ARACAJU/SE, 27 de abril de 2024 , 4:04:41

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Advogado esclarece sobre alguns direitos essenciais do consumidor

Por Cláudia Lemos

Nesta sexta-feira, 15, é comemorado o Dia do Consumidor. Será que você conhece seus direitos enquanto consumidor, bem como as leis que garantem uma compra segura? Você sabe como reclamar seus direitos? Para falar sobre o Código de Defesa do Consumidor e esclarecer alguns pontos da relação de consumo, entrevistamos o advogado Vinícius Emanuel, especialista em direito do consumidor. O tema é bastante complexo tendo em vista as novas realidades que estão sempre surgindo, a exemplo do avanço do comércio eletrônico. Todo cuidado é pouco para que os direitos dos consumidores não fiquem em risco. Acompanhe a entrevista a seguir:

 

Correio e Sergipe – Maior instrumento de proteção do consumidor, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) vai completar 34 anos em setembro. Na sua opinião o CDC tem conseguido cumprir seu papel de proteger o consumidor?

 Vinícius Emanuel – O Código de Defesa do Consumidor é um dos instrumentos legais mais modernos do mundo quanto à proteção das relações de consumo.  Durante essas mais de três décadas de existência, é inegável reconhecer que essa legislação tem desempenhado um papel fundamental no que se refere a garantir que as relações consumeristas sejam mais justas e equilibradas, estabelecendo regras e diretrizes que buscam contrabalançar a natural disparidade entre consumidores e fornecedores.

Decerto que os desafios e questões a serem enfrentadas no campo da proteção do consumidor sempre irão existir, inclusive porque a sociedade não para de evoluir, e o Código, por sua vez, não é uma lei imune a aperfeiçoamentos ou mesmo críticas. Novas realidades sociais e de mercado, além de práticas comerciais e tecnologias surgem a todo momento, o que requer uma atenção especial, a fim de se evitar que os direitos dos consumidores sejam colocados em risco. O CDC precisa acompanhar essas transformações, como o foi, recentemente, por exemplo, com a inserção da proteção ao consumidor superendividado.

CS – O comércio eletrônico não para de crescer. O Código de Defesa do Consumidor se aplica as compras e contratações realizadas pela internet?
VE – Certamente. Compras e contratações efetuadas de forma não presencial, ou seja, fora do estabelecimento físico do fornecedor, como no caso das compras pela internet, estão sim protegidas pelo CDC.  O consumidor, nessa modalidade, possui os mesmos direitos assegurados àqueles que consomem de forma presencial, a exemplo do direito à informação clara e precisa sobre os produtos ou serviços, assim como a garantia mínima legal de 90 dias para produtos duráveis, entre outros. Além disso, faz jus a direito exclusivo, como o prazo de 7 dias para reflexão, após o recebimento do produto, podendo devolver, sem qualquer custo.
De todo modo, é importante que o consumidor esteja atento a idoneidade do fornecedor no comércio eletrônico, buscando se certificar de que não se trata de sites ou portais falsos, conferindo ainda se há endereço físico, reclamações de outros consumidores, enfim, todo cuidado é necessário, para evitar cair em golpes, cuja apuração e solução é sempre mais complicada.

CS – O senhor vê os órgãos que fazem parte do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), a exemplo do Procon e da Vigilância Sanitária conseguindo atuar a contento?
VE  – Sem dúvida, eles desempenham um papel fundamental na proteção dos direitos dos consumidores.  São normalmente os primeiros a atuar prestando informações, orientando e, efetivamente, protegendo os interesses da sociedade consumerista.  O respaldo dado ao consumidor por esses órgãos, inclusive quando procurados para tomar providências diante da possibilidade da ocorrência de uma lesão ou ameaça a um direito do consumidor é muito importante, na medida em que representam a materialização daquilo que inicialmente o consumidor somente enxerga de forma abstrata.

 

CS – Operadoras de telefonia estão sempre no topo das reclamações. Quando o consumidor precisa acessar essas empresas, o contato é sempre por telefone. Além de anotar o número e protocolo, com o que mais o cliente deve se preocupar nessa hora?
VE – Antes de tudo, o consumidor deve estar preparado para enfrentar a situação pacientemente.  A partir disso, é aconselhável registrar o passo a passo das tentativas, seja salvando as ligações não completadas, anotando todos os detalhes da conversa, como data, horário, nome do atendente e conteúdo das informações fornecidas.  Lembrando que o consumidor pode gravar os diálogos sem nenhum receio, haja vista que não há vedação legal para a gravação de conversas por um dos interlocutores. Além disso, o consumidor pode solicitar, inclusive por email, o recebimento do registro dos acordos feitos durante o contato telefônico e seus respectivos conteúdos. Destaque-se que, de posse do protocolo de um desses atendimentos, verificando a possibilidade de algum tipo de desrespeito aos seus direitos, o consumidor pode acionar a agência reguladora, no caso a ANATEL, e requerer a mediação para o caso.

CS – No caso das operadoras de planos de saúde, os clientes tem reclamado da longa espera por consultas e exames, que pode durar meses. Há um prazo mínimo para que o plano garanta a realização da consulta ou exame solicitado pelo cliente?
VE – A ANS – Agência Nacional de Saúde estipula prazos máximos específicos para atendimento das demandas dos consumidores vinculados ao plano, que dependem de cada tipo de procedimento. Por exemplo, em situações de urgência e emergência, o atendimento deve ser imediato; já para exames de análises clínicas, o prazo é de até três dias úteis; consultas básicas devem ser realizadas em até sete dias úteis; consulta com especialista, 14 dias úteis; já procedimentos de alta complexidade, devem respeitar o prazo de até 21 dias úteis.  Os limites podem ser consultados pelo beneficiário, diretamente junto à ANS, inclusive pela internet. Em caso de dificuldade de atendimento, o consumidor deve entrar em contato com a operadora do plano e pedir o direcionamento para a realização do serviço solicitado – sem esquecer de anotar o protocolo – para em seguida contactar a ANS solicitando a mediação da situação.

 

CS – Falando especificamente da relação de consumo, o cliente pode se arrepender de uma compra e devolver o produto. Em que condições isso é possível?
VE – De início, o direito de arrependimento pode ser exercido no caso de compras ou contratações não presenciais, a exemplo das compras pela internet, mas de igual forma pelo telefone ou mesmo aquelas aquisições feitas por catálogo.  Esse tempo de reflexão foi concebido para oportunizar ao consumidor, após o contato físico com o bem, poder de fato, avaliar a adequação do produto a suas expectativas. O prazo para exercer esse direito é de sete dias, contados a partir do recebimento do produto, mas pode ser acionado antes mesmo da chegada do item, logo após a compra.

 

CS – Quando o consumidor chega a um estabelecimento e encontra o mesmo produto, da mesma marca e com as mesmas especificações porém com marcação de preços diferentes, qual preço fica valendo?
VE – Nesse caso, havendo divergência de preços para um mesmo produto, o consumidor tem o direito de comprar o item pelo menor preço.  Isso decorre do princípio da boa-fé, próprio das relações de consumo, assim como o princípio da transparência, com vistas a garantir que eventuais falhas na precificação prejudiquem o consumidor, muitas vezes levado a comprar justamente pela oferta do valor menor. Sendo assim, o preço a ser cobrado deverá ser o menor dos valores divulgados.

 

CS – É muito comum, principalmente no caso de vendas de eletroeletrônicos, a oferta ao cliente da garantia estendida. Essa é uma prática é legal? 

VE – A garantia estendida comumente oferecida no mercado de consumo em geral, não é garantia, sendo na verdade um seguro e tendo, assim, características distintas, gerando consequências diferentes, quando o sinistro, ou melhor, o defeito se apresenta no produto.  Para melhor entender a garantia e suas consequências numa relação de consumo, primeiro precisamos diferenciar suas modalidades.
Basicamente são dois os tipos de garantia, uma delas é chamada de legal, porquanto está prevista no Código de Defesa do Consumidor, e corresponde ao prazo de 30 dias para produtos não duráveis e 90 dias para bens duráveis, como no caso dos eletroeletrônicos.  Por seu turno, o outro tipo de garantia é a contratual, aquela oferecida pelo fornecedor, constante no certificado que acompanha o produto, a exemplo das garantias de 12 meses oferecidas no mercado em geral.  Importante saber que uma não exclui a outra, na verdade, elas se somam, e devem assim ser consideradas no total, adicionando os dois períodos num só prazo de garantia.
No caso da garantia estendida – que não é garantia – tem-se um seguro, cujas as condições de vigência não se confundem com a das garantias, e são específicas, de acordo com cada contrato.  Apesar de não ser ilegal o oferecimento, é importante destacar que as informações do serviço precisam estar claras para o consumidor.  Lembrando ainda que a venda do produto não poderá, de modo algum, estar vinculada à obrigatoriedade da aquisição da garantia estendida, o que caracterizaria a venda casada, vedada pelo Código de Defesa do Consumidor.

 

CS – Muitas lojas praticam preços diferentes para pagamento à vista ou no cartão. Isso é legal?
VE – Os fornecedores estão autorizados a cobrar valores diferentes em relação ao mesmo produto ou serviço, quando a forma de pagamento for diferenciada, desde que haja informação clara dos diferentes valores de acordo com a modalidade escolhida.  Assim, é legal a ocorrência de preços distintos entre um pagamento à vista e outro no cartão do crédito, ou outras modalidades, não necessariamente relacionadas ao prazo, como cartão de débito ou pix, desde que o consumidor tem acesso claro e prévio a informação dessa diferença, antes de decidir realizar a compra.
Se o fornecedor não informar de maneira clara que há diferença de preços de acordo com o meio de pagamento escolhido, não poderá cobrar o valor mais caro.  Assim, se não há divulgação clara da cobrança diferenciada de acordo com a modalidade de pagamento a ser escolhida, o consumidor pode exigir a cobrança do menor preço, mesmo utilizando um meio de pagamento diferente.

 

CS – O comerciante pode estipular um valor mínimo para pagamento com débito ou crédito?
VE – A exigência de um valor mínimo para pagamento no débito ou no crédito é considerada prática abusiva, na medida em que a limita o direito do consumidor de escolher a forma de pagamento que lhe for mais conveniente, dentre aquelas utilizadas pelo estabelecimento.  Assim, se o comerciante aceita pagamento em modalidades diversas, não poderá estipular valor mínimo para realizar a operação em nenhuma delas, sendo essa escolha uma prerrogativa do consumidor

 

CS – Qual o prazo para solicitar reparos de danos pessoais oriundos de produtos com defeito ou serviços com vício?
VE – O prazo para buscar esse tipo de reparação é de cinco anos e sua contagem se inicia a partir do momento em que o consumidor toma conhecimento do dano e de sua autoria, ou seja, desde o instante no qual for possível identificar, ao mesmo tempo, o prejuízo e o causador da respectiva lesão. Essa medida é essencial para proteger os direitos dos consumidores, visando equilibrar a relação com os fornecedores, considerando a vulnerabilidade do consumidor e a importância de assegurar a efetividade dos seus direitos. Durante esse prazo, o consumidor pode propor uma ação judicial visando a indenização, destacando-se que não há necessidade de reclamação prévia, ou seja, o consumidor não é obrigado a tentar uma solução administra tiva, para somente após isso, procurar o Poder Judiciário.

CS – Por fim, quando o consumidor se sente lesado em relação a uma compra ou serviço, como ele deve proceder. Quem deve procurar?

VE# – A partir do momento em que o consumidor enfrente uma situação que ele entenda implicar em lesão aos seus direitos, ou mesmo diante de uma negativa de solução pelo fornecedor através de seus prepostos, o consumidor pode procurar os órgãos administrativos de defesa, como no caso dos Procons.  Importante ressaltar que as atuações dos Procons, que inclusive ensejam realização de audiências de mediação, não têm competência para obrigar um fornecedor a indenizar por danos morais um consumidor, limitando-se à possibilidade de aplicar multas administrativas em face de condutas indevidas, abusivas e ilegais, que não são convertidas em favor do consumidor individualmente, mas normalmente aplicadas em trabalhos voltados à própria comunidade consumerista, investindo-se na atuação do próprio órgão. 
Ainda insatisfeito, o consumidor tem a opção de procurar o Ministério Público para fazer alguma denúncia – sem falar nas delegacias especializadas, prontas para registrar os fatos que sejam considerados crimes de consumo.  Caso pretenda mover uma ação judicial, está à disposição do jurisdicionado de baixa renda, a Defensoria Pública, além dos Juizados Especiais, para a comunidade em geral, os quais recebem causas de menor complexidade, e com limite de valores para propositura mesmo sem advogado, sendo que este pode ser igualmente acionado, caso seja a opção pretendida, podendo levar, ainda à Justiça Comum, dependendo da necessidade de cada situação.

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