia 8 de agosto, ele havia determinado que a plataforma bloqueasse sete contas na rede social, incluindo a do senador Marcos do Val (Podemos-ES). O X, porém, não cumpriu a decisão judicial e já tem mais de R$ 300 mil em multas a pagar à Justiça.
Havia nos bastidores apreensão pelos impactos no curto prazo da possível configuração de crime de desobediência. O prazo para o X recorrer da decisão de Moraes termina no início da próxima semana.
Fonte: Folha de S.Paulo