ARACAJU/SE, 5 de fevereiro de 2025 , 8:42:13

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Albinos que passaram

Eles  passavam pela calçada do oitão lá de casa. Vinham de algum sítio ali perto em direção à feira. Dois ou três, talvez só dois. Chapéu rústico de palha na cabeça, semelhando um boneco, as pestanas brancas, dando a impressão que tapavam os olhos, o rosto imensamente branco, a camisa sempre de manga comprida. Eram albinos os branquidões sisudos que não olhavam para ninguém. A gente não sabia que eram albinos, pensando apenas ser pessoas brancas demais, brancura que apresentava alguma coisa de estranha. Estavam sempre silenciosos, sem olhar para ninguém, religiosamente em dia de feira, coincidindo, muitas vezes, eu me encontrar na calçada e vê-los passar. Evidentemente que chamavam a atenção no silencioso e cadenciado passo. Nunca os vi conversando. Nem nunca se dignaram me lançar um mero e furtivo olhar. Verdadeiras estátuas, portanto. Não me lembro de ter presenciado o retorno.

Apesar de não saber que eram albinos, a alvura estampada evidenciada, até para os meus olhos de menino, o drama que era viver numa terra de muito sol, sobretudo quando demonstravam serem moradores de sítio, e, nessa condição, acostumados ao contato e trabalho com a terra desde cedo, enxada na mão, o sol causticante do dia a dia, para quem, como eles, deveriam ter algum problema na pele, e, igualmente, nos olhos, ficando claro nunca ter enxergado deles os olhos, o que, mais e mais, os tornavam totalmente diferentes de todas as pessoas que trafegavam pelo oitão de minha casa, caminho da feira, eles, moradores das bandas do Açude Velho e adjacências, e, evidentemente, em propriedade rural na roupagem de agricultores.

Viviam isolados, voltados para si mesmo, estranhos em sua própria terra, marcados pela condição de albinos, sujeitos a câncer de pele e de morte prematura, como leio hoje no Google, o receio de reproduzirem novos albinos, ou talvez, de tão eremíticos que não conseguissem despertar em alienígena sentimento que levasse ao casamento. Tristes albinos, pelo menos aqueles aos quais me referi. O que ocorreu com todos eles, não sei responder. Um dia de feira, que não sei qual foi, deixei de frequentar o oitão lá de casa, pela manhã. Não é nem um problema da memória não ter conservado o fato. É que não havia mais o fato. E, então, a história dos albinos aqui termina.