ARACAJU/SE, 23 de outubro de 2024 , 21:30:35

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Senado ideologicamente à direita, a partir de 2027, pode gerar embate inédito com o STF

 

Em paralelo à disputa presidencial, a oposição está atenta à eleição de 2026, que renovará dois terços do Senado. Dependendo do resultado das urnas para essas 54 cadeiras, a Câmara Alta pode adquirir um perfil majoritariamente conservador a partir de fevereiro de 2027, quando os eleitos tomarem posse.

Um estudo da oposição indica que, se as tendências da eleição de 2022 se repetirem, é possível que seus atuais representantes consigam essa maioria. Na última eleição, um terço dos mandatos foi submetido ao voto popular, e a maioria desses senadores atualmente vota com os oposicionistas. Se a onda conservadora se mantiver, o pleito de 2026 poderá resultar em um Senado com uma nova inclinação ideológica.

Um arranjo inédito desde a redemocratização pode influenciar decisivamente a escolha do presidente do Senado pelo novo conjunto dos 81 senadores. Caso um nome de direita seja escolhido, o impacto de sua vitória será histórico, representando uma mudança significativa nas relações entre os poderes, especialmente entre o Judiciário e o Legislativo.

Como o único colegiado capaz de exercer o controle externo do Supremo Tribunal Federal (STF), um Senado com nova composição ideológica pode romper com um tabu de 200 anos ao abrir, pela primeira vez, um processo de impeachment contra ministros da Suprema Corte. Apesar da pressão da sociedade e de membros da oposição para discutir medidas para frear o crescente ativismo judicial, essas iniciativas permanecem engavetadas pelos presidentes do Senado, sem qualquer possibilidade de discussão.

Segundo analistas e políticos, o novo rumo no Senado pode ocorrer devido à expectativa de que os placares de votação se invertam no próximo mandato presidencial. Atualmente, o Senado inclina-se a favor do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 51 senadores apoiando suas orientações contra até 30 oposicionistas ou de direita. No entanto, essa dinâmica pode mudar, independentemente de quem seja o chefe do Executivo na época.

De acordo com um levantamento do deputado Mauricio Marcon (Podemos-RS), publicado no portal Placarcongresso.com, dos 27 senadores titulares ou suplentes que manterão seus mandatos até fevereiro de 2031, ao menos 18 mostram maior aderência à orientação da oposição ou possuem uma posição centrista, favorável ao governo de plantão.

Considerando a expectativa de que a próxima eleição para o Senado siga a tendência de 2022, ao menos 27 dos 54 senadores eleitos ou reeleitos devem ter um perfil conservador. Junto com os remanescentes, isso garantiria uma maioria confortável para a direita, entre 50 e 55 votos.

Segundo Marcon, embora a eleição presidencial seja frequentemente vista como a mais importante, o controle da pauta do Senado tem um peso excepcional no atual contexto.

“Dependendo da época, a eleição mais importante é a de presidente do Senado”, resumiu. Ele atribui as crises institucionais à postura passiva do atual presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e destacou que o “descompasso completo entre STF e Legislativo” tornou a escolha do comando do Senado fundamental.

O deputado acredita na eleição de uma maioria conservadora para o Senado em 2026, composta por cerca de 50 senadores dessa orientação. Na opinião dele, essa mudança pode levar a uma ruptura significativa nos procedimentos atuais, incluindo a possibilidade de afastamento de ministros do STF, algo jamais realizado.

“Com 50 senadores conservadores, vai ocorrer impeachment. A pauta em 2026 na campanha ao Senado será essa”, prevê, mencionando rumores que confirmam o receio de magistrados com essa possibilidade.

Ministros do STF sinalizam preocupação

Nos bastidores das relações entre os poderes, já se verificam sinais de empolgação entre os oposicionistas e de apreensão entre o Judiciário e os governistas, com a possibilidade de o Senado mudar seu perfil dominante. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, sinalizou a deputados da base aliada do governo que receia o avanço conservador no Senado em 2026. Durante uma visita surpresa ao Congresso em 18 de abril, o juiz comentou sobre a estratégia do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, focada na conquista da maior bancada na próxima eleição geral, visando também ao comando da Casa legislativa em 2027.

Esse movimento está no radar do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), favorito para a sucessão de Rodrigo Pacheco em 2025. Alcolumbre, que tem mandato até 2031, manifestou ao Palácio do Planalto sua preocupação com uma onda direitista no Senado. Ele destacou o esforço do PL para reunir três importantes nomes da legenda e do clã Bolsonaro na próxima legislatura: a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (DF), o deputado Eduardo Bolsonaro (SP) e o atual senador Flávio Bolsonaro (RJ), que ocupa uma cadeira desde 2019 e terá de tentar uma nova eleição em 2026.

Em um evento realizado na semana passada em Campos do Jordão (SP), o presidente do PL declarou que o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro, será o senador “mais votado” do país em 2026. O anúncio da pré-candidatura de Eduardo a uma das duas vagas para representar o maior colégio eleitoral do país foi acompanhado de elogios. “Não tem ninguém que trabalhe mais no partido, não tem um político no Brasil que se dedique à causa como Eduardo Bolsonaro, nunca vi isso na minha vida”, afirmou o presidente do PL. Eduardo está em seu terceiro mandato consecutivo na Câmara e, em 2018, se tornou o deputado mais votado da história, com mais de 1,8 milhão de votos.

Michelle Bolsonaro, antes cotada para disputar uma vaga que poderia ser aberta por uma eventual cassação do senador Sergio Moro (União Brasil-PR), pode se lançar candidata ao Senado pelo Distrito Federal, seu domicílio eleitoral. A presidente do PL Mulher também figura entre os nomes citados para a corrida ao Palácio do Planalto. Caso concorra ao Senado, é possível que ela forme uma aliança com o governador Ibaneis Rocha (MDB), com o apoio da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), sua amiga.

A expectativa é que outros nomes de peso alinhados à direita também disputem uma vaga de senador em 2026. Entre eles estão os governadores Cláudio Castro (RJ), Romeu Zema (MG) e Ratinho Júnior (PR). Entre os deputados, há a possibilidade de candidaturas do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e de Marcel van Hattem (Novo-RS).

Perspectiva conservadora afeta estratégia de Alcolumbre para comandar o Senado

Na política, há um ditado que diz que, além do exercício do poder, é igualmente importante ter a perspectiva de poder, antecipando cenários futuros. Um sinal claro de que a onda conservadora se aproxima no Senado pode ser visto nos acenos de Davi Alcolumbre, virtual sucessor de Rodrigo Pacheco, à oposição, visando não apenas a eleição para a Mesa Diretora em fevereiro, mas também o período subsequente.

Outro indício dessa reorientação está na desenvoltura com que o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, circula entre os senadores, apostando na formação da maior bancada partidária após a próxima eleição geral. Na última quarta-feira (12), Costa Neto confirmou o apoio do PL à volta de Alcolumbre à Presidência do Senado e ressaltou que não quer repetir a situação de isolamento sofrida após a derrota de Rogério Marinho (PL-RN) para Pacheco em 2023. Apesar disso, o atual presidente do Senado precisou insinuar uma reação ao ativismo judicial em seu discurso no dia de sua reeleição, temendo uma virada de Marinho.

Por outro lado, os partidos de esquerda vêm perdendo espaço nas pautas do Congresso e têm menos força nas negociações com seus presidentes, conforme admitiu o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), ao lavar as mãos para o perfil conservador da Câmara.

Em 2022, das 27 cadeiras em disputa, foram eleitos 22 novos senadores e cinco foram reeleitos. Entre os eleitos, seis eram ex-ministros de Jair Bolsonaro (PL): Sergio Moro (União-PR), Damares Alves (Republicanos-DF), Tereza Cristina (PP-TO), Marcos Pontes (PL-SP), Rogério Marinho (PL-RN) e Jorge Seif (PL-SC), além do ex-vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS).

Outros senadores eleitos, alinhados à direita e centro-direita, foram Dorinha Rezende (União Brasil-TO), Laércio Oliveira (PP-SE), Efraim Filho (União Brasil-PB), Dr. Hiran (PP-RR), Cleitinho (Republicanos-MG) e Alan Rick (União Brasil-AC). O PL também elegeu Magno Malta (ES), Wilder Morais (GO), Jaime Bagattoli (RO) e Romário (RJ).

Especialistas veem novo perfil do Senado e impeachment de ministros do STF

Para o professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB) Antônio Flávio Testa, a tese de avanço da direita no Senado faz sentido. No entanto, ele acredita que os conservadores precisariam garantir uma margem de segurança maior, indo além da maioria simples de 41 votos.

“Penso que os conservadores precisam chegar ao total de 55 para influenciar de verdade. Isso porque os estados do Norte e Nordeste tendem a ficar com os populistas de esquerda e podem eleger vários governadores e, por tabela, vários senadores”, observou.

Para Antônio Flávio Testa, a crise atual em torno do governo Lula pode trazer surpresas nas eleições, e ele vê como inevitável o aprofundamento dessa situação. “Vários assuntos tabus, como impeachment de ministros do STF, podem entrar na pauta em 2027. Mas, para isso ocorrer, essa nova maioria tem que estar imunizada contra as pressões dos governadores e das ameaças do Judiciário. De qualquer forma, se isso ocorrer, será uma boa experiência para a política brasileira”, concluiu.

O consultor eleitoral e cientista político Paulo Kramer também considera “verossímil” a tendência de avanço conservador no Senado e os efeitos práticos dessa mudança. “A direita parlamentar já percebeu que a sua prioridade é esta: criar condições políticas que permitam o impeachment de ministros do STF, pois, se tudo permanecer como está hoje, nenhum outro ganho é seguro, ameaçado por canetadas de juiz, capazes de anular qualquer maioria no Congresso”, disse Kramer.

Em sua opinião, a medida extrema de afastar um ou mais ministros da Suprema Corte pode ser a forma para dar igual tamanho a cada poder da República. “O efeito dissuasório da possibilidade de maioria de senadores vir a fazê-lo pode levar ministros do STF a recuarem ao seu quadrado, do qual têm exorbitado há tempos, completou.

Fonte: Conexão Política

 

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