Neste domingo, 13, o município de Laranjeiras, um dos berços da cultura sergipana, transforma-se mais uma vez no palco de uma das mais tradicionais manifestações populares do estado: a festa dos Lambe-Sujos e Caboclinhos. O evento atrai milhares de visitantes todos os anos, celebra a rica diversidade de Laranjeiras, e remonta com encenações, à luta pela liberdade dos negros no período escravocrata. O evento é uma realização da Prefeitura de Laranjeiras, por meio da Secretaria de Cultura e Turismo, com o apoio do Governo de Sergipe por meio da Fundação de Cultura e Arte Aperipê (Funcap).
A programação começa ainda na madrugada com uma alvorada festiva, quando os sons dos tambores e percussões percorrem as ruas da cidade, anunciando a chegada do grande dia. Às 9h, os grupos culturais receberão a tradicional bênção do padre em frente à Igreja Matriz, simbolizando o início das celebrações. A encenação folclórica é um espetáculo à parte, com momentos esperados pelo público como o combate no campo do Quaresma, previsto para acontecer às 16h.
Tradição misturada à tinta na pele
Comemorada sempre no segundo domingo de outubro, a festa dos Lambe-Sujos e Caboclinhos tem origem no século XIX, sendo uma representação simbólica do conflito entre os negros escravizados que fugiam em busca de liberdade e os indígenas que defendiam suas terras. Os Lambe-Sujos se pintam de preto, utilizando uma mistura de melaço de cana e tinta, e vestem shorts vermelhos e gorros; enquanto os Caboclinhos, caracterizados como índios, pintam-se de vermelho e usam adereços tradicionais.
Com personagens como reis, rainhas, caciques e feitores, o evento simboliza a união de dois povos que lutaram contra a opressão. À frente do grupo dos Lambe-Sujos há 39 anos está o mestre Zé Rolinha, que desde criança participa da festa. Além de liderar o grupo, ele também é responsável pela feijoada oferecida aos participantes, feita com os recursos arrecadados na “esmola” do sábado que antecede o evento.
O historiador Fernando Aguiar destaca a importância histórica da festa, que vai além do folclore e resgata elementos cruciais da história do Brasil. “Trata-se de um auto popular que ressalta aspectos da colonização, em que os indígenas foram muitas vezes manipulados para capturar negros fugitivos. Ainda assim, na manifestação de Laranjeiras, mesmo derrotados, os negros se sobressaem. Essa manifestação ressalta muito a identidade étnica, racial, cultural e, acima de tudo, de forma lúdica, a partir dos autos”, pontuou.
Fernando Aguiar também lembrou que a festa dos Lambe-Sujos e Caboclinhos é uma herança afrodiaspórica, ressignificada ao longo dos anos pelas vivências locais: “Essa manifestação marca profundamente a identidade desse povo e reflete a importância de manter vivas as tradições”.
Tal ponto é reforçado pela assessora da Diretoria de Políticas Culturais (Dicult), Grazzy Coutinho. “A festa é uma representação viva da história de Sergipe e do Brasil. Ela remonta ao período colonial e reflete o pertencimento de um povo que, muitas vezes, não tem plena consciência da importância histórica e cultural desses dois grupos em seu estado”, disse ela.
Além de seu valor cultural, o evento também representa um impulso importante para o turismo, a economia, e o sentimento de pertencimento das pessoas em relação a Laranjeiras. “Essa festa não representa apenas a história de Laranjeiras, mas também a história do nosso Brasil Colônia e do nosso estado. Para nós, ela é de extrema importância. Podemos dizer que para Laranjeiras é uma festa sagrada”, ressaltou o secretário executivo de Cultura e Turismo do município, Leomax Célio.