No final dos anos 1980, uma tentativa de atentado poderia ter mudado os rumos do Brasil e, por consequência, da América do Sul. Uma história impressionante, mas que passou décadas quase desconhecida, ganhou as telas dos cinemas em dezembro de 2023 e está disponível no Disney+ com o filme “O Sequestro do Voo 375”, um longa com coprodução da Star Original Productions, do grupo Disney.
Mas qual é a verdadeira história que o filme trouxe à tona? Como foi o sequestro do voo 375? Qual era a real intenção do sequestrador e como esse evento não se tornou uma tragédia ainda pior? Conheça, a seguir, os fatos reais sobre esse sequestro de um avião comercial com mais de 100 passageiros e que gerou morte e tensão nos ares.
Qual era o real destino do voo 375?
No dia 29 de setembro de 1988, o Brasil vivenciou um dos acontecimentos mais marcantes da história: o sequestro de um voo comercial da extinta companhia aérea Vasp com mais de 100 pessoas a bordo.
O voo 375 tinha como destino final a cidade do Rio de Janeiro; antes, havia saído de Porto Velho (em Rondônia) ainda de madrugada, e faria quatro escalas ao longo da viagem, passando por Cuiabá (MS), Brasília (DF), Goiânia (GO) e Belo Horizonte (MG) até, enfim, chegar ao Rio.
Em sua última escala, no aeroporto de Confins, em Belo Horizonte, a história do voo mudou completamente. Um passageiro embarcou com intenções bem diferentes, como conta o livro “Caixa-preta: o relato de três acidentes aéreos brasileiros”, de Ivan Sant’Anna, publicado em 2000.
O maranhense Raimundo Nonato Alves da Conceição, um tratorista desempregado, embarcou no voo 375 em Confins, mas seu objetivo não era ir para o Rio, e sim obrigar o piloto a voar para Brasília com a intenção de jogar o avião contra o Palácio do Planalto, a sede do governo federal.
Seu objetivo era matar José Sarney, o presidente brasileiro na época, o primeiro civil a tomar posse do cargo após anos de Ditadura Militar no país. Por consequência, o atentado também mataria todos a bordo.
O livro conta que Raimundo Nonato estava abalado por como as condições econômicas do país o haviam atingido pessoalmente. No final dos anos 1980, o Brasil vivia uma situação econômica crítica, com uma inflação média de 17% ao mês e uma taxa de desemprego variando de 9 a 11%, segundo dados do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Naquele momento, Nonato se via totalmente sem recursos para sustentar a própria família.
Como foi o sequestro do voo 375?
O sequestro começou cerca de 20 minutos após a decolagem, em Belo Horizonte. Nonato conseguiu entrar na aeronave portando uma arma calibre 32 e chegou a atirar contra a porta da cabine de comando, assustando a tripulação e forçando os pilotos a abrirem a porta.
Em seguida, Raimundo Nonato invadiu a cabine do piloto Fernando Murilo de Lima e Silva e do copiloto Salvador Evangelista para ameaçá-los e comunicar que estava sequestrando o avião. A partir de então, passou a exigir que eles mudassem a rota do voo e seguissem em direção à Brasília. O objetivo era jogar o avião contra o Palácio do Planalto com a finalidade de atentar contra a vida do presidente brasileiro José Sarney.
Como conta o livro de Ivan Sant’Anna, os pilotos tentaram conversar com Nonato para entender a situação. Ao mesmo tempo, Fernando Murilo conseguiu acionar o código 7500 – que significa “interferência ilícita a bordo” – avisando o Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (Cindacta), que controla os voos e dá suporte aos aviões comerciais.
Ainda assim, o copiloto Salvador Evangelista acabou morrendo com um tiro dado em sua nuca pelo sequestrador. A partir daí, a situação de tensão escalou e o medo tomou conta do voo.
O filme “O Sequestro do Voo 375” retrata de forma bem realista o que se sucedeu na sequência: o piloto Fernando Murilo foi hábil o bastante para conversar com Nonato e fazê-lo mudar de ideia. Afinal, o combustível disponível na aeronave não era suficiente para chegar à capital do Brasil, como era a intenção de Nonato.
Após o assassinato do copiloto, Fernando Murilo se manteve focado em convencer o sequestrador a pousar no aeroporto de Goiânia, narra o livro. Murilo também tentava manter o contato com os controladores de voo – que já haviam avisado membros do governo federal e da Aeronáutica.
A essa altura, um avião-caça havia sido enviado para acompanhar o voo comercial da Vasp, e a ordem era abatê-lo caso rumasse para Brasília. Por isso mesmo, mudar a ideia de Nonato e pousar em Goiânia era uma questão de sobrevivência para Murilo e todos no voo.
A partir de então, o piloto começou a realizar manobras extremamente ousadas para uma aeronave comercial baseado em sua experiência também como piloto na Esquadrilha da Fumaça (grupo da Força Aérea Brasileira que é especializada em manobras acrobáticas em aeronaves de pequeno porte).
Ele chegou a deixar o avião em queda livre por um breve período e, com isso, conseguiu desequilibrar o sequestrador, pousando o 375 no aeroporto de Goiânia, para alívio dos tripulantes e passageiros.
Ainda assim, o sequestro não havia terminado: Nonato seguia armado, ameaçando passageiros e tripulantes, e exigia outro avião para poder realizar o atentado.
O tenso acaso do sequestro de um avião no Brasil acabou com Raimundo Nonato Alves da Conceição preso e, pouco tempo depois, morto. Apesar de ter ficado tantos anos desconhecido, o episódio do sequestro revela detalhes de um momento crucial de transformação da sociedade brasileira e mostra como a segurança em aviões mudou drasticamente em comparação com anos anteriores.
Aproveite para conferir o premiado filme nacional “O Sequestro do Voo 375”, com exclusividade no Disney+.
Fonte: National Geographic Brasil