Investidores de todo o mundo provavelmente não dão muita atenção à Grécia desde a catastrófica crise financeira que abalou o país por uma década depois de 2008. O berço da democracia merece ser revisitado, e não apenas como destino turístico.
Antes o país-problema da Europa, a Grécia teve uma recuperação econômica impressionante sob o comando do primeiro-ministro Kyriakos Mitsotakis, em que seu crescimento superou expectativas e o desemprego e a inflação caíram. Essa revitalização deu ao partido de Mitsotakis, o Nova Democracia, de centrodireita, uma vitória esmagadora surpreendente nas eleições de 21 de maio, apesar dos escândalos que em outras circunstâncias poderiam ter prejudicado suas perspectivas. A expectativa é de que o partido vença uma segunda eleição geral em junho, e com isso, consiga garantir uma maioria significativa.
Este milagre mediterrâneo tem lições para outros países, que enfrentam dívidas recordes e as mais altas taxas de inflação em uma geração.
As perspectivas da Grécia pareciam extremamente incertas logo depois da crise financeira de 2008-2009, e o excesso de dívida soberana deixou o governo à beira da inadimplência em 2015. Uma série de pacotes de resgate e uma reestruturação não conseguiram evitar o que se tornou a mais longa recessão de todas as economias capitalistas avançadas, que superou até mesmo a Grande Depressão dos anos 1930 nos Estados Unidos.
Um regime de austeridade colocou mais de um terço dos gregos em situação de risco de pobreza, elevou o desemprego para mais de 27% e provocou uma fuga de cérebros, já que centenas de milhares de pessoas deixaram o país. A Grécia também chegou perto de abandonar o euro.
A chegada de Mitsotakis ao poder em 2019 ofereceu algo diferente: a liderança tecnocrática de um ex-funcionário do banco Chase e ex-consultor da McKinsey formado pela Universidade Harvard. Seu partido Nova Democracia cortou impostos, elevou o valor do salário mínimo e das aposentadorias e atraiu investimentos estrangeiros de empresas como a Microsoft e a Pfizer. Essas políticas ajudaram a reverter a situação.
No fim de 2022, o Produto Interno Bruto (PIB) da Grécia ainda era de apenas 86% do nível de 2008, mas seu crescimento, de 14,5% em comparação com o ano anterior, foi quase o dobro do da zona do euro em geral. O desemprego caiu para menos de 11% — era de 18,6% no início de 2019. E uma taxa de inflação anual de só 3% é invejavelmente baixa, embora as medidas do núcleo da inflação, que excluem os preços de alimentos e energia, continuem preocupantes.
É verdade que Mitsotakis assumiu o cargo depois de passada a pior fase do impacto do sofrimento pós-crise, assim como é verdade que muito do crescimento do PIB e dos ganhos do mercado de trabalho se devem ao ressurgimento do turismo, que impulsionou o setor de serviços mesmo quando o consumo interno desacelerou. O relaxamento das regras fiscais na União Europeia por causa da pandemia também ajudou, mas a elaboração de novas regulamentações mais estritas é um risco.
Para os eleitores, as notícias econômicas positivas se sobrepuseram ao impacto dos escândalos que as pesquisas previam que prejudicariam o Nova Democracia nas eleições realizadas em 21 de maio. Entre os escândalos estão as novas restrições legais à atuação da imprensa, um esquema de escutas telefônicas que tinha políticos e figuras proeminentes como alvos e um acidente de trem com 57 mortos em fevereiro que provocou manifestações massivas de protesto e acusações de que a má gestão estatal contribuíram para o desastre.
“A ofensiva por reformas precisará ser mantida muito alta”, afirma Pizzoli, para quem não há “muito espaço para complacência”.
A conclusão mais oportuna a ser tirada do êxito da Grécia é a importância da disciplina fiscal e de evitar a inadimplência. Nos anos em que flertou com um calote da dívida, a Grécia não só teve de enfrentar intensa agitação social e suportar medidas de austeridade, como sua crise da dívida também gerou volatilidade nos mercados. Sua trajetória do caos econômico para uma situação de maior responsabilidade fiscal oferece uma lição oportuna para os Estados Unidos, que têm uma relação dívida/PIB de 120% e onde os políticos estão envolvidos em uma disputa em torno do teto da dívida e dos gastos federais.
“A principal preocupação do eleitorado grego tem sido garantir o crescimento”, diz Paolo Pizzoli, economista sênior do ING com foco na Grécia.
Nas eleições do último domingo, o Nova Democracia conquistou sua maior vitória desde 1974 contra o Syriza, outro partido político importante da Grécia — recebeu 41% dos votos, enquanto o Syriza teve 20%. Uma segunda eleição foi marcada para 25 de junho, e a expectativa é de que Mitsotakis assegure maioria para governar, em um novo sistema que dá assentos extras ao vencedor.
“A ofensiva por reformas precisará ser mantida muito alta”, afirma Pizzoli, para quem não há “muito espaço para complacência”.
A conclusão mais oportuna a ser tirada do êxito da Grécia é a importância da disciplina fiscal e de evitar a inadimplência. Nos anos em que flertou com um calote da dívida, a Grécia não só teve de enfrentar intensa agitação social e suportar medidas de austeridade, como sua crise da dívida também gerou volatilidade nos mercados. Sua trajetória do caos econômico para uma situação de maior responsabilidade fiscal oferece uma lição oportuna para os Estados Unidos, que têm uma relação dívida/PIB de 120% e onde os políticos estão envolvidos em uma disputa em torno do teto da dívida e dos gastos federais.
O exemplo da Grécia também mostra a importância da confiança econômica para os mercados e as eleições. A probabilidade de que Mitsotakis conseguir a maioria levou a uma forte alta nos preços de ações e bônus na semana passada, o que resultou em uma redução dos spreads entre as taxas de retorno da dívida do governo grego e um índice de referência alemão, ao mesmo tempo em que os mercados se concentravam na perspectiva da volta da Grécia a uma classificação de crédito com grau de investimento.
No plano social, a vitória eleitoral reafirmou a velha máxima de que “é a economia, estúpido”. E essa questão pode muito bem ofuscar as guerras culturais nos EUA quando os eleitores americanos forem às urnas em 2024. Além disso, com a economia em recuperação, as lendárias atrações turísticas da Grécia também brilham mais.
Fonte: Valor