José Anselmo Oliveira
As mudanças climáticas já não são apenas uma preocupação ambiental ou distante. Segundo um relatório recente da revista científica The Lancet, grande parte dos indicadores que medem ameaças à saúde global apresentou piora nos últimos anos, principalmente devido à elevação das temperaturas e à piora da qualidade do ar. Em 2023, por exemplo, as pessoas foram expostas, em média, a 50 dias a mais de temperaturas perigosas para a saúde. A consequência imediata se reflete em mais doenças respiratórias, sobretudo entre idosos e crianças.
O aquecimento global traz ondas de calor cada vez mais frequentes e intensas. O corpo humano é obrigado a um esforço extra para manter a temperatura estável, sobrecarregando o coração e, principalmente, os pulmões. Estudos mostram que as mortes de pessoas acima de 65 anos por causa do calor aumentaram 167% desde 1990. Além do desconforto, o calor pode desencadear crises de asma, bronquite, DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica), piorar sintomas de rinite e facilitar infecções respiratórias.
Pessoas com doenças crônicas — como diabetes, hipertensão, asma ou Alzheimer — ficam ainda mais vulneráveis aos efeitos do calor intenso. Crianças também apresentam risco elevado, pois têm o sistema respiratório em fase de desenvolvimento. O aumento da frequência respiratória e a desidratação tornam esses grupos mais suscetíveis a complicações graves, hospitalizações e, em alguns casos, até óbito.
A poluição atmosférica já é um fator de risco reconhecido para o aumento de doenças como asma, bronquite, DPOC e câncer de pulmão. Dados mostram que, entre 2019 e 2021, mais de 300 mil pessoas morreram no Brasil por doenças respiratórias causadas por fumaça e poluição. O material particulado fino (PM2,5), liberado por veículos, indústrias e queimadas, é capaz de atravessar as barreiras pulmonares e chegar à corrente sanguínea, desencadeando inflamações, crises alérgicas e mutações genéticas ligadas ao câncer de pulmão.
Um estudo da Universidade da Califórnia, em parceria com o Instituto Nacional do Câncer dos EUA, mostrou que mutações no DNA se tornam mais comuns quanto maior a exposição ao ar poluído. Isso faz com que até quem nunca fumou possa ter risco significativo de câncer de pulmão. Não existe um nível seguro de poluição: mesmo pequenas exposições ao longo dos anos têm potencial de provocar doenças crônicas e mortalidade precoce.
Além da poluição urbana, os incêndios florestais liberam grandes quantidades de poluentes atmosféricos. Fumaça de queimadas contém ozônio, monóxido de carbono, dioxinas e o temido material particulado fino. Esse coquetel tóxico agrava quadros pré-existentes de asma, aumenta o risco de infecções respiratórias e pode causar danos permanentes aos pulmões de crianças e adultos expostos. Um episódio em Montana (EUA) mostrou que, mesmo um ou dois anos após a exposição à fumaça, residentes apresentavam redução significativa da função pulmonar.
No Brasil, a fumaça gerada na Amazônia durante as queimadas frequentemente atravessa estados inteiros, atingindo regiões urbanas como o Sudeste. Em 2023, mais de 3,7 milhões de pessoas procuraram atendimento médico no país com sintomas provocados pela inalação da fumaça — de falta de ar a crises severas de asma.
Pesquisas norte-americanas mostraram que poluentes como PM2,5 e ozônio estão associados não só à piora de doenças como asma e DPOC, mas também ao aumento do risco de câncer e alterações permanentes na função pulmonar. Já estudos sobre queimadas indicam que a exposição à fumaça pode afetar até o desenvolvimento fetal, causar partos prematuros e aumento de casos de baixo peso ao nascer.
O avanço das doenças respiratórias diante das mudanças climáticas é uma realidade já comprovada pela ciência. O planeta mais quente, seco ou sujeito a extremos se torna também um ambiente mais hostil para os pulmões. A resposta exige ação conjunta: governos, cidades, cidadãos e profissionais de saúde devem atuar para reduzir emissões, ampliar políticas de adaptação e mitigar impactos, promovendo cidades mais verdes, limpas e resilientes.
Ignorar a crise climática não é mais uma opção: proteger o meio ambiente é proteger a saúde — da geração atual e das futuras.