ARACAJU/SE, 19 de agosto de 2025 , 13:58:58

O extraordinário ganho dos EUA com o café brasileiro

 

A imposição por Donald Trump de tarifa adicional de 40% sobre o café brasileiro ilustra como sua turbulenta política comercial pode atropelar o próprio interesse econômico americano.

Isso fica evidenciado na manifestação didática da National Coffee Association (NCA), que representa toda a cadeia de valor do café nos EUA, em documento submetido ontem ao USTR (agência de representação comercial americana) na consulta pública envolvendo a investigação da seção 301 contra o Brasil.

A NCA lembra, primeiro, o óbvio: os EUA (quase) não produzem café. Existe uma simbólica colheita no Havaí e em Porto Rico, mas o país tem que importar 99% do café, que é considerada a bebida favorita dos americanos – mais que chá, suco, refrigerante e água engarrafada.

Sobretudo, a NCA mostra como o café cru, não torrado (‘’verde’’) importado é um grande negócio para a economia americana: o setor contribui com mais de US$ 343 bilhões para os EUA por meio de investimento, distribuição, varejo e atividades de marketing.

Quase sem um pé de café, os EUA conseguem assim transformar cada US$ 1 em importação de café na geração de US$ 43, um valor agregado extraordinário de 4.200%.

É algo de causar inveja à Alemanha, Itália, Suíça e outros também grandes comerciantes finais do produto, que praticam a escalada tarifária sem piscar, ou seja, não cobram tarifa na entrada do produto cru, mas impõem taxas altas quando o produto já vem mais elaborado.

O Brasil é a principal fonte de importação americana. Cerca de 32% do café verde vem do Brasil, seguido de Colômbia (20%), Vietnam (8%) e Honduras (7%).

A NCA explica ao USTR que as importações do café proveniente do Brasil não podem ser substituídas por compras em outros países, porque o Brasil é o maior produtor mundial da commodity, com volume maior que o dos outros quatro maiores produtores juntos.

Qualquer interrupção nas importações coloca em risco o processo, a produção e manufatura de alto valor dos EUA, podendo desviar esse ‘’enorme valor’’ para outros países, como a China, que desejam expandir sua própria indústria, alerta a NCA.

A tarifa punitiva de 40% anunciada recentemente por Trump, que em setores no Brasil é chamada de ‘’Tarifa Bolsonaro’’, ameaça desvio da commodity para outros mercados e prejudicar ‘‘severamente’’ os torrefadores americanos e o valor agregado do produto à economia americana, enfatiza a NCA.

Diz que o café brasileiro será provavelmente cada vez mais exportado para outros países, incluindo China, União Europeia, Suíça, Canadá e México, em vez dos EUA. Lembra que a China recentemente aprovou a exportação de 183 novas empresas brasileiras de café para o mercado chinês.

Alerta que alíquotas elevadas sobre os grãos de café verde do Brasil podem criar mesmo um cenário de inversão tarifária, em que a tarifa de importação sobre a matéria-prima fica maior do que a alíquota sobre o produto final. Torrefadores em terceiros mercados poderão prejudicar os torrefadores americanos ao utilizar grãos de café verde de menor custo do Brasil e, em seguida, exportar ‘’blends’’ de café torrados para os EUA a preços significativamente mais baixos que aqueles que os americanos conseguiriam competir.

A entidade americana pede assim ao USTR para a investigação da seção 301 contra o Brasil concluir que o café não é um produto de comércio injusto ou não recíproco, mas sim um produto essencial (com produção doméstica mínima) que impulsiona a economia dos EUA e sustenta quase 2,2 milhões de empregos no país.

A expectativa é de, em algum momento, o café entrar na lista de produtos isentos da taxação adicional imposta por Trump.

Entre as manifestações americanas ao USTR, também há associações de indústrias química, de aço, de madeira, de papel, de carne ou do setor de açucar, por exemplo, enfatizando a importância de importações procedentes do Brasil, em geral matérias-primas que vão ganhar o valor maior no mercado americano.

Fonte: Valor

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