Em cumprimento à ação de reintegração de posse da Justiça Federal em Sergipe, o Grupo de Gestão de Crises e Conflitos da Polícia Militar (GGCC), nesta sexta-feira (28), no Acampamento Nossa Senhora D’Ajuda, povoado Cabrita em São Cristóvão, cumpriu uma decisão inédita e histórica no estado e realizou uma reintegração de posse em favor de um movimento social, especificamente o Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos (Motu). Participaram ainda da operação as equipes Polícia Federal, Incra, Secretaria de Obras de São Cristóvão e MPF.
A Justiça havia determinado a reintegração de posse ao Motu, com a destruição de uma cerca que representantes da Fazenda Bonanza haviam feito dentro do Acampamento Nossa Senhora D’Ajuda. “Nos dias 12 e 24 de junho de 2020, pessoas da Fazenda Bonanza entraram na área do Acampamento, sem autorização judicial, e cercaram o tanque de água. Por força de uma ação civil pública, foi expedido um mandado de reintegração de posse em favor do movimento social Motu, algo inédito aqui no estado”, detalhou o capitão Rocha, coordenador do GGCC.
Na ocasião, o GGCC, que previamente intermediou com êxito o diálogo entre os envolvidos e garantiu um trabalho pacífico, acompanhou a oficial de justiça do Juízo Federal no cumprimento do mandado, nesta sexta. A ação também contou com a presença de uma equipe da Polícia Federal, fazendo a segurança da oficial de justiça; representantes do Ministério Público Federal e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Secretaria de Obras de São Cristóvão, que forneceu o maquinário usado na reintegração.
Decisão
Na liminar, o juiz federal Edmilson Pimenta, além da reintegração imediata, determinou a retirada de todas as cercas instaladas por aqueles que praticaram o esbulho possessório e que estivessem impedindo o acesso dos moradores às áreas ocupadas. Também foi determinada a remessa de cópia do processo para a Polícia Federal e a notificação e oitiva dos envolvidos no caso para prestar esclarecimentos sobre a usurpação da posse da área sob exame da Justiça.
A decisão de reintegração de posse foi cumprida pela Justiça Federal com apoio da Polícia Federal, da Polícia Militar, do Incra e do município de São Cristóvão, por meio da Secretaria de Obras, e acompanhada pelo MPF.
Entenda o caso
A ação em tramitação na Justiça Federal foi ajuizada pelo MPF em 2017, com o objetivo de garantir a defesa do direito à vida e à moradia de dezenas de famílias que vivem há décadas no povoado da Cabrita, no município de São Cristóvão. Desde 2014 o MPF acompanha os dilemas dessas pessoas, que já sofreram diversas violações de direitos humanos, e que continuam se repetindo em 2020, mesmo com decisões judicias em favor das famílias.
De acordo com o MPF, há documentos e narrativas reiteradas no sentido de que as terras do povoado da Cabrita são de propriedade do estado do Sergipe, adquiridas em 1946 para implantação de sistema de captação de água. Em 1970, as terras foram incorporadas ao patrimônio da então criada Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso). Várias pessoas que se dizem donas do local deram curso a processos na Justiça Estadual, o que implicou despejos forçados, inúmeras vezes, em prejuízo das famílias ocupantes da área, incluindo crianças, mulheres, idosos e pessoas com deficiência.
Ao longo dos anos, as famílias foram vítimas de diversas agressões e violações de direitos humanos, sofrendo ameaças de toda ordem. Entre elas, na tentativa de fazê-las sair da área, policiais encapuzados, em determinada madrugada, destruíram plantações e danificaram casa para intimidar os moradores. O caso foi trazido ao MPF por deputados estaduais.
Em 2015, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), reconhecendo o perfil de reforma agrária das famílias, fixou o interesse federal na questão. Com isso, o MPF encaminhou pedido de autorização ao procurador-geral da República para agir em relação ao episódio julgado pela Justiça Estadual. A autorização foi dada pelo Conselho Superior do MPF.
“O caso da Cabrita é gravíssimo. As famílias foram e continuam sendo submetidas a situações tão alarmantes e violadoras de direitos humanos que o Brasil pode vir a ser responsabilizado internacionalmente”, explicou o procurador regional dos Direitos do Cidadão à época do ajuizamento da ação, Ramiro Rockenbach.
Com informações SSP e MPF