No Brasil, a contratação de planos de saúde tornou-se comum, especialmente diante das dificuldades enfrentadas pelo sistema público. Contudo, a relação entre operadoras e consumidores é frequentemente marcada por conflitos, que vão desde negativas de cobertura até reajustes abusivos. O Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a jurisprudência dos tribunais têm papel essencial para equilibrar essa relação.
O CDC, instituído pela Lei nº 8.078/1990, estabelece princípios e normas para proteger os direitos de quem contrata bens e serviços, incluindo os planos de saúde. O artigo 2º do CDC equipara o contratante de um plano de saúde a consumidor, enquanto o artigo 3º reconhece a operadora como fornecedora de serviços.
Dessa forma, aplica-se à relação contratual diversos princípios, como a boa-fé objetiva, a transparência e o direito à informação clara e adequada. O consumidor tem direito a ser informado de maneira precisa sobre as coberturas contratadas, carências, reajustes e exclusões.
Um dos principais pontos de conflito é a negativa de cobertura. Conforme o CDC, cláusulas contratuais que limitem direitos essenciais ou causem desvantagem exagerada ao consumidor podem ser consideradas abusivas (art. 51). Os tribunais brasileiros, notadamente o Superior Tribunal de Justiça (STJ), têm reiterado que as operadoras não podem negar procedimentos essenciais à preservação da vida e da saúde, ainda que não estejam expressamente previstos no contrato, quando indicados por profissional habilitado.
Cabe destacar a Súmula 302 do STJ: “É abusiva a negativa de cobertura de tratamento médico-hospitalar, prescrita por médico, sob a alegação de não estar previsto no rol da ANS.” Esse entendimento reforça o papel protetivo do CDC, garantindo a efetividade do contrato e a dignidade do consumidor.
Outro ponto de tensão refere-se aos reajustes nos valores das mensalidades. O CDC exige que os reajustes sejam claros e justificados, vedando aumentos arbitrários. A jurisprudência consolidada entende que índices de reajuste devem estar previstos em contrato e seguir regulamentação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Reajustes por mudança de faixa etária a partir dos 60 anos, por exemplo, são considerados ilegais pelo Estatuto do Idoso e pelo entendimento do STJ.
A transparência é um dever central das operadoras, conforme o CDC. Informações vagas, omissas ou enganosas podem configurar prática abusiva, sujeita à nulidade e sanções administrativas. A jurisprudência tem entendido que a falta de clareza pode gerar indenização por danos morais, sobretudo quando compromete o acesso do consumidor ao serviço de saúde.
A crescente judicialização revela o desequilíbrio na relação consumidor-plano de saúde, mas também evidencia o papel ativo do Judiciário na defesa dos direitos. Os tribunais têm buscado harmonizar os interesses das partes, sempre com base no CDC e nas normas específicas do setor.
A tendência é que a atuação regulatória da ANS e a consolidação de precedentes no STJ tragam maior previsibilidade e segurança para consumidores e operadoras. Cabe às empresas investirem em transparência, diálogo e melhoria da qualidade dos serviços, enquanto aos consumidores resta o exercício consciente de seus direitos.
A relação entre planos de saúde e consumidores, assim, segue em constante evolução, sob o olhar atento do ordenamento jurídico e da sociedade.