Na banca de verduras/frutas, sou chamado de Coroa. E olhe que estou de chapéu, a escassa cabeleireira, ou o que dela ainda restou, devidamente encoberta. Na de manteiga/queijo, é Coroinha, e eu fico pensando se tenho cara de coroinha, ou seja, da meninada que, de vestes brancas, – no meu tempo de menino, era a roupa normal – auxilia o sacerdote durante a missa. Coroinha nunca fui, nem me bateu no coração a vontade. De padre, vá lá. A batina preta me atraia. Depois me desperto para o fato de coroinha ser apenas um diminutivo de coroa. No fundo, o que os termos Coroa e Coroinha refletem é a minha idade. Educadamente, como se passasse pomada na mão para suavizar a dor que a palmatória provoca, espremo de tudo a referência a idade, como a dizer que estou velho. Está na cara. Estou mesmo. Peruca e plástica não me atraem.
Mas não tanto assim como vi, em dias atrás, em um restaurante, colega dos tempos do curso ginasial, A princípio, tive dúvidas se era ela mesmo. O rosto, engelhado, inúmeras pregas que ali faziam morada sem a menor cerimônia e sem esconder atrás de uma maquiagem, dominando todo o território, o nariz a emitir sinais de que ia se despregar em cinco ou seis pedaços, se ousasse espirrar, as pelancas quebrando a carne dos braços, nada, absolutamente nada, de quem, a menos de seis anos, em supermercado, exibia feição ainda dos tempos ginasianos, embora envelhecida, naturalmente. Agora, não. Não diria que era um cadáver que resolveu sair da sepultura. Apenas que abanou meu espanto. Sorte minha que não nos defrontamos de frente. Não sei se seria capaz de esconder o estado de perplexidade que me dominava. Teria de ser bem artista, o que não sou.
Respiro aliviado. Ainda não cheguei por lá. Em geral me sinto em permanente estado de alerta, pulando da cama a qualquer barulho que ouço, a mão procurando um revólver que não tenho. Para completar visitei o compadre, amigo de mais de meio século, que da cirurgia, brotou complicação. Dele ouço que qualquer vento balança o coreto, meu e dele, a anunciar que a morte manda lembrança, a carcaça de mais de setenta anos abrindo fendas onde a desgraça aparece. Na saída, fito o céu azul, sem nuvens, o vento embalando as palhas dos coqueiros, dirijo com cuidado, rezando para o meu anjo de guarda me proteger. Nessas horas, costumo me benzer.
Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras