A ascensão das redes sociais como ferramentas de comunicação transformou a maneira como a informação sobre saúde é consumida. No entanto, essa facilidade também abriu portas para a disseminação de informações falsas ou sem comprovação científica sobre tratamentos, medicamentos e vacinas, um fenômeno perigoso quando a fonte é um profissional de saúde. No Brasil, essa conduta não passa impune, sujeitando o infrator a sanções nas esferas ética, penal e cível.
No plano ético, a principal ferramenta de fiscalização é o respectivo Conselho Profissional (como o Conselho Federal de Medicina – CFM, ou de Enfermagem – COFEN).
O Código de Ética Médica e resoluções específicas, como a Resolução CFM nº 2.126/2015 (que veda a divulgação de informações sem base científica), são claros. O profissional tem o dever de zelar pela verdade e pela ciência. A divulgação de “fake news” ou a promoção de métodos não reconhecidos ou experimentais com promessas milagrosas violam princípios basilares da profissão.
As sanções éticas são aplicadas após um processo administrativo e podem variar de uma advertência sigilosa até a cassação do exercício profissional (a mais grave), passando por censura reservada ou pública e suspensão. A gravidade da pena depende do grau do dano, da intencionalidade e da reincidência.
A disseminação intencional de informações falsas ou o endosso a práticas fraudulentas pode extrapolar a esfera ética e configurar crime, principalmente no contexto de crises de saúde pública ou pandemias.
Curandeirismo (Art. 284 do Código Penal): Praticar, mediante remuneração ou não, atos que configuram exercício ilegal da medicina com a utilização de crendices.
Charlatanismo (Art. 283 do Código Penal): Inculcar ou anunciar a cura por meio secreto ou infalível.
Crimes contra a saúde pública (Art. 267 a 285): A conduta pode, dependendo do caso, se enquadrar em crimes mais graves, como o de epidemia ou o de infração de medida sanitária preventiva (Art. 268), quando a falsa informação leva as pessoas a desobedecerem a regras estabelecidas para conter a doença, colocando a coletividade em risco.
Nesses casos, o profissional de saúde responderá a um processo judicial, podendo sofrer penas de detenção ou reclusão, além de multas.
A responsabilidade civil se configura quando a conduta do profissional de saúde provoca um dano a terceiros. Se uma pessoa seguir o conselho falso ou não comprovado, como abandonar um tratamento estabelecido ou recusar uma vacina, e sofrer um agravo à saúde, o profissional pode ser acionado judicialmente para reparar o dano causado.
A reparação pode envolver:
Danos Materiais: Custos com novos tratamentos, internações, medicamentos e lucros cessantes (o que a vítima deixou de ganhar por estar doente).
Danos Morais: Compensação pela dor, sofrimento, angústia e violação da dignidade da vítima.
A jurisprudência brasileira tem se fortalecido no sentido de responsabilizar indivíduos por atos ilícitos praticados nas redes sociais, especialmente quando envolvem a saúde e a confiança depositada em um título profissional.
A liberdade de expressão nas redes sociais não é absoluta, especialmente para profissionais que detêm um grau de autoridade perante o público. O “curtir”, “compartilhar” ou “postar” um conteúdo sem respaldo científico carrega o peso do juramento profissional e das leis do país. O combate à desinformação exige não apenas a fiscalização, mas a conscientização de que o uso das plataformas digitais para espalhar falsidades sobre tratamentos e vacinas configura um grave atentado à saúde pública, com pesadas consequências éticas, criminais e financeiras.