Enfermidade ligada principalmente ao tabagismo e à exposição a poluentes, a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) afeta uma função vital: a respiração. Bloqueios nas vias aéreas fazem com que o fluxo de ar não circule de forma adequada, levando a episódios de tosse, cansaço e, em casos mais graves, comprometimento de atividades simples, como tomar banho e trocar de roupa, tirando a autonomia de quem vive com a doença. Um estudo mapeou os impactos socioeconômicos da doença no Brasil e, com base em dados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), e constatou que a DPOC custou R$ 566,7 milhões em aposentadorias precoces em dez anos.
Segundo o levantamento, com informações de 2014 a 2023, 77,5% das aposentadorias que ocorreram nesse período foram de pessoas entre 40 e 65 anos. Além de calcular o montante repassado aos beneficiários, os pesquisadores estimaram a perda de produtividade, que superou 298 mil meses. Os achados foram apresentados no 41º Congresso Brasileiro de Pneumologia e Tisiologia, realizado em outubro.
“São milhares de pessoas afetadas socioeconômica e psicologicamente, por não se sentirem úteis, comprometendo a força de trabalho nacional e sobrecarregando o sistema de seguridade social”, disse, em nota, Paulo Antônio de Morais Faleiros, médico pneumologista especialista em DPOC e perito do INSS há 18 anos. “Os achados deste estudo reforçam a necessidade de melhoria das políticas públicas associadas à prevenção, ao diagnóstico precoce e ao tratamento da DPOC, com foco especial em trabalhadores em idade produtiva, visando mitigar esse ônus crescente a toda a nossa sociedade”, completa.
O estudo utilizou o portal de dados abertos do governo federal e, em parceria com a TruEvidence, consultoria especializada em dados de mundo real, avaliou os benefícios concedidos de 2014 a 2023.
Impactos para o sistema de saúde
Embora seja apontada como a terceira principal causa de mortes no mundo, com 425 óbitos por hora, a DPOC ainda enfrenta desconhecimento e não é tratada como prioridade nas estratégias governamentais ao redor do mundo. No Brasil, estima-se que 6,3 milhões de pessoas vivam com a doença.
Um relatório da coalização Speak Up for COPD, que une indústria e instituições sem fins lucrativos, mostrou que a doença gera um custo de R$ 100 milhões por ano ao Sistema Único de Saúde (SUS) com internações e intervenções, algo que poderia ser reduzido com ações para diagnóstico precoce.
O grupo, formado por especialistas de dez países incluindo o Brasil, cita como exemplo positivo o financiamento pelo Ministério da Saúde da tele-espirometria, exame da capacidade pulmonar na atenção básica com laudo remoto para agilizar o diagnóstico.
“É um case de sucesso. O resultado do teste é enviado a um especialista respiratório para interpretação, liberando capacidade da atenção primária e garantindo melhores práticas no diagnóstico da doença”, diz, em nota, a pneumologista e coautora do relatório Angela Honda, diretora executiva e líder de programas educacionais da Fundação ProAR.
Entenda a DPOC
A DPOC tem como principal característica a redução da capacidade pulmonar relacionada à inflamação das pequenas vias aéreas, gerando um quadro de bronquiolite respiratória, que leva à destruição do tecido do órgão, o enfisema.
Os sintomas iniciais são tosse crônica, chiado no peito e falta de ar. Apesar de ter o tabagismo como principal fator de risco, a doença tem ligação com a poluição do ar e com as queimadas. O tratamento é feito com reabilitação pulmonar, corticoides e broncodilatadores.
Recentemente, tecnologias inovadoras foram desenvolvidas e aprovadas para tratar a doença. Uma delas, já liberada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é o primeiro imunobiológico para adultos que vivem com a doença e inflamação tipo 2, que representa um risco elevado para crises e comprometimento da função pulmonar.
Em outubro, o SUS incorporou duas terapias que combinam três medicamentos e são administradas com um inalador. Elas são indicadas para pessoas que sofrem com as chamadas “crises de exacerbação”, quando têm pioras súbitas e podem precisar de hospitalização. São elas: furoato de fluticasona/brometo de umeclidínio/trifenatato de vilanterol e dipropionato de beclometasona/fumarato de formoterol dihidratado/brometo de glicopirrônio.
“Estima-se que mais de 15% da população acima dos 40 anos no Brasil sofra de algum grau de DPOC, sendo as regiões Centro-Oeste (25%), Sudeste (23%) e Sul (21%) as que apresentam maior incidência da doença”, explicou a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) em comunicado.
Em tempos em que jovens flertam com o tabagismo e o ar é castigado por agressivas queimadas, a DPOC deve ser foco de ações individuais e políticas públicas para evitar suas graves consequências.
Fonte: VEJA