Com o aumento de renda, mais de 2 milhões de domicílios já deixaram o Bolsa Família este ano, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social antecipados ao Globo. Em outubro, o programa atendeu 18,9 milhões de famílias, menor patamar desde o início do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Contando com o período do Auxílio Brasil, como o benefício foi chamado na parte final do governo de Jair Bolsonaro, é o menor número de famílias atendidas desde julho de 2022.
Das 2.069.776 de famílias que saíram do programa de transferência de renda em 2025, a maioria (1.318.214) deixou de receber o benefício em razão do aumento da renda familiar. Outras 726.799 famílias concluíram o período na regra de proteção, tempo em que o beneficiário pode se manter no programa após superar o limite de renda. Houve ainda 24.763 de famílias que fizeram o desligamento voluntário.
Podem acessar o programa as famílias que têm renda per capita de até 218. O valor base do benefício é de R$ 600 mensais. Quando o domicílio supera essa faixa, mas fica aquém de R$ 706, entra na regra de proteção, que permite o pagamento de metade do benefício por mais um ano.
Para o ministro Wellington Dias, o programa tem cumprido seu papel de melhorar a vida das pessoas mais pobres de maneira segura e sustentável.
— É importante dizer que quem entra no Bolsa Família só sai para cima, seja porque conquistou uma renda maior com o trabalho, seja porque abriu o próprio negócio. E, caso perca essa renda, retorna automaticamente ao programa. Esse é um caminho sustentável, e quanto mais avançarmos em educação e oportunidades, mais seguro será o futuro das famílias brasileiras.
Emprego com carteira
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram que 58% do saldo de empregos do primeiro semestre foi preenchido por beneficiários do Bolsa Família. Já um levantamento realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social em conjunto com o Sebrae ainda aponta que 55% dos microempreendedores individuais que estão no Cadastro Único começaram a empreender após a inscrição no sistema. São 2,5 milhões de pessoas, de um total de 4,6 milhões.
Carla Pereira de Barros, de 39 anos, deixou o Bolsa Família após conseguir o primeiro emprego formal, como professora regente de uma escola municipal em Nossa Senhora do Socorro, cidade da região metropolitana de Aracaju (SE). Carla, que tem três filhas, começou a receber o benefício em 2010, em um contexto de bastante vulnerabilidade social.
Na época, sofria com a violência doméstica do ex-marido e ainda havia perdido a casa em uma enchente. Foi acolhida em uma escola da região e teve de viver de doações por um tempo. Nessa época, foi levada a um centro de referência de assistência social (CRAS), onde não só deu entrada no Bolsa Família como fez uma série de cursos, que a possibilitaram começar a empreender, fazendo doces e salgados sob encomenda.
Anos depois, após o incentivo da psicóloga do CRAS e alguns anos de estudo, Carla passou em primeiro lugar em pedagogia na Universidade Federal de Sergipe (UFS), curso que finalizou em 2023. Logo na sequência, conseguiu o emprego como professora e pediu o desligamento do programa. Agora, além de lecionar e das encomendas de doces de salgados, a professora ainda cursa a segunda faculdade, de Letras-Libras.
— Um dia precisei do Bolsa Família. Graças a Deus hoje não preciso mais, tem alguém que precisa mais do que eu. A minha oportunidade vou dar para o próximo — disse ela, que sonha em conseguir recursos para montar a própria confeitaria.
Tendência de queda
A trajetória de redução do número de famílias atendidas pelo programa começou em outubro de 2023, mas a queda se acentuou em meados deste ano. Entre maio e outubro, cerca de 1,5 milhão de famílias deixaram de receber o benefício. Além do aumento de renda da população brasileira, o período conjugou o fim do tempo de permanência das famílias que entraram na regra de proteção no início do governo Lula e também os ajustes realizados no mecanismo.
Até maio, os lares que superavam a linha de corte do Bolsa Família tinham acesso à regra de proteção se a renda per capita fosse de até meio salário mínimo (R$ 756). Além disso, o período de permanência era de 24 meses.
As mudanças foram realizadas com o objetivo de focalizar o programa, de modo a privilegiar as famílias mais vulneráveis, em um momento de inserção de beneficiários no mercado de trabalho e de orçamento apertado do governo. A regra de proteção visa a promover uma transição suave entre a dependência do benefício e a autonomia financeira.
Como mostrou o Globo em junho, o Ministério do Desenvolvimento Social estimou inicialmente que os ajustes na regra de proteção levariam a 101 mil desligamentos no programa este ano, sobretudo pela redução do teto de renda considerado. O impacto orçamentário previsto era de R$ 59 milhões. A repercussão maior dos ajustes deve ser sentido no ano que vem.
Em 2025, o orçamento do programa é de R$ 159,5 bilhões, cerca de R$ 10 bilhões a menos ante 2024. Até o momento, foram empenhados R$ 134,4 bilhões. Na proposta orçamentária de 2026, a verba destinada para o programa é de R$ 158,6 bilhões.
Fonte: O Globo





