ARACAJU/SE, 15 de setembro de 2025 , 5:21:15

Mulheres ainda são subestimadas em sua relação com as finanças, dizem estudos

Antes da década de 1960, mulheres casadas não tinham direito a abrir uma conta no banco ou trabalhar fora sem a autorização de seus maridos. Essa história recente e mais um monte de outros fatores explicam por que as mulheres ainda têm menos confiança para lidar com suas finanças.

Metade das casas brasileiras são hoje chefiadas por mulheres. Mesmo assim, elas continuam recebendo menos que os homens: em média, 20,5% a menos para exercer as mesmas funções. Um homem branco chega a receber 159% a mais que uma mulher negra com a mesma formação, segundo o Instituto Insper.

Tão grave quanto isso é a questão da confiança. Uma pesquisa da Box1824 revelou que as mulheres se sentem pouco seguras para lidar com dinheiro – mesmo quando elas tomam decisões financeiras melhores que seus parceiros.
Basta olhar pra trás pra começar a entender. As mulheres só tiveram direito a um CPF próprio na década de 60. Antes disso, elas não podiam exercer certos direitos, como abrir uma conta no banco. Até 1962, mulheres casadas precisavam da autorização de seus maridos para trabalhar fora.

Uma história de sobrecarga. Laís Nicolodi, mestre em psicologia pela Universidade de São Paulo, conta o impacto desse histórico. “Quando a mulher entrou no mercado de trabalho, ela passou a desempenhar uma jornada tripla – trabalho, afazeres domésticos e cuidados com os filhos. Some essa sobrecarga ao fato de que muitas aprendem que entender de dinheiro é coisa de homem. Ou seja, entregar o controle financeiro acaba sendo um passo natura”.
A ausência de referências alimenta esse problema. Apesar de mais mulheres começarem a aparecer em posições relacionadas a finanças e economia, as figuras que representam esse mundo ainda são homens.

Isso tem muito a ver com a forma como meninas são educadas. “Existem pesquisas que mostram que professores das ciências exatas tendem a dar mais espaço para os meninos responderem na sala de aula”, explicou Laís. “Eles também atribuem notas mais altas para eles quando vêem o nome dos alunos na prova; em testes cegos, isso não acontece”, revelou.

O papel de cuidadora, não administradora – inclusive quando os homens não tomam boas decisões com o dinheiro – era o caso de Ana Alice, 48 anos, de Duque de Caxias (RJ). “Meu ex-marido bebia, gastava muito. Quando eu trabalhava em um mercado, acabava gastando quase tudo no vale para comprar comida. Se eu chegasse no fim do mês com R$ 100 para receber de salário, era muito”, relembrou.

Um dia, ela pediu dinheiro para a marmita que estava fazendo. “A gente discutiu e ele disse que eu só sabia pedir. Naquele dia eu pensei que não queria mais viver daquele jeito. Eu queria ter o meu dinheiro”.

Algum tempo depois o casal se separou. “Foi um alívio! Hoje eu trabalho, ganho meu dinheiro, banco minhas contas. Se eu quiser fazer algo com minhas filhas, comer uma pizza, eu vou lá e pago. Não dependo de mais ninguém!”, celebrou.

O que significa liberdade de escolhas?

Liberdade é quando você tem a condição de escolher diferente. Ou seja, aquela pessoa pode continuar tomando a mesma decisão, mas tem ciência e oportunidade de optar por outra escolha. Foi essa liberdade que abriu as portas para Odisseia, de 57 anos, que mora em Taubaté (SP).

Ela começou a trabalhar após os filhos crescerem. “Antes, qualquer coisa que eu quisesse eu precisava pedir a ele. Deixei de ser dependente. Anoto tudo que eu gasto e acompanho pelo aplicativo. Foi a melhor mudança que eu já tive na minha vida!”.

É lógico que existem barreiras para todos quando o assunto é dinheiro. Boa parte dos brasileiros não tem dinheiro suficiente para pagar as contas – e isso não se limita a mulheres. Mas elas são, sim, extremamente impactadas.
A pandemia agravou ainda mais o abismo. Ela afetou todos os brasileiros, mas a situação das mulheres piorou muito. Segundo o IBGE, atualmente mais de metade das brasileiras estão fora da força de trabalho.

Seria leviano reduzir todas as dificuldades financeiras das pessoas a isso e também ignorar que existe uma série de entraves ligados a questões que vão muito além de gênero. Mas, na semana da mulher, faz-se necessário debater um dos muitos aspectos desse sistema complexo.

Falar sobre dinheiro é essencial

As mulheres fazem isso muito pouco. Um estudo do banco de investimentos Merrill Lynch revelou que 61% das mulheres preferem falar sobre a própria morte do que sobre dinheiro.

Essa é uma barreira que precisa ser rompida. “Quando uma mulher troca informações com outras, quando ela vê na TV ou entre suas amigas dinâmicas diferentes da dela, ela tem mais liberdade para refletir sobre suas escolhas”, afirmou Laís.

Como disse Michelle Obama, em seu livro Minha História: “Temos que encontrar uma maneira de continuar a elevar outras mulheres em nosso mundo e em nossas vidas, o máximo possível”.

Você pode querer ler também