ARACAJU/SE, 27 de dezembro de 2024 , 0:18:26

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Estudo revela persistência e diferenças do trabalho infantil em Sergipe

Da redação, AJN1

Resistente ao tempo, o trabalho infantil parece estar longe de ser apenas uma nuvem de memória negativa no Brasil. Em tempos de revolução tecnológica e suposta evolução moral, ainda é comum avistar no campo ou na capital, crianças exercendo alguma atividade laboral. De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (Pnad 2016), chancelado pelo IBGE, 1,8 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos trabalham no Brasil. Em Sergipe, o número chega a 47 mil.

Caracteriza-se como trabalho infantil aquele realizado por crianças com idade inferior à mínima permitida para a entrada no mercado de trabalho, segundo a legislação em vigor no País. No Brasil, a Constituição brasileira de 1988 admite o trabalho, em geral, a partir dos 16 anos, exceto nos casos de trabalho noturno, perigoso ou insalubre, nos quais a idade mínima se dá aos 18 anos. A Constituição admite, também, o trabalho a partir dos 14 anos, mas somente na condição de aprendiz.

Dissertação de mestrado

Rafaela Santos | Foto: Ascom/UFS

Com o objetivo de entender melhor as características do trabalho infantil em Sergipe, Rafaela Santos escreveu uma dissertação de mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), concentrando a sua pesquisa em Aracaju e na zona rural de Itabaiana, por estarem entre os municípios com maior foco de trabalho infantil no estado.

Rafaela identificou o perfil do trabalho infantil na cidade e no espaço rural. “Na cidade, as crianças e adolescentes trabalham muito nas feiras livres, com uma jornada maior do que no campo. Dentro da jornada de trabalho que encontramos em Itabaiana, por exemplo, 45% trabalhavam entre 1 e 5 horas. Já na cidade de Aracaju, algumas trabalhavam mais 16 horas na feira”, revela Rafaela.

A pesquisa observou que a defasagem escolar e a violência são maiores na cidade. Entrevistas realizadas pela pesquisadora mostram que 59% dos pequenos trabalhadores das feiras livres da cidade (Aracaju) já reprovaram de ano pelo menos uma vez, e 45% dos entrevistados afirmaram não mais frequentar a escola. Já os entrevistados no campo, apesar de 42% já terem reprovado pelo menos uma vez, todos informaram que estudam.

“Na cidade, as crianças acabam perdendo mais aulas, abandonando e reprovando muito mais. E a gente nota também que no campo elas vão ao turno oposto. Em relação à violência, as crianças da cidade são muitas vítimas do assalto, das brigas de ruas. No campo, a violência tratada lá é de outra forma”, conta a pesquisadora.

Rafaela relata que a violência no campo está relacionada à exposição excessiva ao sol e as broncas e xingamento dos “patrões”. 13% dos entrevistados afirmaram sofrer um tipo de violência. Outra questão observada por Rafaela é o êxodo rural, também presente nessa realidade.

Não há combate em Sergipe?

Sergipe não possui nenhum programa ou projeto permanente de enfrentamento ao trabalho infantil. No país, a principal política pública era o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), que oferecia atividades culturais e de aprendizagens a crianças de 5 a 17 anos e remuneração mensal para suas famílias. Mas foi substituído pelo Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vinculo (SCFV). Para Rafaela, ele não é tão eficaz como deveria.

“Antes, as mães das crianças que frequentavam a jornada ampliada do PETI recebiam uma quantia para mantê-las na escola. Mas hoje foi absorvido pelo SCFV, que não tem o destino de rendas para as famílias e as crianças não são obrigação a participar”, relata a pesquisadora.

Denúncias

De 2014 a 2018, o Ministério Público do Trabalho (MPT) registrou mais de 21 mil denúncias de trabalho infantil. Na média histórica, o MPT calcula que haja 4,3 mil denúncias de trabalho infantil por ano. Foram ajuizadas 968 ações e firmados 5.990 termos de ajustamento de conduta, um instrumento administrativo para impedir condutas irregulares.

Campanha Nacional

Para reforçar a luta contra esse tipo de trabalho, o MPT lançou em junho deste ano, a campanha nacional “Toda Criança é Nossa Criança. Diga Não ao Trabalho Infantil”.

A campanha, que conta com um filme de animação, questiona os adultos: “você acha difícil imaginar o quanto é ruim para uma criança ficar vendendo coisas na rua? Comece imaginando que é o seu filho.”

Dados do Observatório Digital do Trabalho Escravo, desenvolvido pelo MPT em cooperação com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), mostram que entre 2003 e 2018, 938 crianças foram resgatadas de condições análogas à escravidão.

O MPT reforça que só a partir dos 14 anos os jovens podem exercer atividades de formação profissional, apenas em programas de aprendizagem, e com todas as proteções garantidas. A campanha foi desenvolvida pelo MPT de São Paulo se estenderá às redes sociais do MPT em todo o país.

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