ARACAJU/SE, 22 de outubro de 2024 , 10:34:39

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Reeleição e Abuso de Poder Político

Uma das formas mais evidentes de abuso do poder político no processo eleitoral é a utilização do patrimônio público, dos recursos humanos (servidores públicos), enfim, da estrutura governamental, em proveito de candidaturas. É o conhecido “uso da máquina”, vedado pela legislação e punível severamente.

Na “Lei das Eleições” (Lei nº 9.504/1997), existe a específica seção que estabelece as “condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais” (Art. 73).

Tem-se, aí, um rol bem detalhado de proibições que se destinam a coibir o abuso de poder no processo eleitoral. Desde a vedação de utilização (ou cessão) – em proveito de candidato, partido político ou coligação – de bens móveis ou imóveis pertencentes à Administração Pública (ressalvada a realização de convenção partidária), passando pela proibição de cessão de servidor público ou utilização de seus serviços para comitês eleitorais durante o horário de expediente e fazer (ou permitir) uso promocional de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público, chegando na vedação da realização de publicidade institucional de atos, programas, obras e serviços e campanhas (com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado), salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral; dentre outras tantas vedações de mesma natureza.

As punições previstas são, para alguns casos, a suspensão imediata da conduta vedada e pagamento de multa; para outros casos, também a cassação do registro da candidatura ou do diploma.

Na história democrática recente, esse tipo de abuso de poder vem sendo denunciado no âmbito da justiça eleitoral, notadamente em situações nas quais Presidente da República, Governador e Prefeito são candidatos às suas respectivas reeleições.

Em ano de eleições municipais, é indispensável a vigilância mais efetiva no que se refere ao tema, notadamente em municípios menores, onde o controle social é diminuto e o acompanhamento pelos meios de comunicação social menos intenso.

Pois bem, esse tipo de situação proporciona, mais uma vez, a reflexão sobre o instituto da reeleição.

Com efeito, até 1997, não era admitida a reeleição (eleição para o mandato imediatamente subsequente) para cargos executivos; somente com a emenda constitucional nº 16/1997 é que a Constituição foi reformada para permitir essa reeleição de Presidente da República, Governador e Prefeito, o que começou a ocorrer entre nós a partir das eleições gerais de 1998.

A possibilidade de abuso do poder político na hipótese de reeleição é potencializada, na medida em que se dá em proveito próprio e não de terceiro (ainda que correligionário); no que potencializada, pode-se dizer, é estimulada, a exigir do sistema de justiça eleitoral maior atenção para, em se constatando e comprovando, efetuar as devidas coibições a tempo e modo adequados, tudo isso em nome da higidez do processo eleitoral e da própria autenticidade do sistema democrático-representativo e igualdade das disputas eleitorais.

E essa situação se agravou ainda mais quando o TSE decidiu, já por ocasião da primeira candidatura à reeleição ao cargo de Presidente da República (Fernando Henrique Cardoso), que não se aplicaria ao candidato à reeleição a exigência de desincompatibilização do cargo seis meses antes da eleição (exigência estabelecida originalmente na Constituição de 1988 para candidatos a outros cargos – § 6º do Art. 14 – porque, óbvio, não teria como estender essa exigência para candidatos ao mesmo cargo já que, então, não era admitida essa possibilidade).

Desde então assim tem ocorrido e candidatos à reeleição ao cargo de Presidente da República, Governador e Prefeito permanecem nos seus cargos durante a campanha eleitoral, desequilibrando a disputa e potencializando ainda mais a prática do abuso de poder político.

O acompanhamento e monitoramento dessa prática nas eleições municipais de 2024 pode proporcionar, posteriormente, o aprofundamento da reflexão e do debate sobre o tema, a viabilizar a revisão do instituto da reeleição para mandatos executivos. O horizonte das pautas políticas, porém, não parece apontar esse tema como prioridade.