A população brasileira ganhará uma nova ferramenta para fiscalizar os recursos públicos. A Frente Parlamentar Mista de Promoção à Saúde Mental (FPSM) lança a plataforma pública “Raio-X das Comunidades Terapêuticas: Plataforma de Pesquisa e Fiscalização das entidades com Financiamento Público Federal”, que reúne 1.285 documentos públicos, como os projetos terapêuticos e instrumentos de gestão, produzidos entre 2017 e 2023. A plataforma ficará disponível no site da FPSM: https://frentedasaudemental.com.br/raio-x-das-comunidades-terapeuticas/
Os documentos públicos disponibilizados pela plataforma apresentam informações inéditas para a sociedade civil em geral, sobretudo para pesquisadores interessados no tema, a partir de fontes primárias e oficiais do governo brasileiro, além de facilitar o acesso a dados atualizados sobre o tema.
O que são Comunidades Terapêuticas (CTs)?
As CTs são instituições de natureza privada, em grande parte religiosas, que se estruturam como residências coletivas temporárias para recuperação de pessoas que fazem uso problemático de álcool e outras drogas. Um requisito para que elas recebam financiamento do Governo Federal é a elaboração de um Projeto Terapêutico e esse instrumento deve trazer um conjunto de propostas de condutas terapêuticas articuladas com o objetivo principal de aprofundar as possibilidades de intervenção sobre os casos acolhidos.
O financiamento de vagas em CTs é realizado com recursos públicos municipais, estaduais e federais. De acordo com estudo realizado pela Conectas Direitos Humanos e o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), entre 2017 e 2020, o investimento federal em Comunidades Terapêuticas alcançou R$ 300 milhões, atingindo o montante de R$ 560 milhões quando considerados os valores repassados por governos e prefeituras de capitais. Além disso, as CTs também passaram a receber imunidade tributária a partir da Lei Complementar nº 187/2021, que regula a Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social (CEBAS) atuantes nas áreas da educação, da saúde e da assistência social.
Segundo a pesquisa mais abrangente e atualizada, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2017 havia cerca de 2 mil CTs operando em todo o território brasileiro, sendo a maioria da região Sudeste (46%) e instaladas em zonas rurais (74,3%). As CTs foram introduzidas no Brasil no final dos anos 1960, mas 79% delas foram fundadas entre 1996 e 2015. Ainda de acordo com a pesquisa do IPEA, cerca de 82% das instituições pesquisadas declararam ter orientação religiosa, sendo quase metade (47%) do número de CTs evangélicas ou protestantes e 27% católicas. Mesmo as CTs sem orientação religiosa também declararam desenvolver trabalhos espirituais, o que representa 95% do total de CTs (dados de 2017 e 2018).
Aproximadamente oito anos após o levantamento do IPEA, não há estatísticas precisas e mais atualizadas sobre o quantitativo e o perfil das CTs no Brasil, isto é, existe uma lacuna de pesquisa relevante para a compreensão do fortalecimento das CTs no país. Há ainda o fator complicador que é a existência de muitas instituições que se intitulam como CTs, mas que não são regulamentadas, passando ao largo de qualquer possibilidade de identificação e fiscalização.
Quem fiscaliza as Comunidades Terapêuticas?
Os serviços de saúde e de interesse à saúde são fiscalizados pelas Vigilâncias Sanitárias locais, com base em normas sanitárias federais e locais sobre o tema. Assim, toda Comunidade Terapêutica deve possuir Alvará Sanitário. Na fiscalização sanitária são avaliados aspectos de infraestrutura, documentação, recursos humanos e processos de trabalho. Em caso de irregularidades, diversas sanções podem ser aplicadas, a depender da gravidade ou da reincidência da infração sanitária: variando desde uma advertência, multa, apreensão e inutilização de produtos, até a interdição do estabelecimento.
No entanto, as Comunidades Terapêuticas não integram o Sistema Único de Saúde (SUS) e tampouco o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), mas são equipamentos da rede suplementar de atenção, recuperação e reinserção social de dependentes de substâncias psicoativas. Trata-se de entidades que integram o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD, por força do Decreto nº 9.761/2019 e da Lei nº 13.840/2019.
Assim, além da Vigilância Sanitária, outros órgãos ou entidades também podem realizar fiscalizações eventuais, motivadas geralmente por denúncias de situações que estejam dentro do âmbito das competências de cada uma delas. Por exemplo, conselhos profissionais podem fiscalizar questões ligadas ao exercício profissional, o Ministério Público do Trabalho pode realizar fiscalizações relativas a questões trabalhistas, etc.
Nessa direção, como forma de aprimorar os canais de fiscalização e denúncia, a FPSM apresentou, em 2023, o Projeto de Lei n. 6227, que altera a atual Lei de Drogas para que o Disque Denúncia de Violação de Direitos Humanos (Disque 100) passe a receber notificações também relacionadas às Comunidades Terapêuticas.
Como colaborar com a Plataforma?
Pesquisadores poderão enviar suas contribuições para a plataforma a partir do preenchimento de um formulário e serão avaliadas pela Secretaria Executiva e organizações do Conselho Consultivo da Frente segundo critérios científicos e metodológicos. Estando aptas, as contribuições serão incluídas no Repositório de Pesquisas.