Associações de integrantes dos Tribunais de Contas lançaram uma nota conjunta nesta segunda-feira (21) expressando “repúdio” contra as declarações feitas pelo ministro Augusto Nardes, do TCU (Tribunal de Contas da União), de que estaria havendo um “movimento muito forte nas casernas” brasileiras.
O documento é assinado pela Atricon (Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil) – entidade que fala pelos ministros do TCU e pelos conselheiros dos Tribunais de Conta estaduais–, pelo CNPTC (Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas) e pelo IRB (Instituto Rui Barbosa).
As associações classificaram o áudio de Nardes como um “sério agravo à legitimidade democrática e ao ordenamento jurídico, em contexto também incompatível com a atuação da magistratura de Contas, que deve fidelidade absoluta às normas de regência”.
“Ao mesmo tempo, as entidades ressaltam a atuação do Tribunal de Contas da União, inclusive no recente processo eleitoral, marcada pela juridicidade e pelo compromisso com os princípios fundamentais da República, aspectos bem evidenciados também na participação do seu presidente em exercício, ministro Bruno Dantas, na reunião do Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas, realizada no dia 17 de novembro”, prossegue o documento.
A fala de Nardes foi enviada no WhatsApp a um grupo de pessoas ligadas ao agronegócio.
“Demoramos, mas felizmente acordamos. O que vai acontecer agora? Está acontecendo um movimento muito forte nas casernas. Eu acho que é questão de horas, dias, no máximo semana ou duas. Ou talvez menos que isso que vai acontecer um desenlace forte na nação. Imprevisíveis. Portanto, a fala desse cidadão é para despertar o produtor rural também porque não adianta só caminhoneiro trabalhar”, disse Nardes.
Nardes também afirma no áudio que falou com a equipe do presidente Jair Bolsonaro (PL) e que ele não está bem por causa de um ferimento na perna. Entretanto, afirma que ele tem esperança de recuperar e melhorar sua situação física e que o presidente “certamente terá condições de enfrentar o que vai acontecer no país”.
No final do áudio, Nardes diz que fez sua parte em 2014, quando era presidente do TCU, e que alertou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) sobre “o que ia acontecer no país”. No ano seguinte, Nardes foi relator das contas da então presidente da República e apresentou um relatório pela rejeição, que causou o impeachment da ex-presidente.
“Eles nunca aceitaram o diálogo, eles foram pro confronto e agora é um confronto decisivo, eles vão vir para um confronto que nós todos sabemos quais são as consequências, mas nós tomamos uma decisão importantíssima em 2015, quando eu tive a coragem em 130 anos pela primeira vez de tomar uma atitude de reprovar as contas porque encontramos 340 bilhões em 2015 e 2016 e tudo se mostra que vai acontecer novamente”, disse Nardes no final do áudio.
Em nota enviada ao Poder360, o ministro afirmou que lamenta profundamente a interpretação dada sobre um áudio “despretensioso gravado apressadamente e dirigido a um grupo de amigos”. Também reforçou que “repudia peremptoriamente manifestações de natureza antidemocrática e golpistas, e reitera sua defesa da legalidade e das Instituições republicanas”.
Eis a íntegra da nota das associações:
“Nota Pública
“A Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), o Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas (CNPTC) e o Instituto Ru Barbosa (IRB), renovando os compromissos assumidos na Carta do Rio de Janeiro, publicada no último dia 18 de novembro, durante Encontro Nacional dos órgãos de controle externo – na qual foram reafirmados o papel das Cortes de Contas na defesa da democracia e das instituições republicanas, bem como a sua relevância em prol da boa correta gestão governamental – vêm a público expressar seu repúdio quanto ao teor de recente mensagem de áudio do ministro Augusto Nardes, hoje objeto de reconsideração de sua parte.
“A anunciada retratação coloca a matéria em novos termos. Entretanto, estava-se diante de sério agravo à legitimidade democrática e ao ordenamento jurídico, em contexto também incompatível com a atuação da magistratura de Contas, que deve fidelidade absoluta às normas de regência (sobretudo a Lei Orgânica da Magistratura Nacional).
“Ao mesmo tempo, as entidades ressaltam a atuação do Tribunal de Contas da União, inclusive no recente processo eleitoral, marcada pela juridicidade e pelo compromisso com os princípios fundamentais da República, aspectos bem evidenciados também na participação do seu presidente em exercício, ministro Bruno Dantas, na reunião do Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas, realizada no dia 17 de novembro.
“A Atricon e o CNPTC reiteram que os Tribunais de Contas do Brasil atuam com independência e impessoalidade, a fim de cumprir e fazer cumprir as regras e os princípios estabelecidos na Constituição Brasileira, à luz do Estado de Direito e do regime democrático Brasília, 21 de novembro de 2022.
“Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil – Atricon. Conselho Nacional de Presidentes dos Tribunais de Contas – CNPTC. Instituto Rui Barbosa – IRB.”
Leia a íntegra da transcrição do áudio do ministro do TCU Augusto Nardes:
“Estimado Sartori, como eu sou magistrado e julgo muitas coisas do que está acontecendo no Brasil, praticamente muita coisa passa pelo Tribunal de Contas da União, somos 9 lá, e a situação é bem complexa, muito complexa, é o pior momento que a nação vai viver, mas talvez seja importante pra poder recuperar, até pelo depoimento desse caminhoneiro que mostra a visão que todo mundo está tendo não há mais…
“Os intelectuais da nação hoje você consegue escutar o que a gente vem pensando há muito tempo das pessoas mais humildes da nação e que têm uma visão do conjunto do país. Nós somos hoje sociedade conservadora que não aceita as mudanças que estão sendo impostas. Despertou, isso é muito importante. Lá nos anos 80, quando eu voltei da Europa eu tentei criar um movimento com um grupo de especialistas e um professor de direito constitucional César Saldanha Júnior que hoje já está um pouco fora de combate aí em Porto Alegre, para contrapor toda essa transformação que acabou acontecendo no Brasil.
“Criamos um instituto, enfim, fazíamos aulas pra defender a economia de mercado, capital. Mas fomos superados pela incompetência de todos nós. Caro que lutamos muito, eu tive na época conversando com Ernesto Geisel, com os líderes da época, João Figueiredo, que não tiveram uma visão que tínhamos que fazer uma transição com um parlamentarismo, e escolher um primeiro-ministro e fortalecer a economia de mercado com princípios que pudessem nortear a nação. Agora vem o Bolsonaro que despertou a sociedade conservadora e hoje todo mundo está nas ruas aí fazendo a sua defesa desses princípios.
“Demoramos, mas felizmente acordamos. O que vai acontecer agora? Está acontecendo um movimento muito forte nas casernas. Eu acho que é questão de horas, dias, no máximo semana ou duas, ou talvez menos que isso, que vai acontecer um desenlace forte na nação. Imprevisíveis. Portanto, a fala desse cidadão é pra despertar o produtor rural também porque não adianta só caminhoneiro trabalhar. Vamos perder? Sim, vamos perder alguma coisa, mas a situação para o futuro da nação poderá se desencadear de forma positiva, apesar desse principal conflito que deveremos ter nos próximos dias ou nas próximas horas.
“Falei longamente com o time do Bolsonaro essa semana, ele não está bem, está com o ferimento na perna, uma doença de pele bastante significativa, mas tem esperança ainda, né? Tenha esperança de recuperar e melhorar a sua situação física, e certamente terá condições de enfrentar o que vai acontecer no país. Se vai haver alguma mudança em relação a isso? Só que haja uma capitulação por parte de alguns integrantes importantes e dirigentes que tudo se sente que vai pra um conflito social na nação brasileira [sic].
“Eu não posso falar muito até porque tenho muitas informações, mas queria passar pra ti, Sartori, e para o teu time aí do agro que eu conheço todos os líderes e sei da importância do agro.
“Até quando lá atrás negociamos a ciclo de sessão, eu era o líder da bancada ruralista, articulei a união em 17 Estados pra colocar 20.000 pessoas em Brasília em 99. Queimamos máquinas, tratores, fizemos uma escarcéu. Fizemos até carreteira aqui pra mais de 2.000 pessoas junto com meu estimado amigo Sperotto e tantos líderes que aí acompanham junto com você, e esse time do agro Brasil. Então conheço todos os passos que temos que fazer.
“Fiz a minha parte em 2014. Eu era presidente, alertei a presidente em 2012, 2013, o que ia acontecer no país, infelizmente não conseguimos diálogo na época. Eles nunca aceitaram o diálogo, eles foram pro confronto e agora é um confronto decisivo. Eles vão vim para um confronto que nós todos sabemos quais são as consequências, mas nós tomamos uma decisão importantíssima em 2015, quando eu tive a coragem em 130 anos pela 1ª vez de tomar uma atitude de reprovar as contas porque encontramos R$ 340 bilhões em 2015 e 2016 e tudo se mostra que vai acontecer novamente.”
Fonte: Poder 360