ARACAJU/SE, 7 de setembro de 2024 , 21:19:41

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Paixão nacional

Costuma-se dizer, e com razão, que o futebol é uma paixão nacional para os brasileiros. Sim, gostamos de futebol. Gostamos de torcer, de vibrar, de nos emocionar, de criticar, de xingar, de zombar dos amigos que torcem por outros times, quando estes estão por baixo e somos zombados quando o nosso time nos desaponta.

A Seleção Brasileira deu-nos, até agora, o ápice das conquistas em Copas do Mundo. Somos os únicos pentacampeões. Por enquanto. Mas, vivemos uma entressafra desgraçada. A nossa última conquista em mundiais foi a de 2002 contra a Alemanha, na final. Depois do fiasco de 1950, em pleno Maracanã, quando precisávamos empatar, mas perdemos de virada para o Uruguai por 2 x 1, oito anos após, em 1958, na Suécia, sagramo-nos campeões e cantamos “A Taça do Mundo é nossa / Com o brasileiro não há quem possa”.

Em 1958, Pelé se tornaria protagonista da primeira conquista da Seleção. Aos 17 anos, ele dividiria o palco com outro craque, Garrincha. Pelé quase não jogou aquela Copa por orientação do psicólogo da CBD. “Ele é um garoto!”. Pois na Suécia, em quatro jogos ele fez seis gols. Até hoje, é o mais jovem atleta a fazer um gol em Copas, em marcar em uma final e balançar a rede três vezes em um mesmo jogo do torneio – como fez na semifinal contra a França, quando vencemos por 5 x 2, o mesmo placar da final contra a dona da casa.

A seguir, fomos bicampeões, em 1962. Caímos em 1966. Um desastre. Porém, a recuperação veio logo a seguir: tricampeões em 1970, com aquela memorável Seleção, na despedida de Pelé em Copas do Mundo, o maior craque do futebol mundial de todos os tempos. No México, conquistamos o mundo, já na era da televisão esparramada pelos quatro cantos do Planeta Terra. De 58 a 70, em quatro Copas, ganhamos três. Um assombro! O futebol brasileiro encantou o mundo.

Depois do Tri, decepções em 1974, 1978, 1982, 1986 e 1990. Chegamos ao tetracampeonato em 1994, nos Estados Unidos, vinte e quatro anos depois do Tri: uma longa espera. Oito anos após, eis o pentacampeonato. E lá se foram, de 2002 a 2022, ano da última Copa, vinte anos de amargura. Sem falar na outra decepção, em casa, quando, em 2014, na semifinal, caímos diante da Alemanha por 7 x 1. Inesquecíveis e vergonhosos 7 x 1, além de perdermos para a Holanda por 3 x 0, na disputa pelo terceiro lugar.

De lá para cá, só desacertos. Mudamos de técnico. Duas Copas sem resultados convincentes, sem jogar de forma adequada. Novamente, mudamos de técnico, sem falar no interino. O que nos espera em 2026? Se depender do que tivemos aí, na Copa América, que foi outro fiasco, não conseguiremos nada.

Fala-se numa época difícil, que alguns cognominam de “era Neymar”. Muitas firulas, muitos penteados, muito gel nos cabelos, muitas caras e bocas, mas pouco futebol. Muito marketing. Muitíssimo marketing. Temos jogadores que se destacam em seus clubes, especialmente na Europa, todavia, na Seleção não jogam tão bem assim. Ou não jogam nada. Ah, dizem: falta conjunto, eles não têm o tempo necessário para treinar, para formar um time, um elenco ajustado! Ah, é assim? E no passado, qual era o tempo que os jogadores de então tinham para treinar juntos? Também não tinham tanto tempo assim.

A imprensa, por seu lado, exagera em enaltecer este ou aquele jogador, este ou aquele “menino” prodígio de 17, 18, 19 anos. “Serão a salvação da Pátria!”. Meu Deus! Muito estardalhaço para pouco futebol. O genial Pelé foi campeão do mundo pela Seleção, em 58, aos 17 anos. Foi bicampeão aos 21. Tricampeão aos 29. Bicampeão interclubes pelo Santos aos 22. Pelé era um atleta na verdadeira acepção da palavra. O “Atleta do Século XX”. Inigualável. Nem Maradona, nem Messi, nem o diabo-a-quatro. Ninguém se equipara a Edson Arantes do Nascimento.

Bem. Voltemos à “paixão nacional”. Não é de hoje que os brasileiros gostam de futebol. Vem de longe essa paixão. Pesquisando para escrever o meu próximo livro, a ser lançado em setembro, sobre um sergipano que serviu na Segunda Guerra Mundial como mecânico de avião, deparei-me com notas no Diário do presidente Getúlio Vargas, em 1938, quando a Itália se sagrou a primeira Seleção bicampeã mundial (1934 e 1938).

No dia 5 de junho daquele ano, Getúlio Vargas fez anotar no Diário que “o fato culminante do dia foi o jogo de football entre brasileiros e poloneses, em Estrasburgo, na disputa do Campeonato Mundial. A população da capital empolgada pela descrição da partida, ouvida através do rádio, até que esta se decidisse pela vitória dos brasileiros”. Vendemos por 6 x 5. A paixão vem de longe. Também de longe vêm as reclamações contra os árbitros de futebol.

No dia 12, o presidente registrou: “À tarde preocupou a cidade o match de football entre brasileiros e tchecos em Bordéus. A impressão geral foi que nos prejudicaram a parcialidade do juiz e a brutalidade dos contendores. Houve empate”. Dois dias depois, 14, Vargas anotou: “O acontecimento sensacional do dia foi a vitória do team brasileiro sobre o tcheco”. Vencemos por 2 x 1.

No dia 16, eis a desolada nota do Chefe da Nação: “O jogo de football monopolizou as atenções. A perda do team brasileiro para o italiano causou uma grande decepção e tristeza no espírito público, como se se tratasse de uma desgraça nacional”. Alegando uma dor, Leônidas, um dos nossos melhores atletas, não jogou. Perdemos por 2 x 1. O Jornal dos Sports publicou: “Sem Leônidas e contra o juiz, o Brasil foi derrotado”.

Sim, o futebol é uma grande paixão nacional. Falta-nos dirigentes, equipes técnicas e jogadores que acendam o fogo dessa paixão. Por enquanto, está tudo muito chocho. Muitas cinzas, poucas brasas e nenhum fogo.