O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) produziu um parecer classificando como inconstitucional o PL 1.904/2024, que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples. O parecer será encaminhado à Câmara dos Deputados.
O documento, que pede o arquivamento da proposta, foi elaborado por uma comissão de seis conselheiras federais da OAB, e aprovado em votação feita entre 81 conselheiros federais na segunda-feira (17). Define o projeto como “gravíssima violação aos direitos humanos de mulheres e meninas” e diz que seu texto viola “preceitos preconizados pela Constituição da República de 1988 e pelos Tratados e Convenções internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Estado brasileiro”.
Juristas pró-vida consultados pela Gazeta do Povo classificam o parecer como ideologicamente enviesado, pouco técnico e enganoso em relação às informações sobre os tratados que menciona.
Denise Albano, professora de Direito Penal, Teoria do Direito e Direitos Humanos da Universidade Federal de Sergipe (UFS), considera os argumentos vazios, escapistas e desconexos. “A impressão é a de que esse parecer é apenas uma peça de apologia ao aborto, sem sequer tratar especificamente do que dispõe o PL 1.904”, afirma. Para ela, os argumentos são “rasos e truncados” e “recorrem a técnicas de argumentação por absurdo ou exceção”. “Apoiam-se num dos casos prováveis de gravidez de criança decorrente de estupro ao tempo em que ocultam por completo a outra criança em estágio fetal, que está sendo gestada”, acrescenta.
Leslei Lester dos Anjos Magalhães, advogado da União e mestre em Direito Constitucional, ressalta que “o parecer não tratou dos direitos do principal interessado: o nascituro, que será assassinado sem ter cometido nenhum crime”. “Resolver a questão matando as crianças não me parece ser a melhor solução para as crianças e as mulheres, nem mesmo a solução prevista na Constituição, nos tratados internacionais, nas leis do país e na ética médica”, observa.
Magalhães também recorda estudos recentes comprovando que o aborto “causa maiores sequelas à saúde da mulher, tanto física como mental, do que manter a gravidez, e mesmo em face das consequências do estupro”. O fato já foi mencionado em reportagem de 2021 da Gazeta do Povo.
Os juristas destacam o contrassenso de matar uma criança que já é viável fora do útero e poderia ser entregue à adoção. “Com 22 semanas de gravidez, as crianças em estágio fetal já têm condições de viver fora do útero, não sendo razoável matá-las para depois retirá-las do seio da mulher. O mais lógico e humano seria antecipar o parto e fazer o procedimento da adoção sem o sacrifício de uma criança inocente”, afirma Magalhães.
Denise Albano aprova a lógica por trás do PL 1.904 equiparando o aborto depois de 22 semanas de gestação ao homicídio. “Se a ciência registra que, a partir da 22ª semana, o feto já é presumidamente viável, ou seja, com suporte pode viver fora do ventre materno, matá-lo deveria, por analogia e até paralelismo, ter a mesma punição aplicada ao homicídio, cuja descrição no artigo 121 do Código Penal é ‘matar alguém'”, observa.
A informação de que o projeto em tramitação na Câmara viola tratados internacionais de direitos humanos, de acordo com os juristas, é outro equívoco do parecer. “(O texto) Não mencionou o Pacto de São José da Costa Rica, que estabelece que todos os seres humanos são pessoas e devem ter proteção legal desde a concepção. Não mencionou a Convenção dos Direitos das Crianças, que confere à criança o direito inerente à vida”, lembra Magalhães.
Para Denise, é importante desbancar a ideia de que o parecer do Conselho Federal da OAB represente a visão dos advogados do Brasil. “Bem sabemos como sua inação (da OAB) na defesa das prerrogativas dos réus do 8 de janeiro e seu ativismo militante na defesa do aborto, neste último caso, têm desagradado milhares de advogados pelo Brasil. Há uma crise de representatividade e credibilidade da OAB que tem levado a iniciativas como a criação de associações de advogados e até a uma forte mobilização pela eleição direta dos diretores e conselheiros da OAB nacional”, comenta.
Fonte: Gazeta do Povo