ARACAJU/SE, 2 de dezembro de 2024 , 5:47:44

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Uma semana agitada

Dois filmes de boa feitura, eu os assisti no decorrer da semana: “Ainda estou aqui” e “Pássaro Branco”. O primeiro, narra a história do ex-deputado federal do PTB, Rubens Paiva, cujo mandato foi cassado pelos militares golpistas de 1964, e acabaria sendo arrancado de sua casa, diante de sua família, por homens das forças de segurança (e que segurança!), arrastado para a prisão, onde seria morto, mas, descaradamente, dado como desaparecido. Era como, às vezes, os usurpadores do poder agiam, para encobrir as mortes que perpetravam. O segundo, é uma história bonita, dramática, romanesca, contada por uma senhora, artista plástica, que narra ao neto a trajetória de sua infância, na França ocupada pelos nazistas.

No fundo, os dois filmes acabam trazendo à mente do espectador o mesmo sentido: a luta pela liberdade. O primeiro, a liberdade contra a opressão dos militares de 1964, que implantaram os anos de chumbo, prendendo, torturando e matando muitos brasileiros, que resistiam ao golpe. Uma força desigual, bruta, perversa. O segundo, a liberdade contra a máquina mortífera dos nazistas de Adolf Hitler, em sua sanha tresloucada de querer conquistar a Europa e, quem sabe, o mundo. O maldito III Reich.

Rubens Paiva, como deputado do PTB, foi um ferrenho defensor das reformas de base tão almejadas pelo presidente João Goulart, que fora apeado do poder pelo golpe de 31 de março de 1964, golpe que implantaria a ditadura até a sua derrocada em 1985, vinte e um anos depois. Os tempos de chumbo se arrastaram sobre alguns países da América Latina, com ditaduras implantadas, cada uma mais cruel que a outra. Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai, a mais antiga das ditaduras americanas, naquele tempo.

O filme do diretor Walter Salles traz, sobretudo, a história de Eunice, esposa de Rubens Paiva, a sua luta para resgatar a memória do marido e para a afirmação dos direitos humanos.

Vivi a minha adolescência e juventude, no Colégio e na Faculdade de Direito, contestando o “famigerado regime”. Relembro dois fatos, como abaixo se lerá.

O primeiro fato: estudando em Aracaju, no Colégio Tiradentes, em 1971, aos 16 anos, curso Técnico em Contabilidade, o professor de Educação Moral e Cívica passou um trabalho com o tema “Revolução de 1964”. Quem era o professor? O Juiz de Direito Solon Figueiredo, que tinha sido aposentado compulsoriamente. Eu me esmerei no trabalho. Ataquei a tal “Revolução”. Nota 10. Porém, o mestre me disse que reteria o trabalho, para livrar que alguém mal-intencionado o pegasse e me dedurasse ao diretor do Colégio ou às “forças de segurança”.

O segundo fato: em 1977, no curso de Direito, na UFS, o professor de EPB – Estudos de Problemas Brasileiros (que era uma espécie de EMC para os universitários) passou um trabalho em grupo com um tema para cada grupo. Para o meu grupo, caiu o tema “Partidos Políticos”. Fizemos um bom trabalho com retrospectiva político-partidária desde o Império. Ao final, o grupo propunha a liberação dos chamados Partidos proscritos, de esquerda. O professor disse que o grupo tinha ido longe demais, que era um trabalho perigoso e, embora fosse muito bem feito, a nota era 5,0 (cinco). Não adiantou protestar. O professor rebateu: “É 5,0 ou…”. Não completou a frase. Nem precisava. Ditaduras? Só quem as viveu, aqui ou alhures. Nenhuma presta, de direita ou de esquerda.

A semana, todavia, prometia. Meu Deus! Que desmantelo nós vivemos nos estertores do último mandato presidencial. Agora, o trabalho da Polícia Federal, prendendo militares do Exército e um policial federal, que conspiravam (e, óbvio, não deviam estar sós na malfadada empreitada), para a derrubada do estado democrático de direito, planejando, inclusive, a morte do presidente e do vice-presidente eleitos, além da morte de um ministro do STF. Isso, depois que um desesperado pretendia detonar o Supremo Tribunal Federal, com foco também no ministro Alexandre de Moraes. Que dias, nós estamos vivendo! E que dias nós poderíamos estar vivendo se esses celerados e aqueles que, por detrás, os acompanham, os financiam, os articulam, tivessem êxito em suas tramas diabólicas, espúrias, antidemocráticas. Não conseguiram. Que jamais consigam. Que sejam punidos. Os que estão presos e os que ainda poderão vir a ser.

Enfim, viva a Democracia! Viva o Brasil! E viva o Verde-amarelo, que não deve dado azo a nenhum “punhal”, a nenhum grupo político nefasto, de direita ou de esquerda, pois o país que se veste de verde, amarelo, azul e branco não pertence a alguns, que aspiram o poder pelo terror, mas pertence a todos os brasileiros de esquerda, de centro, de direita, mas não a extremistas (de lado nenhum), especialmente, os que, em verdade, não adoram a Deus, não aspiram o bem-estar da instituição familiar, nem amam a Pátria. São loucos. São escória.

No meio da semana, ao menos, tivemos o feriado do Dia da Consciência Negra, o primeiro comemorado nacionalmente. Nós, o povo preto, não queremos afrontar, nem precisamos da piedade de ninguém. Precisamos de respeito. Precisamos ter consciência do que fomos, de como fomos, do que fizemos, do que nos impuseram, mas, sobremaneira, devemos continuar lutando pelo que é nosso: o direito de ser, de saber, de ter, de sonhar. Igualdade, sem resquícios da casa-grande ou da senzala.