ARACAJU/SE, 9 de outubro de 2024 , 9:38:08

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A emenda constitucional 134, ou emenda “Zveiter”

As Mesas Diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado Federal promulgaram, na terça-feira da semana passada (24/09/2024), a emenda constitucional nº 134, que “altera o art. 96 da Constituição Federal, para dispor sobre a eleição dos órgãos diretivos de Tribunais de Justiça”.

Referida emenda produz uma única novidade normativa: acrescenta parágrafo único ao art. 96 da Constituição, estabelecendo que “Nos Tribunais de Justiça compostos de mais de 170 (cento e setenta) desembargadores em efetivo exercício, a eleição para os cargos diretivos, de que trata a alínea “a” do inciso I do caput deste artigo, será realizada entre os membros do tribunal pleno, por maioria absoluta e por voto direto e secreto, para um mandato de 2 (dois) anos, vedada mais de 1 (uma) recondução sucessiva.”

Já era estabelecido pela Constituição a competência privativa dos tribunais de eleger seus órgãos diretivos (art. 96, inciso I, alínea “a”).

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar nº 35/79) dispõe que é vedada a reeleição para os cargos de direção nos Tribunais; estabelece, ainda, que quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, não poderá figurar entre os elegíveis até que se esgotem todos os nomes na ordem de antiguidade (art. 102).

Logo, percebe-se que a finalidade da emenda constitucional nº 134 é a de afastar a proibição constante da LOMAN e permitir que ex-dirigentes dos Tribunais de Justiça possam figurar entre os elegíveis e ainda permitir que dirigentes dos Tribunais de Justiça possam ser reeleitos, vedada apenas a recondução para um terceiro mandato consecutivo.

Isso em todos os Tribunais de Justiça? Não. Apenas naqueles compostos de mais de 170 (cento e setenta) desembargadores em efetivos exercício. E quais são esses Tribunais? Apenas o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (356 desembargadores) e o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (188 desembargadores).

No âmbito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, não houve qualquer movimentação ou não há registro de desembargadores interessados nessa mudança de regra.

Já no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, existe o interesse explícito e direto do Desembargador Luiz Zveiter, de 69 anos de idade (a anotação da idade tem relevância apenas para a percepção de que, como aos 75 anos de idade ocorrerá a sua aposentadoria compulsória, a alteração da regra, para lhe aproveitar, precisaria ser imediata, gerando a possibilidade de ele vir a ser eleito e reeleito Presidente do TJ/RJ antes de sua aposentadoria). Zveiter já presidiu o Tribunal em 2009/2010.

Assim, a emenda constitucional nº 134 pode ser precisamente batizada de “emenda Zveiter”. Não se trata de uma emenda constitucional que procurar efetuar mudança importante na estrutura política do Estado Brasileiro, ou reforçar direitos/garantias fundamentais, amparar políticas públicas voltadas ao atingimento dos objetivos constitucionais da República, como deve ser próprio da elevada envergadura da natureza de uma emenda à constituição. Sequer se trata de uma emenda que, tratando de tema de menor relevância, produz alteração normativa que observa a necessária impessoalidade. Em boa verdade, a emenda “Zveiter” é um verdadeiro casuísmo, tão frequente – infelizmente – em nossa história.

É curioso notar, como bem registrou a repórter Ana Clara Costa, em artigo publicado no sítio eletrônico da Revista Piauí em 27/09/2024 (e comentado por ela mesma em sua participação na edição de 27/09/2024 do podcast Foro de Teresina), o quão essa emenda constitucional tramitou no Congresso Nacional sem qualquer polêmica, praticamente sem nenhum acompanhamento social e contou com voto favorável de parlamentares dos mais diversos espectros programático-ideológicos (inclusive do PT e do PL). Na Câmara dos Deputados, a PEC respectiva foi aprovada em segundo turno por 354 votos a favor e apenas 46 contra e, no Senado Federal, foi aprovada em primeiro turno com 57 votos favoráveis e 5 votos contrários e, no segundo turno, recebeu 57 votos favoráveis e 3 contrários.

Assim, a emenda 134, ou “emenda Zveiter”, é exemplo de casuísmo produzido com raro consenso político do sistema representativo.