A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) encaminhou uma proposta para a criação de um órgão regulador das plataformas digitais para ser acrescentado ao texto do PL das fake news (2.630 de 2020). O texto foi enviado por meio da CFOAB (Comissão Especial de Direito Digital do Conselho Federal) da instituição ao relator do projeto, deputado Orlando Silva (PC do B-SP).
O documento enviado neste sábado (13) diz que o projeto para a regulamentação das plataformas no Brasil “não pode vir desacompanhado de órgãos independentes com a função de supervisionar o seu cumprimento”.
Nesse sentido, a comissão propõe ao deputado Orlando Silva que seja criado o chamado Sistema Brasileiro de Regulação de Plataformas Digitais tripartite, com representantes de agências que teriam as seguintes responsabilidades:
- Conselho de Políticas Digitais – órgão responsável pela fiscalização e aplicação das diretrizes estabelecidas às plataformas; seriam nove integrantes a serem indicados pelos Três Poderes, pela Anatel, pelo Cade, pela ANPD e pela OAB federal;
- Comitê Gestor da Internet no Brasil – teria o papel de promover o debate sobre o tema no Brasil por meio de estudos, recomendações e diretrizes;
- Entidade de autorregulação – pessoa jurídica com a responsabilidade de decidir quanto aos casos concretos de moderação de conteúdo das plataformas digitais;
“Entendemos que há um importante consenso de que a tarefa de implementação dessa complexa legislação perpassa a pluralização não só das visões presentes no debate público, como também dos próprios atores nele envolvidos, sobretudo no que diz respeito às esferas institucionais de poder”, afirmou o texto.
O documento foi assinado pela presidente da CFOAB, Laura Schertel Mendes, pelo seu vice, Fabrício da Mota Alves, e pelo secretário-geral da comissão, Ricardo Campos.
O texto não traz detalhes de como serão financiados esses mecanismos de controle.
O que dizem os signatários
Em entrevista ao Poder360, os representantes da Comissão Especial de Direito Digital do Conselho Federal analisam qual seria a melhor saída quanto a determinação de um órgão responsável pela fiscalização e regulamentação das plataformas digitais a partir do PL das fake news.
O vice-presidente da comissão e sócio do Serur Advogados, Fabrício da Mota Alves, sinalizou que a proposta apresentada pela comissão vem no intuito de que a definição de um órgão para regulamentar as plataformas seja definido dentro do PL das fake news, e não por meio de decreto presidencial – como atualmente é pensado.
“Não parece o melhor caminho a definição pelo Executivo via decreto. Trata-se de um assunto que envolve um valor muito caro para a sociedade, que é a liberdade de expressão. Essa decisão deve vir pelos representantes do povo, que é o Congresso. A determinação por decreto pode ser alterada a qualquer momento, sem que necessariamente se passe por uma discussão na Câmara e Senado. Isso por tirar a imparcialidade”, disse.
Fabrício destacou que a proposta entregue ao deputado Orlando Silva foi baseada “nas melhores das intenções” e que seria, em sua visão “a solução mais ideal”.
“Propomos um sistema que tenha atribuições de regulamentação das plataformas, mas com a participação mínima do Estado. Isso dá muito espaço de equilíbrio, manobra no sentido de adequações e questões individuais”, afirmou.
Já para o secretário-executivo da CFOAB, Ricardo Campos, o “ideal” para a determinação do órgão regulador das plataformas é a “eficiência e o menor custo”, e isso se daria por meio da criação de uma superintendência para o tema dentro da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
“A proposta da criação do órgão [apresentada pela OAB] pega emprestada pessoas de outras agências, as quais já têm ocupações e muito trabalho. Ou seja, esse seria um 2º posto. Com isso, não se gera uma especialização e dedicação que o tema merece”, afirmou.
O secretário-executivo da CFOAB, que também é diretor do Legal Grounds Institute e docente na Faculdade de Direito da Goethe Universität Frankfurt am Main, destacou que seria preciso criar a superintendência dentro da Anatel e aumentar o conselho da sociedade civil dentro da repartição pública.
“Começar do zero uma agência nova e com pessoas emprestadas será muito difícil para atingir a eficácia e eficiência em médio prazo. Já a Anatel tem a estrutura, corpo de concursados especializados e expertise de regulamentação. Por isso, a agência poderia iniciar o trabalho com mais rapidez”, disse.
Por fim, o especialista disse que “o órgão regulador dever se vincular ao regime das agências reguladoras para evitar proximidade com o governo.”
“O regime das agências reguladoras é dotado de maior independência, e no nosso contexto o mais eficiente seria a Anatel por já regular a comunicação. São profissionais qualificados e contam com estrutura de pessoas concursadas que trabalham ali dentro tecnicamente há mais de 25 anos, ou seja, já passaram por mais de 3 governos”, acrescentou.
Sobre a regulamentação das plataformas por meio da Anatel, Fabrício da Mota afirmou que a agência seria a melhor opção na “ausência absoluta de opções.”
“Não temos nenhum órgão hoje que tenha essa capacidade, pois esse é um assunto inédito. Qualquer órgão que vier a ser atribuído essa competência precisará passar por um processo de aprendizagem”, afirmou.
Embora não reconheça que a Anatel esteja pronta para abarcar esse tema, Fabrício disse que o órgão “de fato já é uma estrutura robusta, com diretores com mandato e imparcialidade, por serem servidores de carreira. A agência tem expertize em fiscalizar e punir, muito embora voltada às telecomunicações. Seus diretores e servidores não estão habituados a lidarem com questões tão sensíveis como direitos fundamentais, e em particular, a própria liberdade de expressão.”
O Poder360 entrou em contato com a presidente da comissão, Laura Laura Schertel Mendes. Porém, a especialista não pôde contribuir para a reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.
O que diz a OAB
Por meio de nota oficial, a Ordem dos Advogados do Brasil afirmou que discute o tema, que tem um caráter “urgente” para o país. O texto assinado pelo presidente, Beto Simonetti, destacou que assuntos acerca da regulamentação de mídia no Brasil é debatido para além da CFOAB.
Eis a íntegra da nota:
“A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entende que o combate à desinformação e às notícias falsas é uma discussão urgente. Por isso, diversas comissões da OAB estão debatendo o tema. Hoje, ficou pública uma importante proposta elaborada por uma dessas comissões, a que trata de direito digital. No entanto, a OAB só terá uma posição definitiva quando o debate interno for esgotado e o tema for submetido ao plenário da entidade, o que ocorrerá na próxima sessão plenária, dia 22 de maio.
Beto Simonetti, presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)”
Fonte: Poder 360