ARACAJU/SE, 28 de agosto de 2024 , 19:16:37

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“Fake news” e República

Daqui a uma semana, a República fará aniversário no Brasil. Os militares vinham descontentes com os “casacas” (os políticos civis). O golpe republicano será dado por eles, com o apoio de elites insatisfeitas com as administrações do Império.

Um militar, nesse contexto, tem um papel um tanto esquecido na história nacional: o Major Frederico Sólon de Sampaio Ribeiro, que pode ser reconhecido como o patrono das “fake news” políticas brasileiras.

Os republicanos preparavam-se para derrubar Dom Pedro II. O golpe era uma questão, apenas, de encontrar tempo para garantir adesão suficiente de tropas para fazer frente a uma eventual resistência do trono.

Mas, em 14 de novembro de 1889, o Major Sólon, vestiu-se de civil e fez circular, na Rua do Ouvidor, o boato de que o Visconde de Ouro Preto, chefe do Conselho de Ministros (uma espécie de primeiro-ministro), teria determinado a dispersão de tropas do exército, ordenado a prisão do marechal Deodoro da Fonseca e do tenente-coronel Benjamin Constant, outro prócer republicano.

Veterano da Guerra do Paraguai, respeitadíssimo na caserna, Deodoro, dispôs-se a derrubar o gabinete ministerial, apesar de estar bastante doente quando recebeu a notícia falsa, que também chegara aos quarteis, gerando indignação nos fardados. No amanhecer do dia 15 de novembro, aceitou a missão de comandar o golpe e saiu da cama.

O Visconde de Ouro Preto ficou ciente dessas movimentações e foi para o Quartel-General do Campo de Santana (hoje, Praça da República) para organizar a defesa do governo. Ele estava, no entanto, sob a proteção do marechal Floriano Peixoto, que, ao lado do Visconde de Maracaju, então comandante do Exército, nada fez para sustentar o regime em queda. Eram, também eles, golpistas.

Enquanto isso, o Imperador estava em Petrópolis, literalmente dormindo, convalescendo de crises decorrentes de sua diabetes. Os telegramas remetidos por Ouro Preto não chegavam a ele, retidos por seu médico. Ele somente soube dos acontecimentos por volta das 11 da manhã, quando com calma e sem perceber a gravidade do problema, pegou o trem de volta à Capital.

Quando Deodoro adentrou ao Quartel onde estavam os ministros reunidos, fez um discurso magoado sobre as queixas dos militares, demitiu Ouro Preto e informou, para perplexidade dos republicanos, que comunicaria ao Imperador a necessidade de designação de um novo ministério. O marechal, em princípio, deu-se por satisfeito por depor o gabinete e não proclamou a República sobre um cavalo, ao contrário do que mostra o célebre quadro de Benedito Calixto. Dizem até que o velho e doente militar saudou com vivas Sua Majestade, logo após a deposição ministerial.

Os revolucionários, no entanto, foram além. No final do dia 15, a República foi anunciada, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, em discurso do vereador José do Patrocínio. No dia seguinte, os jornais cariocas afirmavam que o Brasil mudou sua forma de governo.

Quando o Imperador retornou ao Rio de Janeiro, o Visconde de Ouro Preto sugeriu a ele que nomeasse o senador Gaspar Silveira Martins chefe do Conselho de Ministros. Péssima ideia. Havia um problema prático. A Assembleia Geral estaria em recesso até quarta-feira, 20 de novembro, e o senador estava a bordo de um navio, a caminho da Corte, para a reabertura dos trabalhos. Além disso, Gaspar Martins era um desafeto pessoal de Deodoro (que, dizem, teria se casado com a mulher que o militar pretendia desposar, a Baronesa de Triunfo). Por fim, do Senado, disparava acusações sobre a probidade do veterano militar.

Deodoro, fora leal ao Imperador, mas àquela altura, fraco fisicamente e moralmente desestimulado para resistir a uma administração que lhe seria pessoalmente ofensiva, lavou as mãos. O movimento, uma vez iniciado, foi mais forte e derruiu a própria monarquia.

Dom Pedro II, após ser convencido a tomar alguma providência, tentou montar um gabinete, sob a presidência de José Saraiva. Saraiva, porém, submeteu a aceitação ao consentimento de Deodoro. Ao ser comunicado da ideia, na madrugada do dia 16, o marechal informou ao emissário de que a situação era irreversível.

Consumado o golpe, coube ao multicitado major Sólon, em nome do governo provisório, a missão de entregar ao Imperador e sua família a ordem de deixarem o Brasil. Depois dessa incumbência, continuou importante. Em 1891, foi designado para a presidência de Mato Grosso e, em seguida, elegeu-se deputado federal pelo mesmo Estado. Terminou a vida general. Para ele, a mentira compensou.