ARACAJU/SE, 3 de maio de 2025 , 0:59:55

Oração do bom humor

Embora eu não gostaria de falar sobre o Papa Francisco, ao menos por enquanto, depois do artigo “Coragem”, da semana passada, uma faceta dentre as muitas matérias divulgadas sobre ele, ao longo dessas duas semanas, nas mídias digitais, chamou-me a atenção: trata-se da entrevista na qual ele fala sobre a “Oração do Bom Humor”, de São Thomas Morus, autor da fantástica obra “Utopia”, publicada, pela primeira vez, em 1516.

Morus foi Chanceler da Inglaterra, mas caiu em desgraça por não concordar com o divórcio do rei Henrique VIII (1491-1547) com a rainha Catarina de Aragão. Morus acabaria executado em 7 de julho de 1535, em Londres. Em 1966, Fred Zinnemann dirigiu o filme “A Man for All Seasons”, traduzido no Brasil como “O Homem Que Não Vendeu Sua Alma”, tendo Paul Scofield no papel de Thomas Morus, que ganhou o Oscar de melhor ator de 1967. O roteiro, escrito por Robert Bolt, é baseado em peça de teatro de sua própria autoria.

Eu conheço a “Oração do Bom Humor” desde 1976, quando adquiri o livro “Oração no Mundo Secular”, de tríplice autoria: Leonardo Boff, Ademar Schneider e Hermógenes Harada. O livro traz em seu bojo algumas orações especiais, como a Oração de Dag Hammarskjold, Secretário-Geral da ONU, de 1953 a 1961, quando morreu em um controverso desastre de avião, na África. Era luterano, de uma família com séculos ao serviço da coroa sueca. Pertencia à Academia Sueca.

Ao final de sua Oração, ele diz: “Dá-me um espírito puro – para que eu Te possa ver! / Dá-me um espírito humilde – para que eu Te possa ouvir! / Dá-me um espírito amoroso – para que eu Te possa servir! / Dá-me um espírito fiel – para que eu possa permanecer em Ti”!

Outra Oração, intitulada “Em Tuas Mãos”, publicada no citado livro, é de Robert Kennedy, encontrada no bolso do seu paletó, no dia em que foi assassinado (06-06-1968): “Em Tuas mãos, ó Deus, eu me abandono. / Vira e revira esta argila, como o barro na mão do oleiro. / Dá-lhe forma e depois, se quiseres, / esmigalha-a, como se esmigalhou a vida de John, meu irmão. / Pede, ordena! Que queres que eu faça? / Elogiado e humilhado, perseguido e incompreendido, / caluniado e consolado, sofredor e inútil para tudo, / não me resta senão dizer a exemplo de Tua Mãe: / “Faça-se em mim segundo a Tua palavra”. / Dá-me o amor por excelência, o amor da cruz; / não o da cruz heroica que poderia nutrir o amor-próprio, / mas o da cruz vulgar, que carrego com repugnância, / daquela que se encontra cada dia na contradição, / no esquecimento, no insucesso, nos falsos juízos, / na frieza, nas recusas e nos desprezos dos outros, / no mal-estar e nos defeitos do corpo, / nas trevas da mente, na aridez e no silêncio do coração. / Então, somente Tu saberás que te amo, / embora eu mesmo nada saiba. / Mas isto basta”!

Voltando a Thomas Morus, mesmo preso, o Chanceler da Inglaterra soube manter a alegria e se apoiava na oração. Em uma das cartas que escreveu a sua filha, o santo a consola enquanto estava na prisão. “Está, pois, tranquila, minha filha, e não te preocupes comigo, seja o que for que me aconteça neste mundo. Não pode acontecer nada que Deus não tenha querido. Ora, tudo o que ele quer, por pior que possa parecer-nos, é o que há de melhor para nós”.

Em algum momento, o Papa Francisco partilhou os benefícios da oração diária de São Thomas Morus: “O apóstolo deve esforçar-se por ser uma pessoa educada, serena, entusiasta e alegre, que transmite alegria onde quer que esteja. Um coração cheio de Deus é um coração feliz que irradia e contagia de alegria os que o rodeiam: vê-se a olho nu. Portanto, não percamos aquele espírito alegre, cheio de humor, e até autoirônico, que nos torna pessoas afáveis, mesmo em situações difíceis. Quanto bem faz uma boa dose de humor! Far-nos-á bem recitar com frequência a oração de São Thomas Morus: repito-a todos os dias, funciona para mim”.

Eis, pois, a “Oração do bom humor”: “Senhor, dai-me uma boa digestão, / mas também algo para digerir. / Concede-me a saúde do corpo, / com o bom humor necessário para mantê-la. / Dai-me, Senhor, uma alma simples, / que saiba aproveitar tudo o que é bom e puro / para que não se assuste diante do pecado, / mas encontre o modo de colocar de novo as coisas em ordem. / Concede-me uma alma que não conheça o tédio, / as murmurações, suspiros e lamentos, / e não permitais que eu sofra excessivamente / por esse ser tão dominante que chama “Eu”. / Dai-me, Senhor, senso de humor! / Concede-me a graça de compreender as piadas, / para que conheça na vida um pouco de alegria
e possa comunicá-la aos demais. / Amém”.