ARACAJU/SE, 21 de junho de 2025 , 0:38:46

Euclides barraca

Zeca Mesquita era o dono do Cine Popular. Contudo, não era do cinema a figura mais representativa, ele, que, aliás, por lá não aparecia. Daí me fixar em Euclides barraca que, no cinema, desempenhava quase todas as funções, como, porteiro, encarregado de colocar cadeiras quando as do cinema estavam totalmente ocupadas, de fechar as janelas, nas sessões domingueiras do matinée. Acho que só não foi operador, nem vendedor de bilhetes. Propositadamente, deixei por último a sua condição de xerife, ou delegado, ou autoridade suprema do cinema, em termos de disciplina. Euclides barraca não discutia, não conversava, apenas, ante um ato que considerasse inconveniente, não aceitava justificativa alguma – penso que nunca soube o que era o direito de defesa – e sapecava o indisciplinado para a rua, sem dar a mínima para a choradeira. Não se registrou nenhuma desobediência.

Os que mais sofriam eram os que sentavam na primeira fila da parte superior. Uma reclamação, da turma de baixo, com relação a algo lá em cima jogado, chicletes, talo de fósforo, ponta de cigarro, carteira de cigarro usada, até cuspe, Euclides barraca, ouvindo a reclamação, subia, e, com plena consciência de seu poder e papel, ordenava a descida de todos que estivessem ali na parte da frente, correspondente ao local do reclamante. Para sorte da direção do cinema, ninguém nunca pensou em discutir judicialmente a retirada brusca do cinema, sobretudo, quando entre os culpados, ou o culpado, havia gente inocente, que pagou para ver o filme. Não consta dos anais do cinema, que se salvaram, qualquer dor de consciência de Euclides barraca.

Alto, atlético, passada rápida, de pouca conversa, um pioneiro no futebol rudimentar dos primeiros tempos, atuando no time da elite, por ser ligado a Zeca Mesquita desde os verdes anos. Foi o primeiro atleta entre nós a passar a bola adiante. Não dava chutão para a frente, como fazia a quase unanimidade. Antonio Oliveira, que o observou jogando, guardou o fato e passou adiante. Euclides barraca, aliás, Euclides Fiel dos Santos, testemunhou o Cine Popular se tornar Cine Teni, e depois se extinguir. Viu Zeca Mesquita morrer, para, depois, como seu escudeiro, falecer também, com o peso de noventa e três anos, há quase vinte anos atrás. Um homem de bem.

Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letra