O rádio era alimentado pela antena, ou seja, um fio, que dele saía, ou nele era preso, subia pela parede, passava por alguma brecha no meio das telhas, e, no telhado, ia de ponta a ponta, mantido por dois paus. Sem a antena, o rádio deixava de ter voz. Antecipe-se que, pelo dia, só se pegava as rádios do Aracaju – Liberdade e Cultura, bem; Difusora, mais ou menos, a Jornal, com dificuldade. À noite, as rádios cariocas davam às caras, mamãe ouvia a Rádio Nacional a noite inteira, enquanto, na máquina, costurava. Ao pé do rádio, uma cadeira. Caçula de Zezé Aleijado toda noite lá se arranchava. Ouvia e conversava. Mamãe não largava suas costuras.
Foi nesse ambiente que chegou o rádio movido a pilhas, o radinho de pilha, que podia ser ouvido nas ruas, ou seja, ser levado para qualquer lugar. Coincide com a eleição estadual de 1962, encontrando em Seixas Dorea o maior divulgador, à medida em que aconselhava o eleitor a adquirir um aparelho desse para acompanhar a sua campanha, levando em conta que os comícios eram transmitidos. Luciano Siqueira levou um para o Ginásio a fim de ouvir o jogo do Brasil com a Espanha, Copa de 1962. Na saída, a tarde já escurecendo o céu, o rádio dando notícias do placar. Eu estava perto, o resultado favorecendo o Brasil.
Nesse tempo, nenhum rádio de pilha entrou lá em casa. Continuamos fiel ao RCA Victor, com antena, chiado e tudo. Só no curso clássico, já no Aracaju, ganhei um tio de Eladio, que quebrava o silêncio do meu quarto ouvindo o som das rádios aracajuanas, e, nesses momentos, muitos programas e algumas músicas, que, hoje, ao escutá-las, me fazem o tempo recuar.
Depois, o rádio de pilha ganhou a gracioso apelido de consola corno. Desconheço a motivação. Há muito que não lhe ouço nenhuma referência. Talvez tenha caído em desuso, fruto da propagação da televisão. Talvez. Planto a dúvida. Continua sendo fabricado e vendido, principalmente, nas feiras livres, modelos de todos os tipos que até dificulta a escolha. Incontroverso que o corno não deixou de existir, nem todo homem que possui rádio é corno, como nem todo corno tem rádio. Uma coisa nada tem a haver com a outra. Por certo, me embaralhei, e ai o apelido entrou no texto como Pilatos no Pai Nosso. Agora é tarde. Escuso-me.