ARACAJU/SE, 10 de outubro de 2025 , 17:59:43

Quem é Dina Boluarte e por que ela foi destituída da Presidência do Peru?

 

Quando Dina Boluarte tomou posse como presidente do Peru em dezembro de 2022, ela fez história ao se tornar a primeira mulher a ocupar o cargo, prometendo acabar com a corrupção e restaurar a estabilidade de um país em crise.

No entanto, seu mandato, marcado pela repressão aos protestos que exigiam o fim da corrupção e da violência, terminou logo após o Congresso aprovar uma moção para destituí-la do cargo na quinta-feira (9) por “incapacidade moral permanente” para enfrentar o crime organizado no país.

Quase três anos após assumir o poder após a queda de Pedro Castillo, Boluarte deixa o cargo com diversas investigações judiciais, com a desaprovação pública chegando a 93%, segundo uma pesquisa recente da Datum Internacional, e um país desgastado pela corrupção, uma crise de violência e desconfiança generalizada em suas instituições.

A saída marca mais um episódio de instabilidade no Peru, país que teve seis presidentes em apenas sete anos.

O caminho até o Palácio do Governo

Dina Ercilia Boluarte Zegarra nasceu em Chalhuanca, cidade localizada em uma região predominantemente indígena no centro-sul do Peru, onde o quéchua é uma língua comum.

Suas origens rurais, que ela mesma enfatizou como parte de sua identidade política, permitiram que ela se conectasse com eleitores indígenas anos depois, durante sua campanha à vice-presidência ao lado de Pedro Castillo.

Antes de ingressar na política, Boluarte trabalhou como advogada e servidora pública. Trabalhou durante anos no Registro Nacional de Identificação e Estado Civil (RENIEC) em Surco, primeiro como assessora da alta administração e, posteriormente, como chefe do escritório local.

Em 2018, concorreu à prefeitura de Surquillo pelo partido marxista-leninista Peru Libre. Seu curso mudaria em 2021, quando foi eleita vice-presidente na chapa de Pedro Castillo, um professor também da zona rural do país, sem experiência política, que canalizava o descontentamento dos setores populares.

Boluarte assumiu a presidência após Castillo tentar dissolver o Congresso em um ato considerado inconstitucional em dezembro de 2022.

Ao assumir o cargo, teve que travar batalhas em duas frentes: apaziguar os legisladores que haviam deposto seu antecessor e acalmar os manifestantes indignados com a queda de mais um presidente.

Boluarte governou um país marcado pela instabilidade: em apenas sete anos, o Peru teve seis presidentes. Sua tentativa de caminhar em direção a um clima de normalidade incluiu o anúncio de eleições gerais para abril de 2026, com a promessa de que seu governo permaneceria “neutro e imparcial”.

Onda de protestos, crise de segurança e escândalos de corrupção marcaram o mandato

A percepção de inação diante do crime organizado e da violência, somada à promulgação de leis polêmicas no Congresso, motivou uma onda de protestos sem precedentes durante seu mandato.

A cidade de Juliaca, testemunhou um dos dias mais trágicos do início de 2023: 17 civis morreram em um único dia durante um protesto. As autópsias dos 17 civis mortos revelaram ferimentos causados ​​por armas de fogo, disse o legista-chefe da cidade à CNN em espanhol.

Organizações de direitos humanos acusaram Boluarte de usar a violência do Estado para reprimir os protestos. O Ministério Público peruano abriu uma investigação contra a presidente e outros ministros importantes pelos supostos crimes de “genocídio, homicídio qualificado e lesões graves” em conexão com a repressão.

Apesar da gravidade das acusações, Boluarte permaneceu firme: “Não vou renunciar. Meu compromisso é com o Peru, não com esse pequeno grupo que está fazendo o país sangrar”, declarou em um discurso televisionado.

Ela chegou a chamar os manifestantes de “terroristas” e sugerir, sem provas, que forças estrangeiras, incluindo ativistas bolivianos, haviam trazido armas para o país.

A crise de segurança levou seu governo a declarar estado de emergência em Lima e Callao. A declaração ocorreu após o assassinato de um renomado músico de cumbia em 16 de março, o que desencadeou protestos e levou o Congresso peruano a censurar o ministro do Interior, Juan José Santivañez, por sua gestão da onda de insegurança.

Um dia antes de a oposição no Congresso aprovar a moção para destituir Boluarte do cargo, quatro membros da famosa banda de cumbia peruana Agua Marina foram feridos a tiros durante um show em um quartel-general militar em Lima.

A PNP (Polícia Nacional do Peru) confirmou que membros deste grupo, um dos mais populares do país, foram atacados com armas de fogo durante a apresentação.

O epicentro da indignação concentrou-se no centro de Lima, onde milhares de cidadãos, especialmente jovens da chamada “Geração Z”, saíram às ruas para exigir um país mais seguro.

Os protestos uniram diferentes setores do país: comerciantes, escolas, artistas, grupos musicais e, principalmente, motoristas, cobradores e passageiros do transporte público também se manifestaram, pois enfrentam ataques diários de assassinos de aluguel caso não paguem as tarifas exigidas por gangues criminosas.

O cansaço dos peruanos com casos como a investigação de suposto enriquecimento ilícito — incluindo o escândalo envolvendo seus relógios de luxo como supostas propinas, o que ela nega veementemente — e o suposto uso indevido de veículos oficiais para favorecer aliados políticos também geraram descontentamento.

Analistas apontam que Boluarte cometeu o erro de se distanciar de sua base eleitoral rural após assumir o cargo como a primeira mulher presidente do país.

“É preciso entender as próprias ambições de Boluarte; ela estava claramente disposta a sacrificar suas ideias e princípios de esquerda para formar uma coalizão com a direita e permanecer no poder”, disse Jo-Marie Burt, pesquisadora sênior do Escritório de Washington para a América Latina e especialista em Peru, à CNN em espanhol.

“E a usar a força contra as mesmas pessoas que votaram na chapa Castillo-Boluarte.”

Fonte: CNN Brasil

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