Em 2021, foi promulgada a emenda constitucional nº 111, que alterou a Constituição Federal para, dentre outros assuntos, disciplinar a realização de consultas populares concomitantes às eleições municipais.
Assim, foram acrescentados ao art. 14 da Constituição os parágrafos 12º e 13º, com o seguinte conteúdo:
“§ 12. Serão realizadas concomitantemente às eleições municipais as consultas populares sobre questões locais aprovadas pelas Câmaras Municipais e encaminhadas à Justiça Eleitoral até 90 (noventa) dias antes da data das eleições, observados os limites operacionais relativos ao número de quesitos.
- 13. As manifestações favoráveis e contrárias às questões submetidas às consultas populares nos termos do § 12 ocorrerão durante as campanhas eleitorais, sem a utilização de propaganda gratuita no rádio e na televisão.”
Trata-se de interessante inovação, desde que essas “consultas” sejam interpretadas como exercício do poder soberano pelo povo, com obrigatoriedade de que o seu resultado seja devidamente implementado pelos poderes constituídos e representantes eleitos.
Afinal, uma das promessas constitucionais ainda por se efetivar é exatamente a da democracia semidireta ou participativa, que compreende todo o poder político como pertencente ao povo e exercido em seu nome, diretamente, através de diversas formas, entre as quais o voto direto e secreto, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular, bem como através de representantes eleitos [tudo de acordo com o que dispõem o art. 1º, parágrafo único (“Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”) e o art. 14 (“A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II – referendo; III – iniciativa popular”)].
Nesse sentido, ter um conjunto normativo de natureza constitucional que dê suporte e mesmo estimule os Municípios e os seus cidadãos a provocar o exercício do poder diretamente pelo povo na tomada de decisões relevantes de interesse local vai ao encontro da caminhada rumo à concretização da democracia participativa. E utilizar a estrutura pronta para a realização periódica de eleições municipais para oportunizar a realização dessas consultas populares de interesse local – como ocorre nos Estados Unidos, onde periodicamente, em conjunto com as eleições, realizam-se plebiscitos e referendos de matérias de interesse municipal e estadual – é muito conveniente, tornando possível fazer desse momento um exemplo pujante da democracia participativa, como exercício do poder soberano do povo diretamente e por meio de representantes eleitos.
Pois bem, já nas primeiras eleições municipais realizadas após a entrada em vigor da emenda nº 111 (as eleições deste ano de 2024), a Justiça Eleitoral foi devidamente acionada para viabilizar as seguintes consultas populares em âmbito local, com esses resultados:
1 – São Luís/MA – Você é a favor da implantação do passe livre estudantil no Município de São Luís? – 89,91% dos eleitores responderam que sim, enquanto 10,09% responderam que não;
2 – Governador Edson Lobão/MA – Você é a favor da mudança do nome do Município de Governador Edison Lobão para Ribeirãozinho do Maranhão? – 83,87% dos eleitores responderam que sim, enquanto 16,13% responderam que não;
3 – Belo Horizonte/MG – Você aprova a alteração da bandeira de Belo Horizonte? – 84,32% dos eleitores responderam que não, enquanto 15,68% responderam que sim;
4 – São Luiz/RR – Você é a favor da alteração do nome de São Luiz para São Luiz do Anauá? – 83,43% dos eleitores responderam que sim, enquanto 16,57% responderam que não;
5 – Dois Lajeados/RS – Você é a favor que o Novo Centro Administrativo Municipal seja construído na área do Parque Municipal de Eventos João de Pizzol? – 81,44% dos eleitores responderam que não, enquanto 18,56% responderam que sim.
Será interessante acompanhar os desdobramentos desses resultados, bem como a sua concretização. E que essa experiência estimule outros Municípios para que estabeleçam temas para deliberação popular direta conjuntamente com as eleições municipais de 2028, bem como impulsione a maior utilização dos mecanismos de democracia participativa também nos âmbitos estaduais e no âmbito nacional.