O país degringolou. A polarização perniciosa que se abateu sobre o chão verde-amarelo (cores que foram tomadas de assalto por um dos lados polarizadores, como tem sido feito por grupos nacionalistas, por vezes de cunho fascistas, mas nem sempre nesse tom, em países diversos) tem gerado posicionamentos estúpidos e imbecis, de lado a lado. Todavia, grupos que se moldaram na extrema-direita, talvez por insensatez, por desvario, ou, seja lá por qual motivo for, arrebanham gente de vários segmentos sociais, incluindo religiosos e, dentre estes, alguns membros do Clero, padres e bispos da Igreja Católica.
Há quem afirme que não cabe à Igreja intrometer-se em questões de cunho político. E o dizem pessoas com pensamentos conservadores, moderados ou progressistas, como ainda são divididos, por alguns, os segmentos da Igreja. Quem se alia à ala conservadora, contesta os posicionamentos da ala progressista. Quem apoia a ala progressista, contesta as posições da ala conservadora. Mas, enfim, muitos acabam “fazendo” política. Alguns indo aos mais sórdidos extremismos.
Além de pregar a Palavra, de testemunhar o Evangelho, de anunciar o Reino de Deus, os membros do Clero e do Laicato devem voltar-se também para a Doutrina Social da Igreja, inaugurada pelo Papa Leão XIII, na memorável encíclica Rerum Novarum (Das Cosias Novas), de 1891, no auge dos embates entre o socialismo e o capitalismo.
A Igreja não deveria jamais ser socialista nem capitalista. Não deve sê-lo. Porém, ela está no mundo e no mundo ela deve agir para transformá-lo pelos exemplos que Jesus nos legou. Há várias maneiras de fazer isso, de forma correta, isto é, com a iluminação do Santo Espírito, com apego à Verdade, que é o próprio Redentor.
Há padres e bispos que tomam posições abertamente políticas, de acordo com suas convicções pessoais, às vezes destoando do cerne do seu ministério. Padres e bispos são seres humanos, são cidadãos, podem e devem ter suas convicções políticas. Contudo, deveriam saber como não as misturar às funções ministeriais. Os fiéis leigos, que são encorajados à militância política, dentro de princípios éticos (e é aí que reside o problema: nem todos sabem averiguar o que se coaduna com o que prega o cristianismo, que jamais deveria ser “usado” pelos extremistas de direita ou de esquerda, porque o cristianismo não é de direita ou de esquerda).
Padres e bispos abrem o berro a favor ou contra este ou aquele agrupamento político, contra ou a favor deste ou daquele líder político. O púlpito é para anunciar e denunciar. Quem anuncia, denuncia. Mas, deve fazê-lo com segurança, com base na Palavra, sem paixonites.
Recentemente, um bispo no Estado de Goiás delirou ao fazer uma oração contra um tipo de regime político. O engajamento público de membros do Clero, para lá ou para cá, mas, sobretudo, com enganação, com falta à verdade, é desafiador para a própria Igreja. E tem mau-caratismo à solta. Nada contra se o padre ou o bispo é de direita ou de esquerda. Porém, a posição política é dele, é própria de cada um, e não da Paróquia dele ou da Diocese dele. Não é da Igreja. Da Igreja é a Palavra de Deus, é o Reino que Jesus veio anunciar. É a Doutrina Social tão bem elaborada.
Eu tenho, por exemplo, as minhas convicções políticas, amadurecidas nos embates da vida, no estudo, na escolha, na vida jurídica, na vida acadêmica, como professor de Direito, no caminhar do cidadão, do agente público, que fui e ainda sou, enquanto professor de Direito da Universidade Federal de Sergipe. Entretanto, o meu púlpito é sereno, é para a transmissão dos valores cristãos, não contaminados. E olhe que não é fácil não se deixar contaminar! Enfim, as minhas convicções políticas não devem recair sobre os meus paroquianos. Elas pertencem ao cidadão, não ao ministro religioso. É evidente, porém, que quando for preciso, hei de denunciar o que deve ser denunciado. Do contrário, não serei digno do ministério sacerdotal. Entretanto, sem faltar com a verdade. Jamais.