ARACAJU/SE, 2 de maio de 2024 , 0:12:07

logoajn1

Embates com Moraes e governo lançam holofotes sobre os negócios de Musk no Brasil

 

Os embates entre o bilionário Elon Musk, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o governo federal lançam holofotes sobre os negócios do empresário no país. Veículos de imprensa e órgãos governamentais têm se debruçado para uma devassa nos contratos locais com empresas responsáveis pela fortuna do segundo homem mais rico do mundo, segundo o ranking da revista Forbes.

Além de dono do X, antigo Twitter, comprado em 2022 por US$ 44 bilhões, o empresário sul-africano detém pelo menos seis grandes empresas de alta tecnologia. No Brasil, depois da rede social, a vertente mais expressiva dos negócios de Musk está na Starlink, operadora do serviço de banda larga via satélite e braço da SpaceX, fabricante de equipamentos e veículos aeroespaciais, com os quais o bilionário pretende implementar seu projeto de colonização de Marte.

A Starlink pretende formar “constelações de satélites” para levar conexão para áreas remotas em todo o planeta. A autorização para o início das operações no país foi dada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no início de 2023, e, desde então, a empresa avança rapidamente nesse mercado. Já são aproximadamente 150 mil conexões de satélite da empresa, que representam 37,6% das 329 mil conexões de banda larga desse tipo ativas no país em fevereiro de 2023, de acordo com dados da Anatel.

A empresa é líder isolada entre os provedores do sistema na Amazônia Legal, com antenas instaladas em 90% municípios da região até julho do ano passado, segundo um levantamento da BBC News Brasil. A maioria das cidades fica em regiões de difícil acesso, sem infraestrutura tradicional de internet de banda larga. A empresa normalmente tem planos agressivos de descontos para conquistar o mercado. Musk conseguiu aproveitar o conflito com Moraes para turbinar ainda mais o negócio, reforçando, após as primeiras repercussões do embate, pacotes promocionais de venda de assinaturas.

Na segunda-feira (8), um dos dias mais acirrados da polêmica nas redes sociais, o site em português da Starlink exibia a redução de 50% no preço do kit (antena, roteador e cabos) para clientes residenciais. O valor foi reduzido de R$ 2 mil para R$ 1 mil até o fim de abril. “Uma das principais vantagens do sistema da Starlink é a menor distância dos satélites em relação à Terra”, explica Jayme Ribeiro, diretor executivo de vendas e marketing da Sencinet, representante da Starlink no país. “Isso permite uma viagem mais rápida dos dados, conhecida como latência. Dessa forma, o tempo de resposta é menor e vantajoso”, completa.

MP pediu suspensão de contratos do governo com a Starlink

No meio do embate Musk-Moraes, o Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) chegou a pedir, por meio de representação, que os contratos firmados entre a União e a Starlink, caso existentes, fossem rompidos. O subprocurador geral do MP-TCU, Lucas Furtado, alegou “violação à soberania nacional” por parte do empresário.

Na terça-feira (9), Musk respondeu no X que se seus contratos fossem cancelados pelo governo brasileiro, ele ofereceria conexões em escolas gratuitamente. Mas a empresa não tem contrato com o governo federal para conectividade escolar.

Em maio de 2022, quando encontrou com o então presidente Jair Bolsonaro (PL) num evento no interior de São Paulo, o bilionário chegou a dizer que iria conectar 19 mil escolas nas zonas rurais e monitorar a Amazônia. O projeto não chegou a ser implementado, mas há iniciativas em âmbito estadual. “Vários estados, como Amazonas e Amapá, estão contratando a Starlink para escolas estaduais e municipais”, afirma Ribeiro.

A empresa também coleciona uma carteira de usuários governamentais importantes, ainda que os contratos sejam pequenos. É o caso das Forças Armadas. O Exército tem encomendado um pedido de conexão com a plataforma no valor de R$ 146 mil, para a Infantaria de Selva de Rondônia.

A Marinha tem quatro contratos com a empresa, assinados em processo direto, em que o órgão escolhe o fornecedor sem a necessidade de licitação. Os serviços são destinados às cidades de Belém, Santos, Rio de Janeiro e Porto Velho, com valores que variam de R$ 25 a R$ 146 mil, segundo dados do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).

Outros órgãos contratantes são Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) do Tocantins e Câmaras Municipais, todos na Região Norte. “Existem muitas empresas e entidades de governo usando os serviços da Starlink que seriam impactados por uma revogação dos serviços”, afirma. “Mas não vejo isso como uma possibilidade factível de acontecer”, diz.

Mercado potencial é animador, diz representante da Starlink

Para Ribeiro, as perspectivas da empresa são animadoras. Segundo a Anatel, a cobertura de quarta geração (4G) abrange quase 93% da população brasileira, mas apenas 16,7% da área geográfica do país. “O Brasil, pelas suas dimensões continentais e pela dificuldade de conexão no interior, tem um potencial muito grande”, diz.

O Ibama já chegou a acusar que a expansão da tecnologia de satélite na região impulsiona atividades ilegais, como o garimpo. O argumento não é levado a sério por especialistas, já que a opção seria deixar populações inteiras sem conectividade.

A competição tende a acirrar. Outras empresas nacionais e estrangeiras vêm investindo na modalidade de internet por satélite. A Starlink tem, por enquanto, protagonismo no país e no mundo. Segundo o Escritório das Nações Unidas para Assuntos do Espaço Sideral (UNOOSA), existem 10.928 satélites operacionais orbitando a Terra,. Destes, 5,4 mil são da Starlink. Ou seja, metade já faz parte da “constelação” de Musk. A pretensão da empresa é expandir para 40 mil.

Os primeiros empreendimentos de Musk

A riqueza de Musk, hoje calculada em US$ 195 bilhões, não partiu do zero. Filho de pai milionário, Errol Musk, soube multiplicar as oportunidades e dividendos. Visionário e polêmico, apostou sempre em inovação. Seu primeiro empreendimento de sucesso foi a Zip2, uma plataforma on-line de jornais vendida por US$ 300 milhões para a Compaq.

Em seguida, Musk fundou a X.com, que se tornou o PayPal, adquirido pelo eBay em 2003. Também teve participação em outras companhias, como a OpenAI, criadora do ChatGPT, que deixou em 2018.

Em 2002, criou a SpaceX, para revolucionar os voos espaciais comerciais. Foi a primeira empresa privada a lançar e recuperar com sucesso uma nave espacial da órbita da Terra. A empresa conseguiu desenvolver e lançar foguetes reutilizáveis, o que pode permitir à indústria baratear as viagens. Seu primeiro foguete foi enviado em 2008. Dez anos depois, Musk mandou um carro da Tesla para o espaço num teste do seu foguete mais poderoso à época.

Mais tarde, passou a enviar satélites e pessoas. Em 2021, a SpaceX fez história com o lançamento de quatro passageiros “comuns” à órbita da Terra. Desde 2023, realiza testes, ainda sem tripulantes, em supernaves, como a Starship, a maior do mundo.

Tesla, a fonte da fortuna

A Tesla, responsável pela maior parte da fortuna de Musk, foi fundada em 2003 pelos engenheiros Martin Eberhard e Marc Tarpenning, com foco na produção de energia limpa e carros elétricos. Em 2004, Musk investiu US$ 30 bilhões na empresa e se tornou seu presidente executivo e, posteriormente, o rosto da marca.

Ao contrário do que ocorre com outras empresas de Musk, a Tesla está listada na bolsa de valores de Nova York. Em alguns momentos, a empresa chegou a ultrapassar em valor montadoras tradicionais como Ford e General Motors, que têm números de produção e vendas muito maiores.

Em 2021, foi avaliada em cerca de US$ 700 bilhões e chegou a ter uma filial de produção na China, consumida de carros elétricos. Uma das inovações da companhia foi o sistema de semiautonomia para os carros, o Autopilot, que permite que eles dirijam sozinhos por certo tempo. O recurso chegou a causar acidentes e ainda é controverso. O portfólio da marca tem cinco modelos. O Model 3, sedan esportivo para famílias, e o Model Y, SUV de tamanho médio, foram os carros elétricos usados mais populares nos Estados Unidos, em 2023. No Brasil, segundo a empresa, foram vendidos 122 carros da Tesla de 2015 até 2021. A única forma de comprar é importando diretamente da fábrica, na Califórnia. A Tesla, porém, não passa por seu melhor momento. A concorrência se acirrou com a expansão de marcas chinesas, como a BYD, e a desaceleração nas vendas de elétricos levou a empresa de Musk a demitir mais de 10% de seus funcionários nesta semana.

SolarCity, The Boring Company e Neuralink

Em 2016 foi a vez de investir na SolarCity. Fundada por primos de Musk, Peter e Lyndon Rive, a SolarCity era líder em instalação de energia solar em residências nos EUA. Adquirida pela Tesla, foi integrada à sua linha de produção, com foco em baterias solares para veículos elétricos.

A The Boring Company também começou em 2016, para construir túneis subterrâneos para resolver problemas de tráfego e transporte urbano. Seu projeto mais conhecido é o Loop, um sistema de transporte subterrâneo de alta velocidade.

A Neuralink é uma startup de neurociência de chips cerebrais cofundada por Musk em 2016. A ideia é desenvolver interfaces cérebro-máquina para melhorar a comunicação entre humanos e computadores, e permitir que as pessoas controlem dispositivos diretamente com o pensamento. Recentemente, a empresa divulgou seu primeiro implante de chip em um cérebro humano.

X (ex-Twitter), arena da liberdade de expressão

Para comprar o Twitter, sua mais recente aquisição, Musk precisou de empréstimos e recursos da venda de ações da Tesla, que passou a operar em queda na Bolsa de Valores de Nova York.

A estimativa do mercado é de que a rede social – que Musk rebatizou de X – valha hoje um terço a menos que o valor da aquisição por Musk, de US$ 44 bilhões.

O Brasil é o sexto mercado do X com mais de 22 milhões de usuários, atrás apenas de Estados Unidos, Japão, Índia, Inglaterra e Indonésia, segundo dados da plataforma alemã Statista. Hoje, o Brasil tem 144 milhões de usuários de redes sociais. Conforme o relatório Digital Global 2024, o brasileiro fica mais de nove horas na internet, o que multiplica o potencial de negócios.

Mesmo antes de ser o dono, Musk já era um usuário frequente do Twitter. A compra, segundo ele, visava a explorar o potencial da plataforma como espécie de “arena” de defesa da liberdade de expressão.

Começou no X o embate com o ministro Moraes. Na esteira das revelações de documentos feita pelo jornalista Michael Shellenberger em colaboração com a Gazeta do Povo, Musk definiu Moraes como “ditador” e ameaçou desbloquear os perfis suspensos por determinação judicial no âmbito dos inquéritos que investigam a suposta disseminação de desinformação nas redes sociais.

Por conta da polêmica, o governo Lula informou, na sexta-feira (12), que suspendeu contratos de publicidade com a rede social X, antigo Twitter. Segundo o Executivo, até agora, foram investidos R$ 5,4 milhões em publicidade na plataforma. A medida, com impactos aparentemente insignificantes para os números da empresa, foi criticada por juristas por ferir os critérios de impessoalidade para as ações governamentais.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a mandar recados a Musk durante o embate nas redes sociais. Na terça-feira (9), Lula disse que “bilionário tentando fazer foguete” vai ter que “usar muito do dinheiro que tem para preservar o planeta Terra”.

Fonte: Gazeta do Povo

Você pode querer ler também